-Margarida, os sonhos da tia já estão prontinhos, vem provar minha querida! - disse a senhora muito contente.
A sobrinha correu para a cozinha onde a tia Raquel se encontrava a polvilhar o açúcar e a canela nos sonhos, com os olhos sorridentes e brilhantes por detrás dos óculos redondos.
"Tão bons tia, desfazem-se na boca, a receita da mãe é diferente!" disse Margarida enquanto se deliciava com tal iguaria natalícia.
Raquel encheu duas canecas com chá de cidreira e levou a sobrinha para o sofá, na pequena mesa da sala pousou as canecas e um prato floral repleto de sonhos.
"Esta receita é da querida Rosa Paula, mestre das sobremesas de Natal e dos bolinhos de bacalhau, com ela eu nunca podia dizer pastéis!" Raquel desfez-se em risos, como parecia jovem quando se ria, não aparentava ter 63 anos.
Margarida era uma jovem adulta, tinha ouvido histórias da tia Raquel durante anos, Rosa Paula e Francisca tinham sido demasiado importantes mas só o nome da primeira circulava pelas conversas e pelas histórias ao pé da lareira.
"Ai tia, muito falas tu nessa mulher, como eu gostava de a ter conhecido, parecia ser tão moderna, tão ativista, tão corajosa!" a jovem encheu-se de curiosidade.
Os olhos de Raquel humedeceram com tais palavras.
"Essas palavras não chegam para aquilo que ela foi, ela viveu com tanta intensidade a revolução, ela fez tudo pelo meu verdadeiro amor!"
Margarida estava estupefacta e muito curiosa.
"Amor? o homem de quem te divorciaste?" perguntou-lhe a sobrinha.
Raquel aconchegou-se com a sobrinha no sofá.
"Minha querida, nunca te contei nada mas tu já tens 20 anos e creio que tenhas maturidade para perceber isto, o meu grande amor não foi o teu "tio" Vasco, o meu grande amor nem sequer foi um homem!" disse à sobrinha e esta teve uma reação de surpresa.
Deu gargalhadas no sofá e deitou a cabeça sobre as pernas da tia.
"Uma mulher? como se chamava?" perguntou eufórica.
A tia estava envergonhada e sorriu, sorriu com alguma tristeza.
"O nome dela era Francisca, era sobrinha da Rosa Paula, estes Sonhos lembra-me dela e do primeiro Natal que passei fora de casa, estávamos as duas tão tristes, tão desanimadas mal sabia eu que seria o começar de uma descoberta, de um grande amor, do amor da minha vida!"
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A Liberdade de amar
ChickLit"A liberdade de amar" Lisboa, 1973, Maria Raquel tem 22 anos e prossegue os estudos na Faculdade de Letras, era uma privilegiada, nunca sentira na pele a miséria da ditadura. Vivia no Lumiar com a família, um ambiente bastante tradicional, bastante...