Essa carta Amélia mandara há pouco tempo à melhor amiga e ainda esperava resposta quando chegou a de Fabrício. A carta de Fabrício... Com aquelas... Palavras... Desconcertantes. Palavras que revolveram seu âmago e lhe tiraram o chão. Arrebataram para sempre sua liberdade. Ela a entregaria por próprio querer! As palavras de Fabrício... Misturou-as com aquela em que ele revelava o desejo de vê-la pelo avesso e teve sonhos calorentos e inexplicáveis.

 

“Amo Filipe, por ele daria a vida, e me morro em pensar na possibilidade de que algum mal lhe aconteça na guerra. Como podes desprezar alguém que derrama sobre ti tanta afeição, e que, tu mesmo confessas, muito te afeta?”

 

A carta de Ana chegou uns dias depois da de Fabrício com essa questão. Havia sentimentos dentro de si que a boa e cordata amiga jamais poderia compreender. Contudo, em sua lógica simplista, tão próxima da felicidade, tinha de admitir, ela tinha razão.

As faces de Amélia queimaram naquela tarde em que entrou na sala e, sem rodeio, num chofre, o pai baixou a Gazeta da Tarde e declarou:

— Teu noivo está voltando para o Rio de Janeiro. Para casa, Amélia. É um herói de guerra! Condecorado! Não ficas orgulhosa?

Havia uma alegria quase briosa no semblante de Crisóstomo e, Amélia forçando a garganta, conseguiu dizer:

— Herói... Fabrício?

— Sim, meu anjo. Fabrício. Foi dispensado da guerra e é um herói declarado da batalha de Tuiuti, a qual vencemos com grande soberba! — ele ria satisfeito por poder finalmente dizer aquelas palavras que tão atrasadas foram noticiadas na Corte.

Amélia passou a esperar qualquer manifestação por parte dele. Porém, nenhuma carta. Nada. Em outubro ela e a mãe escolhiam fazendas para os bailes de fim de ano quando encontraram D. Esterlina na Rua do Ourives. “Meu neto chega ao princípio da semana que entra. Não imaginas, querida, como está ansioso por ver-te.” Os olhos negrosveludosos da avó de Fabrício, como sempre, tinham uns mistérios que a atraíam.

Naquele fim de semana, recebeu uma missiva curta de Fabrício. Quando a mucama lhe trouxe a carta no quarto sentiu um tremor. Nem tinha aberto o envelope e pressentiu que o que havia ali era de uma tão enorme importância e drama, que postergou abri-la. Bebeu um copo de água e, num arrufo, quebrou o lacre e falou alto, feliz por estar sozinha:

 — Que é dessa vez? Vamos, que é dessa vez?

“Beira Linda, Outubro de 1866,

 

Amélia,

 

diga-me, que não quero mais perder dias, menos ainda anos, em cortejares infinitos. Diga-me! Tu me amas? Não sou tolo para não ver que não me pões em desesperança. Porque, afinal, aceitaste essa correspondência entre nós dois! Para não dizer que dispensas os pretendentes e a mim cozinhas em fogo brando. Se disseres que me amas, preciso saber em que quantidade. Se tiver amor por mim, não o aceito se não for grande, desses eternos, desses de inseparáveis. Assegure-me que esse amor seja incondicional. Incondicional! Suspeitas o que significa um amor incondicional?

É um amor assim e só assim que almejo.

Teu silêncio tem me matado lentamente, então não sabes?

Essa é minha última carta até que nos vejamos novamente. Quão difícil é compreender a feminilidade! Desisto. Por isso serei direto. Meus sentimentos estão já confessos. Que podes querer mais? Quero às claras saber os teus. Disso dependem algumas decisões.

Graciosa [Em Andamento♡]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora