05- Vitória

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Sentia um sol quente no rosto e eu estava sendo chacoalhada até que o caminhão parou e eu comecei a ouvir vozes.

- bom dia Firmino, vamo carregá esse trem?

- bom dia assunção, bora.

Merda.

- abre a carroceria aí que eu vou chamar os menino que vai ajuda.

Essa era a minha deixa, quando o tal do Firmino abriu a carroceria ele não me viu porque eu estava atrás de algumas lonas, as mesmas que amorteceram a minha queda quando entrei aqui, e aproveitei para sair enquanto ele de costa pegava umas ferramentas no chão.

Meu corpo parecia estar pior, tudo doia em dobro. Minha mente estava falhando, eu não entendia o que estava acontecendo não reconhecia as ruas, não reconhecia nada e então quando cruzei a primeira esquina me deparei com uma senhora.

- bom dia senhora, que horas são?

- bom dia minha fia, porque océ tá machucada desse jeito?

- senhora por favor, que horas e onde eu estou?

Ela olhou num relógio simples em seu braço que estava desocupado, porque no outro tinham várias sacolas.

- é 16:30

Nossa eu tinha dormido muito.

- e como se chama a cidade?

- fia ocê tá em São Tomé dos Anjos.

São Tomé dos anjos? Onde fica isso? Onde eu vim parar meu Deus?
Eu tinha dormido demais. E eu não conhecia essa cidade. Não no nosso estado pelo menos. A menos que...

- que estado eu estou?

- Goiás.

Goiás?
Eu estava a não sei nem quantos quilômetros de casa, eu estava em outro estado. Eu me lembro que era por volta de 3 da manhã quando eu consegui sair e entrar no caminhão então, se agora são 16:30 eu viajei por mais de 12 horas de caminhão. Eu estava aliviada. Eu estava muito longe de Gusto, muito longe.
Comecei a chorar e a senhorinha já ficou preocupada.

- minha fia vamo pra minha casa, num tem muita coisa pra te oferecê, meu marido é brabo, mais ele não vai se importa, se eu te ajuda.

Meu marido é brabo.
Essa afirmação me deu pânico.
Chega de homens bravos e de pessoas que possam me machucar.
Comecei a correr como podia e ouvia a voz da senhorinha bem lá no fundo, ficando cada vez mais longe.

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Já fazia algum tempo que eu estava caminhando por uma estrada de terra, tinha várias plantações em volta, muito verde também, eu não via nada além disso.
Pra onde eu estava indo?
E se  ficasse nesse mato até anoitecer e não achasse nada? O que ia ser de mim?
De repente eu comecei a ouvir um barulho que eu pensei ser um caminhão ou uma caminhonete. O pânico me dominou mais uma vez.
Eu entrei pra dentro de uma plantação de milho e fui me embrenhado no mato.
Eu estava exausta, com fome, com sede, o calor estava demais, meu corpo doía. Aos poucos eu fui ficando cada vez mais fraca e enquanto corria senti minhas pernas falharem a vista começou a ficar turva e eu caí, mais não sem antes perceber alguém vindo ao meu encontro.

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- de onde você acha que ela veio?

- nao sei, mais é nítido que ela estava fugindo de alguém, e que apanhou muito.

- será que foi dos pais?

- ora não sei João, pode ter sido, ela é uma crianca ainda, então não pode ter sido de algum namorado, pode?

- quando ela acordar a gente vai saber.

- vai dar uma volta na cidade e sondar, vai que tem alguém procurando por essa menina.

Eu estava ouvindo essas vozes bem no fundo. Eu ouvia mais não tinha forças pra reagir, mas ouvir que poderia ter alguém me procurando fez eu tentar me movimentar e mostrar que não podiam fazer isso.

- calma mocinha, calma, descanse, chamamos um médico pra cuidar de você, logo estará bem.

E assim apaguei de novo.

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Eu ouvia uns barulhos de vento quando comecei a recobrar a consciência. Abri meus olhos e comecei a olhar tudo em volta.

Eu estava num cômodo bem grande, era um quarto.
A cama que eu estava era grande e macia, tinha um guarda roupa bem grande e uma comoda, do meu lado direito tinha uma mesa de cabeceira com um abajur que era a unica iluminação da casa e um copo com água. Estava coberta por um lençol, e por baixo vestia roupas que não eram minhas.

- como você está?

Levei um susto com a voz de uma mulher que estava num poltrona do meu outro lado da cama e quando ela veio e minha direção eu assustei.

- não chegue perto de mim.

- calma menina, está tudo bem, eu não vou te fazer mal.

A pouca iluminação do quarto me fez ver que a expressão da mulher era de preocupação.

- onde eu estou?

- está na fazenda Alto dos Pinheiros.

- em Goiás? - como eu já sabia que estava.

- sim, você pergunta como se não fosse daqui do estado. De onde é?

Não posso deixar ninguém saber de onde eu sou.

- onde estão as minhas roupas?

- estão no varal, amanhã estarão secas. Acha que consegue comer alguma coisa?

Eu ia dizer que não queria nada mais fui traída pela minha barriga que roncou no exato momento em que ela terminou a pergunta.

- acabamos de jantar, vou pedir pra prepararem um prato pra você.

Ela se levantou abriu a porta e chamou.

- Maria, por favor faça um prato de comida, ela acordou.

- como eu vim parar aqui?

A senhora se sentou de novo.

- era por volta de cinco e meia da tarde quando eu estava aqui dentro e um dos nossos empregados , o João te trouxe nos braços. Ele disse que você vinha correndo pelo milharal desnorteada e que ele percebeu que estava machucada e fraca e aí você caiu, ele te segurou, e aqui estamos nós. Quer contar o que aconteceu?

- não

Nesse momento o quarto foi aberto e uma senhorinha entrou, com uma bandeja com suco, uma maçã e um prato com arroz, feijão, uma carne picada, um refogado e salada. Tinha bastante comida no prato e eu com certeza não ia comer tudo.

- eu não vou comer tudo isso, vai desperdiçar.

- não tem problema, não vai ser desperdício se essa for sua preocupação, aqui temos porcos, tudo que sobra é colocado pra eles.

A senhorinha que ouvi dizer chamava Maria saiu e eu fiquei sozinha de novo com a outra mulher.

- como se chama?

Algo na minha mente me dizia pra contar tudo pra ela, mais meu medo falava mais alto.

- eu não...

- o meu é Amélia, eu sou mãe do dono deste lugar.

- eu não quero encomodar, assim que me recuperar eu vou embora.

- ninguém está te mandando embora vitória, fique tranquila.

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