Capítulo III

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III

Resplandecia a noite no fulgor exacerbado com que se alegravam os convivas do salão. Havia conversa, riso, flerte e dança. Depois de tantos anos, Fabrício bebia os minutos gole a gole. Já mal se lembrava, até então, o que era diversão.

Tinha sido, até aí, apenas um nome que há anos não aparecia na sociedade. Diziam as moças mais velhas, hoje todas casadas, que fosse talvez o mais belo espécime masculino que andara entre as paredes festivas. As mais jovens e mui casadoiras, recém-chegadas nos círculos sociais, não davam crédito, encantadas pelos modelos que a moda impunha.

Todavia, quando, nessa noite, na residência de D. Carlota ele entrou, elas entenderam porque convinha almejar um militar.

O porte poderoso esculpido com muita atividade física intimidava aos outros mancebos e provocava os hormônios femininos.

Por mais que tentassem se fazer de desinteressadas ou entediadas, era impossível não deixar perder o olhar naqueles ombros largos e nos braços fortes que o traje escuro não podia disfarçar. Vê-lo de farda enchiam-nas ainda mais de fantasias. Como vítimas de uma hipnose aquém da vontade, acompanhavam os gestos tão elegantes e que em nenhum momento perdia a virilidade e o charme. Toda aquela altura as faziam sentirem-se frágeis como pequenas bonecas de louça. Em seus braços, numa valsa, sentiam-se protegidas, contraditoriamente perdidas, a ponto de despencarem num susto e em queda livre em um despenhadeiro.

E Fabrício as fitava seguro de si, levando no semblante sempre essa expressão inteligente e levemente madura. Uma expressão que ninguém podia ler. Quando falava era maroto e divertia, derretendo os olhares femininos.

Nas rodas discretas de moças ouviam-se suspiros.

— Dizem que tem noiva... — alguém cochichava, amando ser a voz que contrariava. Usualmente a voz de uma recém-casada.

Confidenciavam no toucador os galanteios que lhes fizera com sua voz rouca. Criticavam os luzidios cabelos negros e fartos que ele esquecia rebeldes, mas no fundo a falta do sebo era o que mais gostavam nele. Comentavam a respeito de sua fortuna, dos títulos que o pai possuía e do título de condessa que possivelmente “a escolhida” ostentaria.

Especulavam: quem seria a noiva que diziam que ele tinha?

Vaidosas, todas as moças achavam-se capazes de roubar-lhe o coração com seus meio risinhos que deixavam despontar do leque, as jogadinhas de cachos louros, ruivos, castanhos e negros.

Até o final do evento tinham esperança de ser “a preferida”, a que tinha recebido mais atenção. Era incrível como, sob as luzes da festa, ele sabia distribuir sua simpatia e atenção, tanto às donzelas, quanto às matronas, e também aos homens ansiosos por ouvir histórias de quartel, rirem das situações que ele enfrentava nos distantes do Império.

A mulher que, invariavelmente, mais recebia sua atenção, podia-se saber sem receio, ao fim da noite, era alguma idosa risonha.

Então ele foi embora.

Era sempre assim quando ia embora.

A noite, apesar das horas infindáveis que o cansaço nos delicados pés das moças mais tarde denunciariam, durava muito pouco.

Amélia ouvia falar da temporada social e ardia querendo estrear, mas sabia ser ainda cedo. Podia ser considerada ainda uma criança, embora seu coração estivesse cheio de romance. Contava quantos anos faltava para dançar a primeira quadrilha, uma valsa... Ah, até suspirava. Com dezesseis ou dezessete anos, dissera um dia sua mãe.

Graciosa [Em Andamento♡]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora