𝙿𝚛𝚘𝚕𝚘𝚐𝚞𝚎

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Jungkook

Da primeira vez que vi Taehyung, não tinha muito tempo que me havia mudado para esse apartamento em Seoul. Não que eu detestasse viver em Miami, mas sempre disse que, quando quisesse assentar e viver uma vida mais calma, voltaria para meu país natal. Então, não pensei muito em minha decisão e voltei para a Coreia. Meu apartamento é confortável e espaçoso, até demais para somente uma pessoa, porém, era tudo o que eu queria: uma paz eterna em um lugar bonito e calmo.

Isso se não fosse pelos meus vizinhos do 316. Não que eu demonstrasse interesse ou fosse intrometido, mas sempre soube que algo estranho acontecia ali dentro, devido a todo o barulho e gritaria dentro do apartamento. Minhas suspeitas se confirmaram quando minha vizinha do 319 me disse, quando me veio dar as boas vindas ao condomínio, que não era uma boa ideia tocar na campainha. Se precisasse de algo, era mais fácil (e tranquilo) pedir a ela mesmo.

Por isso, me surpreendi quando, poucos dias depois de me mudar, escutei batidas em minha porta. Não saberia quem podia ser — sequer havia feito um open house para colegas ou familiares, ainda estava organizando tudo.

Me deparei, então, com Taehyung. Me lembro que, nesse dia, seus cabelos eram de um azul invulgar, seus olhos brilhantes e suas pupilas dilatadas. Já tinha visto o seu namorado passar no corredor, quando eu próprio saía para o trabalho. O mesmo sempre carregava uma carranca pesada e feições desagradadas, como se o mundo estivesse contra si. No entanto, nunca soube quem era o seu companheiro de casa.

E, passadas duas semanas de me mudar, o rapaz mais velho estava à porta de minha casa, suas mãos e lábios tremendo como se estivesse fugindo de algo. Antes que eu pudesse perguntar o que se passava consigo, o azulado pediu, em um sussurro que me foi difícil compreender, um pouco de sal emprestado. Foi uma primeira, de muitas, interação estranha, afinal, nem tivemos tempo de nos conhecer direito, visto que o mesmo nem me disse seu nome e foi embora o mais rápido possível assim que entreguei o saleiro a ele.

Aguardei a devolução do objeto por um bom tempo. Minha comida ficou insossa durante o resto dos dias, no entanto, não tive coragem de ir pedir de volta o recipiente do tempero sem cor — se fosse agora, não evitaria em dar umas batidinhas na porta de madeira escura. Segui à risca as orientações de minha vizinha e apenas esperei o até então desconhecido me devolver o saleiro que, talvez, estivesse vazio e, se eu fosse mais esperto, teria ido até o mercado comprar mais.

E foi com o toque da campainha que eu acordei de meus devaneios, indo em direção a porta e me deparando com o azulado bonito, que atiçou minha cabeça curiosa durante a semana.

A lembrança do silêncio ainda está presente em minha mente. O desconhecido olhava para os próprios pés, enquanto segurava o saleiro com tanta força em suas mãos que os nós dos dedos chegavam a ficar brancos. Surpreendentemente, o objeto estava mais cheio do que quando eu havia o entregado.

Aguardei o homem dar o primeiro passo, me entregar o pote ou dizer, pelo menos, "boa tarde". Para mim, era estranho ver o quão quieto e tímido ele era ao ponto de não conseguir me devolver algo que lhe foi emprestado. Agora, eu percebo o porquê da sua atitude medrosa. No entanto, no dia, me questionei: será que ele gostou tanto do saleiro que queria ficar com o mesmo e não sabia como pedir?

Arrisquei perguntar se estava tudo bem, recebendo apenas uma confirmação com sua cabeça como resposta. Olhei para os lados do corredor e nada. O homem era tão esquisito dessa forma? Indaguei se estava acontecendo algo e ele negou. Finalmente erguendo o rosto, porém não retribuindo o olhar, consegui enxergar suas pupilas ainda dilatadas e sua boca, que por sinal era muito bem desenhada, estava machucada de tão seca.

— Então... — decidi iniciar, suave. Aproximei minhas mãos do objeto que me pertencia, mas o rapaz tremeu e se encolheu, abraçando o pequeno pote na sua mão e, consequentemente, puxando-o para si. — O saleiro, você veio me entregar?

O desconhecido lambeu os lábios e mordeu o inferior, deixando as feridas mais evidentes. Pude perceber hesitação vinda da sua parte, não entendendo porquê, enquanto o mesmo me devolvia o pote, recuando as mãos em imediato e evitando qualquer toque desnecessário. Nos mantivemos, novamente, em silêncio. Eu estava meio sem jeito, sem saber o que fazer perante a sua timidez exagerada.

Suspirei e acabei pensando alto demais, sendo recebido com os olhos esbulhados enquanto eu dizia algo de como convidá-lo para entrar. Me senti um idiota, mas agradeci aos céus quando ele me pediu um copo d'água, alegando estar com um pouco de sede. Apontei para a cozinha e, a passos apertados e inconfiáveis, ele seguiu o caminho.

Assim que tranquei a porta, fui ao seu encontro, guardando o saleiro em seu devido lugar e procurando algum copo dentro do armário. Lembro-me que o rapaz colocou as mãos inquietas e bateu as unhas rentes no balcão em sinal de nervosismo. Pude ver, pelo canto do olho, ele morder os lábios repetitivamente, tirando pequenos fios de pele.

— Não faça isso. — falei, enquanto lhe servia a água. Ele me olhou e parou de instantâneo, aceitando o copo de bom grado. — Sua boca está ressacada, está machucando assim.

Ele assentiu em concordância e murmurou um pedido de desculpas, olhando para baixo. Franzi as sobrancelhas, não havia motivo para perdão, mas claro que sussurrei que estava tudo bem em resposta. O observei tomar a água, segurando o copo com as duas mãos. Parecia estar com pressa, como se estivesse atrasado para algo ou com apenas muita sede.

— Qual o seu nome? — perguntei, enquanto depositava o copo vazio na pia. Aproveitei o momento para encará-lo melhor. Vendo que o bolso do moletom vermelho que usava estava furado, fazendo uma parte de seu celular ficar para fora. — Eu sou o Jungkook. — sorri, tentando incitar o mais velho a dizer algo.

— Taehyung. — ele respondeu, passado algum tempo, mexendo nas mangas e evitando me olhar a todo momento.

E nunca pensei que, a partir daquele segundo, eu iria ficar a conhecer a horrível verdade por detrás do apartamento 316.

🥀

Adivinhem quem voltou quando disse que ia ficar quase dois meses de hiatus? Exatamente, eu mesma
Kkkkkk
A fic é uma colaboração com a lalipoolis , vão lá dar amor a ela (ela também vai lançar uma fic)
Aviso que essa fanfic vai relatar abuso e violência doméstica, portanto, se for sensível aconselhamos a não ler
Beijinhos e até ao próximo capítulo
Ca & Íris

Apartamento 316Onde as histórias ganham vida. Descobre agora