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Sua ausência é mortal pra
mim.

Ella

Meu corpo se estende pra frente, ainda presa ao cinto de segurança. Confundi o acelerador com o freio. Não é uma vaga para carros, é um espaço na rua diminuída pela minha falta de atenção. Quase recuamos se não acerto o freio em cima da hora. Um gelo que há segundos me estremeceu, com o impacto do carro numa lixeira, comprometeu uma parte da minha respiração. Tiro o cinto depois de respirar com a falta rápida de fôlego.

— Está tentando se matar? — sua voz é gelada e preocupada. Ele tira o cinto e se estreita no meu banco, checando meus sinais vitais. — Está bem? — O empurro ao seu antigo banco com o meu dedo.

— Ficaria mais confortável se você confiasse em mim — é surpreendente como minha voz saiu arrogante, fria e debochada. Há dias estou impaciente com o medo dele. Saio do carro, pisando rápido.

Ele sai passando a mão no cabelo, parece nenhum pouco interessado para o seu carro com o farol esquerdo quebrado em vários pedaços alaranjados. O alarme soa ensurdecedoramente. O chão da parte da calçada foi aberto, com um buraco jovem que fiz com o ferro da lixeira que se arrancou com a batida. Seco os respingos de suor do meu rosto e encaro novamente a bagunça.

— Eu confio em você, não confio com você dirigindo. — Ele ri, com alguma piada tola que deve ter criado na sua imaginação. — Sem chance de ter sua carteira de habilitação.

— Há semanas que suas piadinhas vem sendo insuportáveis, Benjamin. — Amarro meu cabelo no meio da cabeça. Suspirando, irritada. — Fala sério, no terceiro dia sair bem e você me elogiou. Agora quer me abandonar por um errinho?

— Um pequeno acidente com os faróis quebrados, não é um errinho.

— Eu pago o concerto.

— Não é isso, Ella. — Sua mão quente segura a minha, deslizando até os dedos. — Não quero ser culpado pelo que acontecer com você, um acidente mais sério, por exemplo. Eu nunca me perdoaria se você se machucasse.

— Você prometeu, enquanto eu estava na maca da enfermaria. — Brilho os meus olhos, lacrimejando.

— Você pode esperar seu carro de aniversário e sua autoescola.

— Vai demorar. E eu preciso de uma animação na minha vida. — Solto-as e caminho até o carro. — Você é o único que pode me ensinar a dirigir.

— Não é uma boa agir como irresponsável.

Deixo sua voz fria pairar no ar, sem vontade de responder, apesar que penso em te xingar por isso. Não sou irresponsável, apenas agindo menos adulta, sem carteira e batendo os faróis em lixeiras a frente. Bato a porta enfurecidamente, coloco o cinto e deito a cabeça no descanso do banco. Benjamin volta depois de dar dinheiro a mulher, dona da lixeira. A porta ao meu lado bate, o barulho me faz dar um pequeno pulo.

Olho obscuramente pela estrada íngreme, imaginando se vale a pena subir só para Ben não olhar pra minha cara apática, indiferente. Acomodo meu ombro na janela fria, me apertando quase me tornando pertencente a ela. Olhando pelas muralhas de casas iguais com cores quase iguais, só para não ligar pra sua mão segurando a minha, passando calor que acha que eu me importe e que vou me acalmar.

Ele se torna um covarde no meu primeiro deslize, como no dia em que pedi pra me ensinar a dirigir. A minha animação quase se foi quando ele decidiu me ensinar, agora ela se vai, plenamente. Não tenho certeza se parecer irritada com ele, poderá fazê-lo desistir da idéia de não me ensinar, mas eu estou praticamente chorando pelos dois motivos, um progresso ridículo.

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