CASAMENTO DE FACHADA: HERDEIROS

Capítulo 34

Por algum milagre divino, o restante do almoço se seguiu em silêncio, mas o olhares eram bem duros e cheios de ódio. 

-Até que correu tudo bem - minha mãe disse.

Eu ri.

-Realmente, se compararmos esse com o ultimo almoço, pelo menos ninguém tentou enforcar o outro - falei.

Minha mãe deu de ombros.

-Enforcar? - Arthur perguntou assustado.

Eu e minha mãe nos olhamos e rimos ao lembrar de Debie voando no pescoço de Gorete depois que ela a chamou de caminhoneira. 

-Vai por mim, minha família tem alguns parafusos a menos - falei.

Olhei para Debie e ela encarava meu pai com raiva. 

Algo estava incomodando ela de verdade. 

-Mas enfim, depois de toda a confusão, poderíamos nos conhecer melhor...  Tenho certeza que sou melhor do que imaginam - falou minha madrasta com um sorriso que me fazia querer quebrar aqueles dentes.

-Duvido - disse Debie com desdém. 

Minha madrasta a olhou, triste. Ou pelo menos fingidinho estar triste. Meu pai já nem estava com paciência para nos repreender, algo nele já havia desistido de intervir naquela discussão. 

-Oh, minha querida enteada, vamos tentar manter a paz - minha madrasta disse. 

Debie bufou. 

Minha irmã se levantou e lançou um olhar furioso em direção a minha madrasta e em seguida ao meu pai. 

-Já que terminamos com o show de horrores, vou embora - falou. 

-Débora - meu pai disse. -Fique.

Debie riu sem humor. 

-Eu não sou cadelinha das suas ordens igual a Eliz e o Felipe - ela bravejou. - Você não manda em mim. 

Aquele comportamento de Debora estava começando a me deixar preocupada. Ela geralmente engolia todas as provocações de nosso pai calada. 

-Eu sou seu pai - ele gritou. 

-Um ótimo pai, inclusive - ela falou ironicamente. 

Débora saiu andando pesadamente para fora a tenda e eu a segui. 

Seus passos eram rápidos, mas consegui alcançar ela assim que chegou no estacionamento. 

-O que esta acontecendo com você? - perguntei. 

Ela se virou com ódio no olhar. 

-Você é igualzinha a ele - ela falou. - Só faz as coisas que ele te manda, mesmo que isso me prejudique.

Eu a encarei confusa.

-Débora, se quiser agir igual uma criança e ficar me acusando de algo que eu não sei, tudo bem - falei rispidamente. - Agora se puder agir igual uma adulta e me contar o que houve, seria melhor.

Seu corpo se virou em minha direção e demonstrava uma expressão de ódio. Seus músculos estavam tensionados e sua mão fechada em punho.

-Eu achei que você estivesse cuidando de mim - ela falou. 

As lágrimas começaram a tomar conta dos seus olhos, mas eu não conseguia entender o motivo de tudo aquilo. Eu não poderia abraça-la, pois ela me acusava de coisas que eu não sabia do que se tratava.

Passei toda a minha vida sendo apedrejada dentro da minha casa e a única pessoa que eu ainda cultivava certo afeto estava ali me acusando de coisas que eu não fiz. 

-Se quer tentar brincar de jogo da adivinhação, estou fora - falei, já irritada. 

Uma gargalha histérica saiu de sua garganta. 

-Acha que eu não sei que se juntou com o papai para que eu ficasse com o Ian? - ela gritou. - Como eu pude acreditar em você?

Olhei para ela, pasma. 

-Não faço a mínima ideia do que você está falando - disse. - Pode ser mais clara, por favor.

-Peguei uma conversa do Ian com o papai e ele agradecia Ian por estar comigo, que tinha sido um grande favor para ele - ela gritou. 

Eu a encarei. 

-O papai não faria isso - falei, com a voz falhando, dando alguns passos para trás. 

Ela riu, sem humor. 

-Só você que não vê o monstro que aquele homem é - ela gritou. - E você o ajudou, me convenceu que o Ian era um cara legal. 

Seus olhos estavam cheios de lágrimas. 

-Eu realmente pensei que ele fosse - falei. - Não imaginava que seria assim. Acha mesmo que jogaria você para cima dele se eu soubesse que era o papai que estava por trás disso? Depois de tudo que passei para te apoiar? Eu sou sua irmã, caramba, deveria confiar um pouco mais em meu caráter. 

Finalmente as lágrimas começaram a escorrer freneticamente por suas bochechas e ela me encarou triste.