Capítulo 14: Voltamos

41 4 0
                                    


Miguel

Eu estava atrasado para o encontro, o que não é da minha personalidade. Sempre me irrito quando estou atrasado. No entanto, o fato de ter que voltar à P. todas as noites para dormir estava mudando minha disponibilidade de tempo. Eu tinha que fazer alguma coisa com urgência. A atitude que tomei foi extrema, quase desesperada, eu nunca faria algo do tipo se tivesse alternativa: contratei os serviços de um certo Ângelus, um sujeito considerado charlatão, mas que eu sabia ter dons especiais de verdade. Ele encontrava coisas. Circulava com certo prestígio pelo comércio de antiguidades e artefatos raros porque era capaz de localizá-los. Por um valor previamente combinado, ele podia dizer se determinada moeda tinha mesmo poder de atrair sorte, se certa porcelana deveria ser evitada na casa, e se aquele vaso chinês era mesmo chinês. Essa última habilidade era a que ele escrevia em seus cartões de visita e pela qual calculava seu imposto de renda. As habilidades mais "sensitivas" eram conhecidas apenas por seletos clientes, e ele entrava em ação o mais discretamente possível.

Quando cheguei ao local combinado, Ângelus já tinha se sentado e estava aborrecido. Olhava o relógio. Me sentei e não estendi a mão, afinal já conhecia por alto seus métodos peculiares. Ele não gostava de formalidades.

— O atraso não estava nos meus planos — falei. — Espero que isso não atrapalhe.

— Não atrapalhará. O que me preocupa é o tempo.

— Tempo?

— Sim. Seu problema tem mais de dois anos. Você deveria ter me procurado antes.

— Deveria, mas ainda não o conhecia. Porém, fiz algo que julguei útil. Pedi que uma pessoa que esteve com o... artefato recentemente o desenhasse. Aqui estão as gravuras. Espero que ajude.

Entreguei a ele os desenhos de Ester e ele os tratou com cuidado.

— Sim — disse Angelus, quase inaudível. — Isso está no tempo hábil. Seu artefato chegará.

— Enviei o pagamento ao endereço combinado. O restante chegará assim que a joia estiver na minha mão, sem danos a ela e a outros.

Ângelus passou um dedo sobre o papel e ficou pensativo.

— Isso vai ser difícil.

— Por quê?

— Há muitas energias envolvidas. Algumas são ruins.

Espantei o desgosto com um suspiro e mantive a praticidade.

— O contratei porque sei que pode lidar com todo tipo de coisa ruim.

Ele levantou uma sobrancelha.

— Nem todo tipo. Não lido com crimes. Em alguns casos, é preciso chamar a polícia.

Esse tipo de comentário era o que elevava o prestígio de Ângelus e fazia com que as pessoas confiassem nele. Não era nada aleatório. Ele sabia do que estava falando.

— Confie em mim. Quando for necessário chamar a polícia, eu chamarei.

E assim encerramos nosso encontro. Não vi nenhuma movimentação diferente, mas sabia que ele estava trabalhando. 


Ester 


— Como você passou o dia? — perguntou Miguel, depois de ter tomado banho. Ele estava falando com Alice. Ela sorriu para ele e quis sair quando ele a pegou no colo. — Fala comigo!

Insensatez (Em Andamento)Место, где живут истории. Откройте их для себя