vinte e seis

65 12 1
                                    

Após sair do prédio de John, caminhei descalça pelas ruas, em busca de um caixa eletrônico com digital. Saquei o suficiente para o metrô e fui para casa. Subo as escadas calmamente, sentindo meus pés doerem enlouquecidamente. Quando finalmente chego em meu andar, quase dou meia volta, ao encontrar alguém sentado na minha porta.

— Ah pelo amor de Deus. — murmuro, revirando os olhos. — Que merda faz aqui?

— Esperando você chegar. Já estava achando que não morava mais aqui.

— Essa idiotice já é óbvia, Nicolas. Ou devo te chamar de Nicco?

Ele se levanta e me dá espaço para abrir a porta.

— Chegou de manhã... com a roupa de ontem... pelo visto a noite foi boa.

Volto a revirar os olhos. Aquele tom de deboche estava me deixando ainda mais irritada do que eu já estava.

— Olha aqui — me viro para ele, que já estava se preparando para entrar atrás de mim. — você não pode simplesmente aparecer na minha casa quando bem entender. Você não perdeu nada aqui.

— Na verdade, eu perdi. E só me dei conta quando a vi indo embora com outro homem.

— Então percebeu tarde demais. Adeus.

Eu tento fechar a porta, mas Nicolas me impede colocando o pé na frente.

— Pelo amor de Deus! — resmungo. — Me deixa em paz, cara. Eu só quero tomar um banho e ficar na minha. É difícil?

— Eu preciso conversar com você. Me explicar.

— Não quero ouvir nenhuma historinha triste, que termina como motivo para você ter me deixado. Já passou, Nicolas. Eu superei você.

— Eu percebi a forma com a qual você me olhou. — ele sorri, ganancioso. — Tenho certeza que não superou nada.

— Nicolas, estou falando sério com você. Tira o pé da minha porta. Quero ficar sozinha.

Nicolas retirou o pé e ajeitou o paletó sobre seus ombros. Como ele vestia a roupa do dia anterior, aquilo me leva a crer que ele passou a noite inteira sentado na minha porta.

— Eu vou, mas eu volto.

— Não volte.

Sem pensar duas vezes, bato a porta na cara dele. Até consigo escutar sua risada, como se achasse tudo muito engraçado.

Jogo os saltos no chão e retiro o vestido, deixando-o dobrado sobre o sofá. Permaneço ali por uns segundos, encarando aquele tecido, lembrando da forma que ele havia sido tirado na última noite.

— Que ódio! — grunhi, deixando o vestido de lado e indo diretamente para o banheiro.

Entro com tudo embaixo da água quente, sentindo meu cabelo embolado ir abaixando. Quando passo o sabonete pelo corpo, reparo as diversas marcas rodeadas que eu tinha espalhadas por ali. Meus seios, barriga, nas coxas... John marcou o território direitinho.

— Pena que fez merda.

Após o banho, enrolei-me em uma toalha e fui para a cozinha. Não tinha nada por ali, além de louça suja. Ignorando o barulho que meu estômago fazia, vou diretamente para o meu quarto e deito, disposta a dormir e esquecer tudo o que minha mente insistia em me fazer lembrar.

[...]

Eu conseguia escutar o barulho do meu celular, só não sabia onde ele estava. Me sento na cama e olho tudo em volta, sentindo minha cabeça girar. Ela doía como nunca e eu sabia que era pelo fato de não ter me alimentado ainda.

Levanto e caminho, seguindo o som do celular. Encontro-o no chão da sala, embaixo da mesa de centro. Logo que o pego a ligação para. Era Lilian, mas tinha diversas outras ligações de John.

Sento-me no sofá nua, já que a toalha que me cobria ficou pela cama, retornando à ligação de Lilian. Assim que ela atende, batem à porta.

— Está beeeem. — resmungo, me levantando. — Já estou abrindo a porta.

— Mas eu não estou na...

Não era Lilian que estava ali. Era Nicolas. Dei um berro quando o vi e bati a porta mais uma vez em sua cara.

Ei! — ele bate na porta, enquanto sinto meu corpo todo enrubescer de vergonha. — Já vi isso aí tudo. Abre essa porta.

— Quem está aí? John?

— Antes fosse. — resmungo, indo até o quarto. — É a merda de um fantasma.

— Não sei se entendi.

Coloco um vestido qualquer e volto para a sala, disposta a mandar aquele fantasma para a puta que o pariu.

— Eu te ligo depois.

Desligo a ligação e jogo o celular no sofá, no mesmo instante que abro a porta. Nicolas estava escorado na madeira, olhando para o nada.

— Poxa, estava melhor sem esse vestido. — ele sorri, malicioso.

— Não fui bem clara de manhã?

— Eu disse que voltaria e sempre honro com minhas promessas.

— Nem sempre.

Nicolas me fita por alguns segundos e finalmente se desencosta da parede.

— Eu sempre tive um sonho. — diz. — Toda vez que via aquelas grandes produções de cinema, eu sabia que queria estar ali. Queria ser um dos motivos para o filme acontecer. E quando a chance apareceu, eu não podia simplesmente ignorar.

— Primeiro, que eu nunca soube disso. Quando te conheci, você tinha acabado de sair da faculdade e nunca me disse do que tinha sido. Afinal, todas as vezes que nos encontrávamos, ou fazíamos sexo ou brigávamos por algo idiota. Inclusive naquela noite em que você me pediu um tempo para pensar, nós brigamos porque você queria sair e eu tinha que ir ao hospital ver meu pai. Sabia que ele morreu uma semana depois? Tive que lidar com duas perdas. A do homem que me amava incondicionalmente e a do cara que eu amava.

— Sempre amei você, Emma. — Nicolas diz, após longos segundos de silêncio. Se ele parecia desacreditado de tudo o que eu disse, eu estava ainda mais. Era como se um engasgo eterno tivesse passado. — Só não sabia como escolher.

— Bem, você escolheu. Se tivesse ao menos me contado o que queria fazer ou a oportunidade que recebeu, talvez nós estaríamos juntos até hoje. Ou não, né. Eu não nasci para o mundo da fama.

Ele revira os olhos e segura a minha mão. Até tento puxá-la, mas Nicolas segura mais forte.

— Olha, que tal nós deixarmos o passado onde ele deve ficar? Realmente quero contar tudo com mais detalhes para você e matar a saudade que sinto. E tenho certeza que você também sente, não é?

Encaro-o com o olhar vazio, mas a mente cheia de momentos bons e agradáveis que passei ao lado dele. Eu amei Nicolas com todo o meu coração, mas aquilo passou. Não era ele que residia em meu coração.

— E aí? Não vai respondê-lo?

Olho através de Nicolas. John estava no topo da escada, nos encarando furiosamente, enquanto segura o corrimão com bastante força.

— Sente ou não saudades dele?

Hotline BlingOnde as histórias ganham vida. Descobre agora