Infância II

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Osamu sente seu mundo se fechar em uma pequena bola escura. A sensação que passa por seu corpo é como ser fechado dentro de um armário com mais de cem chaves; sem esperança de algum dia sair de dentro daquela escuridão sufocante.

O ar sai de seus pulmões, é quase difícil de respirar. Seus olhos vão diretamente para o chão, vendo os pingos escuros de gelo derretido. Osamu também consegue ver os sapatos escuros do garoto supostamente desconhecido.

Não há nada de "supostamente". O desconhecido é bem conhecido. É Suna. Suna Rintarou. Ao vivo e em cores.

Eu sabia. Eu sabia. Eu sabia.

Mas no fundo, ele desejava não saber. De todas as surpresas que Osamu teve desde que abriu seus olhos nessa manhã, essa era a menos que ele esperava.

Osamu pisca várias vezes para o chão, tentando focar seus olhos dos borrões que impregnam sua visão. Não são lágrimas, embora Osamu sinta uma imensa vontade de chorar. Uma vontade que ele não consegue reconhecer de onde vem. Osamu se sente incrivelmente pequeno e sufocado, mesmo em um espaço aberto com o ar mais puro que as árvores poderiam oferecer.

"Ei." O garoto, Suna, o chama. Sua voz deixou o tom defensivo e acuado para dar espaço para um tom mais agudo. Um tom de uma criança assustada. "O que você está fazendo? Você está passando mal?!"

Sim. Osamu quer dizer, mas não consegue. Estou vendo a porra de um fantasma, como eu poderia me sentir bem depois disso?

Mas este Suna não é um fantasma. Sua pele é pálida, mas não parece morta. Seus olhos não pareciam desfocados. Ao olhar para Suna, Osamu tinha a sensação que poderia sentir o calor que seu corpo emitia.

Onde eu estou?

Suna não parece saber o que fazer. Seu sorvete meio derretido cai no chão por conta da reação de Osamu; o garoto fica apenas parado enquanto o gêmeo mais novo lida com diversas sensações desagradáveis que percorrem seu corpo.

Não apenas sensações, mas pensamentos também. Osamu está confuso, perdido, desorientado, sozinho. Sozinho em seu passado, sem saber como voltar para casa. Para seu tempo original; para sua vida normal.

Osamu percebe que até mesmo o seu sorvete tinha caído no chão, embora ele não saiba quando isso aconteceu. Quanto tempo havia se passado desde que Osamu se perdeu em um mar de sensações ruins? Quanto tempo havia se passado que a figura infantil de Suna estava ali imóvel e rígida, apenas o observando em seu sofrimento?

Quando o pé esquerdo de Suna é movido para trás, é que Osamu consegue voltar parcialmente para a realidade. Nesse meio tempo, o pé direito de Suna se move também, se afastando de Osamu.

Osamu move seus olhos para o rosto do garoto. Seu semblante ainda é de uma criança assustada e perdida. Não é uma boa expressão para uma criança tão jovem.

Nenhuma das expressões que Suna lhe deu eram. Tanto neste passado, quanto no outro. Raros sorrisos, expressões cansadas e desinteressadas. Osamu nunca tinha pensado profundamente sobre isso até que aquela tragédia havia acontecido.

Quando Suna tenta se afastar ainda mais de Osamu, com uma posição perfeita para se virar e fugir. Osamu não perde tempo e agarra o braço do outro garoto. Não querendo que ele escape. Sua ação havia sido inconsciente, o gêmeo se sentia sufocado demais para observar Suna com atenção e agarrar o local correto; deixando seus músculos fazerem o trabalho por ele. Osamu só percebeu que tinha sucesso em sua ação quando sentiu a pele fria de Suna entrar em contato com sua mão levemente úmida.

Wherever You Will GoWhere stories live. Discover now