Max

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Max dedicou seus dias de repouso a ler sobre a cultura celta. Como leigo no assunto perdia tempo por não saber exatamente onde procurar. Era tudo muito denso e com referências que ele não conhecia por não ser afeito a essa cultura. Portanto, perdia tempo buscando minúcias para entender todo o contexto do que lia.

Nessa busca contava com o auxílio de Nina e dona Eglantine.

Nina queria contar a Pérola sobre o sortilégio, porém Rafael andava preocupado com a saúde mental da amiga e sugeriu que não estimulassem a confusão pela qual Pérola passava.

Pérola sofria por não lembrar sua história com Max, embora as suas reações a ele se mostrassem tão intensas que não a deixavam duvidar que já o houvesse amado e pra ser sincera ainda o amava. Por diversas vezes ela esquecia o rosto da filha que estava distante tendo que recorrer às fotografias e recortes de jornais para reconhecê-la.

Nesses momentos ela era tomada pelo medo, culpa e tristeza.

Um dia, em mais um episódio de amnésia, Pérola revirou toda a mansão em busca de alguma coisa que a fizesse se lembrar do casamento com Max. Ao final da busca ela estava melancólica e sem rumo.  Assim, Nina e Max concordaram que seria arriscado falar sobre o sortilégio com ela.

Todas essas buscas estavam mexendo com Max e vez ou outra ele se punha a sonhar com ele e Perola vivendo outras vidas e tudo parecia tão real...

O sonho...

O movimento na vila era intenso. Domingo era dia de feira. Findado os serviços religiosos, após a missa, a população se prestava ao escambo e comércio. Donos de cabras ofereciam o rebanho excedente em troca de sacas de feijão, arroz, milho e outros víveres dos demais produtores.

Esses por sua vez trocavam seus produtos excedentes por cabritos, couro, mel, e objetos de ferro moldados pelo único ferreiro da região.

As moças prendadas ofereciam seus confeitos e quitutes que lhes conferiam o sustento e eram chamariz para um futuro marido. As mães lhe elogiavam os doces e junto faziam festa às qualidades das filhas que, segundo elas, seriam um primor pra qualquer marido.

Agora que tinha renunciado de minha posição junto a Ordem eu caminhava pela praça.

Passei anos colhendo confissões de homens e mulheres que traíram alegando um amor desesperado e impossível de fugir. Como padre me sentia imune a essas fraquezas e coerentemente os taxava de fracos pecadores. Aplicava lhes altas sanções, algumas mulheres pereceram no chicote, pois certas fraquezas são toleráveis aos homens, mas nunca às mulheres.

A doutrina diz caber a elas a submissão e a honradez do lar e do marido. Ela é o sustento do matrimônio e da família. Às mulheres esse tipo de fraqueza é punível com morte.

Hoje me pego vítima da fraqueza que me considerava imune. Eu traí. Não a alguém de carne e osso não a uma esposa, mas a Deus, a minha profissão, a minha missão religiosa.

Desde que a vi a primeira vez ao salva-la do meu irmão de ordem, ao pegá-la em meus braços, seu cheiro me entorpeceu. Ao olhar sua boca senti uma sede imensa de provar-lhe o sabor e a maciez, mas foi ao ver seus olhos me fitando que me perdi de vez por ela.

Lembro bem que minha primeira decisão foi deixa-la ali, me livraria da tentação e fugiria como um covarde. Porém a mesma devoção que me mandava fugir pra proteger minha missão e meu recato, essa mesma devoção me dizia ser meu dever de cristão prestar- lhe socorro.

Como havia previsto me perdi por ela, decididamente, completamente.

Agora que me desliguei da ordem a observo de longe. Ela sorridente ajuda o pai no escambo. Trocando mercadorias, organizando as sacas e cuidando pra que ninguém ouse roubar-lhes.

Paro observando seu sorriso. Ela me olha com ternura o que me da coragem para me aproximar.

Hoje pedirei sua mão. Há muito desisti de lutar contra o que sinto, me perdi em seu corpo e não há meios de me reencontrar. Tentei açoitar meu corpo para espantar o desejo que me consumia toda vez que a olhava, mas não adiantou.  Eu sangrava pensando nela. Tentei fugir e me enclausurar no templo, mas a levei junto para casa de Deus. Pecávamos em meus sonhos, eu conspurcava a casa do senhor com minha luxúria... Cheguei ao ponto de ver seus olhos na virgem no altar... Decidi parar de lutar. Vou servir ao senhor através da caridade, da oração. Vou fazer dela minha esposa.

Eu a amo e ela me ama. É o que me diz sua boca, é o que me diz seu corpo, seus gemidos e sua total entrega quando está nos meus braços.

É mais que paixão, desejo... É um amor que me faz questionar minhas crenças. Não creio em outras vidas, embora pense que só essa existência não será suficiente pra viver um amor tão grande.

Desvio os olhos do meu amor ao ver dois homens tentar toca-la. O ciúme queima meu corpo e dou passos em direção a eles quando ela faz sinal pra que eu não me aproxime. Sinto alguém me cutucando e vejo a criança que brincava com ela me entregando um bilhete, Abro.

“_ Embora meu coração esteja aos saltos por ver você, terei que pedir que se mantenha distante. Não se aproxime, papai me disse que combinou meu casamento com o ferreiro da vila. Disse a ele que não casarei, mas ele está irredutível. Encontre-me amanhã cedinho na Bacia das bruxas! Não vou perder você, meu amor! Se precisar fugiremos juntos!

De sua amada, Guertoud!”

Max acordou assustado. Esses sonhos eram agora constantes e pareciam tão reais. Se não fosse uma pessoa cética acreditaria serem lembranças de outra vida.  Via nos sonhos Pérola e ele mesmo como pessoas diferentes, mas os sentimentos eram tão reais que o remetiam aos momentos que viveu com ela e que por estupidez havia perdido.

Decidiu conversar com Nina sobre isso em outro momento.

Agora precisava se aprontar, seguiria para o Rio de Janeiro para o lançamento da linha de joias. Pérola iria junto, pois era uma das modelos da marca, além de desenhista das joias. Seria a oportunidade de conversarem e fazê-la compreender que se pertenciam.

Pérola e Max: Um amor, várias vidas! Where stories live. Discover now