Por tudo o que você fez

33. Letícia

Estou amarrando o cadarço quando o alarme do meu celular toca com um lembrete do aplicativo do trabalho, informando que falta 1h para a reunião de Matias na Paulista.

Imediatamente, me lembro da primeira mensagem que ele me mandou no dia e saio do quarto como um furacão.

Me esqueci completamente e já era pra eu estar lá.

Quando chego no térreo, vejo Josué me esperando com um ar impaciente.

- Atrasada, Srta. Letícia?

- Apenas corra, Josué!

Entro batendo a porta e ele dá uma risadinha, mas peço pra ele parar assim que percebo que estou sozinha.

- Cadê a Ruth?

- Ruth vai ficar no hotel adiantando a agenda do Sr. Bernardi para semana que vem. Você é a assistente principal hoje.

Merda.

- Espero que dê tempo.

- O Sr. Bernardi não tolera atrasos.

Eu sei que é verdade porque já ouvi vários funcionários comentando isso, mas o jeito como Josué diz isso é tão irônico que fico me perguntando se ele imagina o que se passa entre nós.

Não pergunto onde está Matias ou como ele vai chegar na reunião.

Josué leva dezenove minutos para entrar na rua do escritório. Já estou atrasada demais e o carro para no último sinal a um quarteirão de distância. Resolvo que, pelo menos, vou tirar uma vantagem por estar de all star.

Resmungo um "obrigada" apressado e saio correndo pela rua. A recepcionista pede minha identidade para que eu possa subir no elevador, o que me atrasa ainda mais.

Chego ao 31º andar, quase tropeçando para fora do elevador, e avanço pelo corredor até encontrar o escritório 315.

O andar inteiro parece vazio, de modo que ninguém vê a minha corrida esbaforida.

Assim que chego em frente à porta, respiro fundo. A porta está entreaberta, a luz está apagada. Não vejo qualquer sinal de Matias na sala.

Ufa, cheguei antes dele.

Um controle está em cima de uma mesa bem na entrada com uma etiqueta escrito "cortina". Aperto os comandos e a sala se ilumina com a subida gradual, revelando prédios a perder de vista. O céu está nublado e uma garoa começa a riscar o vidro com gotículas finas. Saco meu celular para tirar uma foto e posto no instagram de Matias, com a legenda "vista de hoje".

Não estou mais pedindo autorização para postar nem para escrever as legendas. O Matias que está ganhando milhares de seguidores por hora é uma mistura estranha da aparência dele, do meu gosto por paisagens e da minha total ignorância em relação aos negócios do CEO.

Como não sei nada do ramo, esse personagem parcialmente criado para as redes sociais está bem mais humano do que Paula encomendou, mas ela está aprovando o resultado.

- Mais de 30 minutos de atraso - comenta a voz grave atrás de mim. Ouço o clique da porta se fechando, mas fico aliviada porque não escuto o fecho da chave. - Você não é nem um pouco pontual, não é mesmo?

Sinto Matias se aproximando, mas não viro o rosto, porque minhas bochechas estão queimando.

Estou atrasada, depois de uma noite de bebedeira que ele presenciou. Ainda não consegui entender as suas atitudes da noite anterior. Eu estava completamente bêbada. Eu estava obviamente com tesão. Pelo menos, era isso que eu queria que ele pensasse.