100 - INEVITABILIS, ato ii

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O casulo ergueu o olhar, desnorteado pelo golpe na cabeça. O sangue frio que corria pelo seu rosto pingava do queixo para o chão, grosso e quebradiço, era de uma cor pálida feito os mortos que desejava levar para a cova.

Caos era a palavra-chave para o quê acontecia ao seu redor. Pessoas e títeres corriam para todos os lados, tentando escapar dos mares pesados de corrupção que jorravam para fora do sagrado broto do Girassol Dourado, enquanto a autonomeada Rainha Incursio ordenava as criaturas vis a se arrastarem para fora.

A Besta das Cinzas teria morrido com tamanha quantidade de corrupção caso ela não fizesse parte de seu ser.

Grunhira de forma irritada, a garganta seca e a testa latejando. "Curandeiro filho da...", murmurou. "Quando eu matar aquela Imperatriz, ele vai ser a única audiência...!"

Aparições se formaram na sua visão. A Besta tossiu, notando a falta de corrupção das figuras. Virou a varinha entre suas mãos, deixando a lâmina apontada para cima como se fosse uma adaga. Calmo, arrastou os pés tortos pelos espinhos do chão, a magia dos horrores o acompanhando como um manto.

Eu preciso de algo para me curar, pensava, o estômago roncando. O corpo irá se destruir em breve...

Preciso viver mais um pouco.

Ao fundo, avistou uma aparição brilhante próxima. Poderia facilmente sugar toda a sua magia para poder andar e lutar pelas próximas horas. Não seria seu primeiro assassinato, mas sentiu-se mal por não poder continuar com seu próprio show de horrores sem precisar disso. Ao menos, poderia derramar o sangue de um cavalheiro cruel.

A bela joia acredita que a Besta das Cinzas irá tentar matar a tal figura, independente dela ser um cavalheiro ou não?

Talvez nosso antigo Matías esteja quebrado demais. Talvez ele esteja corrompido demais. Talvez não. Ele já ultrapassou os limites – não há rota de redenção. Não há escapatória. Não há nada para voltar a não ser as ruínas de um corpo que chamou de casa e as memórias das vidas que destruiu para poder obedecer a Profecia. Não há nada para ele a não ser a misericórdia da morte.

Mas você espera que ele não mate ninguém a partir de agora, não é? Você deseja o ver sendo melhor do que isso. Você anseia que ele supere. Você, apesar de tudo, ainda consegue enxergar alguma coisa boa na criatura.

É lamentável.

A coisa se arrastou, arma empunhada, e requebrou-se rumo à vítima, rezando para que a magia que fosse tomar para si fosse o bastante para durar até o fim. Pois se não pôde viver em paz, então iria fazer da sua morte uma explosão para o mundo jamais esquecer.

A graça da autodestruição é que ela é poética apenas em uma história.

Você deseja uma morte assim? Uma explosão?

Você mal consegue ter energias para se sustentar, bela joia, quanto mais liberar tudo no fim.

Pare de ler. Já se passaram das nove da noite. A exaustão toma o controle da mente humana depois deste horário. Destrói sua cabeça. Devora de dentro para fora.

Nossas piores crises sempre são de noite.

Pare de ler.

Você precisa viver. Então durma, criança. Durma.

Não se destrua, não se machuque. Apenas durma. Você ainda possui controle, e do controle há esperança, e da esperança há a ideia de que ao menos isto, a corrupção não irá tomar.

Ao menos isto, ela não devorou.

Você não é o Olhos de Fogo, criança.

Você é melhor do que ele.

(LGBTQIA+) O Conto do Feiticeiro MalignoWhere stories live. Discover now