Capítulo 21 - Helena

Start from the beginning
                                    

Não me incomodei em sequer interagir com ele, apenas me remexi na cama, buscando alguma posição confortável, o que era impossível naquele ponto da gestação. Fechei os olhos, torcendo pra que todo aquele desconforto não me impedisse de dormir rápido.

Eu só queria que esse pesadelo finalmente acabasse.


Abril de 2019


O Arizona continuava tão quente quanto eu me lembrava. Desci do avião, retirei minha bagagem e fui diretamente para a saída do aeroporto, onde um carro preto me aguardava. Era um processo longo e eu tentava, ao máximo, encurtá-lo. Dentro do carro, fui recebida por Lydia que, apesar de contida e aparentemente calma, me reservara um caminhão de perguntas.

— Achei que tivesse mandado você ir a Nova York. – falei rolando os olhos por trás das lentes escuras dos meus óculos.

— E eu achei que você estivesse louca de me pedir isso. – ela falou tranquilamente – Acho que podemos mandar alguém de confiança para lidar com o Ian, mas dos assuntos daqui... – ela falou pensando bem em suas palavras – Talvez seja melhor eu acompanhar de perto.

Ela tinha razão. Diante de tudo o que aconteceu, era melhor que Lydia fosse quem estivesse responsável por essa missão.

Eu definitivamente não sabia o que esperar. Ian passou todos esses anos procurando pela coisinha e nunca nem sequer chegou perto de encontrá-la. Mesmo com todos os recursos que ele investiu para encontrá-la, ele fracassou. Eu ficava pensando quais eram as minhas chances de encontrá-la aqui.

Lydia continuava dirigindo silenciosamente, até ela própria decidir quebrar o silêncio.

— O que pretende fazer? – ela perguntou me olhando pelo espelho interno e eu suspirei – Não sabemos nem se sua filha está viva e, se estiver, não fazemos ideia de onde encontrá-la.

— Vamos procurar. – disse sem me aborrecer com nada do que ela disse – Vamos procurar bem e, caso a gente não encontre a Clarice, colocamos outra menina no lugar. – dei de ombros – Essa é a vantagem do Ian nunca sequer ter conhecido a menina. Ela pode, literalmente, ser qualquer pessoa.

— Não acha que ele vá querer um exame de DNA? – Lydia perguntou e eu ri pelo nariz

— Não acha que essa é a parte mais fácil de toda essa situação? – rolei os olhos outra vez – E eu duvido que ele se dê ao trabalho. Se eu aparecer com uma garota de nove anos e ela chamá-lo de papai, ele esquece até o próprio nome. – ri com a ideia – O homem é obcecado pela ideia de ser pai, chega a ser irritante.

— Como pode ser tão fria diante dessa situação? – ela perguntou surpresa e eu ri outra vez – Você também perdeu uma parte importante de você, naquele dia.

— Não perdi. – disse com convicção – Não se faça de boba! Estava lá quando tudo aconteceu, não venha bancar a moral comigo agora. Não depois de todos esses anos. – falei com desdém e ela se manteve calada, com uma expressão que eu não fui capaz de decifrar – E só estou fazendo o que precisa ser feito para que Ian esqueça essa ideia estúpida de se divorciar. Se não fosse por isso, não haveria nenhuma busca pela herdeira perdida.

— Tem certeza que quer mexer nessa parte da sua história? – ela pareceu hesitar e eu suspirei irritada

— Eu não quero. – afirmei – Mas eu não tenho outra escolha. Ian me deixou completamente sem o que fazer. Preciso usar a artilharia pesada. Ele não pode sequer ter a chance de concluir seus planos ao meu respeito. Quando ele menos esperar, estarei pronta pra tirá-lo do eixo.

Não era difícil ter tanta indiferença reservada para um indivíduo que nasceu com o propósito de me tirar tudo o que eu mais gostava. Uma pessoa que sugou, de mim, tudo o que pôde ao longo de quarenta semanas e três dias. Um pequeno parasita que viveu em mim, do qual eu tentei, mas nunca consegui me livrar.

Eu não conseguia sequer chamá-la de filha, rejeitava tudo e qualquer coisa que nos relacionasse de alguma forma e gostaria de poder esquecer as quarenta semanas em que fui hospedeira daquele pequeno ser indesejado. No fundo, achava que se eu desprezasse o suficiente, ela simplesmente deixaria o meu corpo, mas ela era muito mais resistente do que eu lhe dava crédito.

Não lembro de ter sentido alívio maior do que o alívio que eu senti quando ela finalmente deixou o meu corpo. Era como se eu tivesse posto fim a uma grande sessão de tortura.

Eu finalmente estava livre.

Ter que procurá-la, nove anos depois, era como se a vida estivesse me preparando uma enorme rasteira e eu não poderia fazer nada para evitar a queda que ela me causaria, mas eu não podia me desesperar ou então isso, sim, seria o meu fim.

Eu precisava me manter calma e compreender que, na vida, devemos saborear uma vitória de cada vez.

Independentemente do que era necessário ser feito pra salvar o meu casamento, eu não pretendia permitir que esse fantasma me assombrasse por muito mais tempo.


...


Já havia pouco mais de uma semana que eu estava de volta ao Arizona. Apesar de, normalmente, eu dar um braço pra ficar aqui, bem longe de Nova York e os negócios da família, dessa vez eu me sentia insegura em deixar Ian tão livre. Eu precisava encontrar a Clarice o quanto antes. Eu não sabia como e nem quando, mas sabia que a próxima vez que eu pisasse em Nova Iorque, seria com uma menina de nove anos, chamando Ian de papai.

Disso eu tinha certeza.

Apesar do meu esforço pra conseguir esse feito, eu não conseguia esquecer daquele dia. Algo como aquilo não poderia ser esquecido por ninguém e, embora eu não lamente, ainda assim, foi algo que mexeu muito comigo.

Me remexi desconfortavelmente na poltrona onde eu estava sentada, afastando essa lembrança dos meus pensamentos. Meu celular vibrou com um número que eu salvei recentemente brilhando na tela, era de Nova Iorque. Atendi.

— Já tem mais de uma semana que estou pagando pelos seus serviços e não vejo qualquer tipo de resultado – falei com um suspiro e a voz do outro lado era jovial e até mesmo divertida.

A pessoa não ligava a mínima se eu estava lhe criticando.

— Isso acontece porque eu só repasso as informações que eu tenho certeza. Não vou ligar para compartilhar achismos. – responderam com segurança, me fazendo rolar os olhos – E o seu marido foi um cara bem difícil de se rastrear, essa semana. Se eu não tivesse convicção da qualidade do meu serviço, eu temeria ter sido comprometida.

— E foi? – perguntei endireitando minha postura e a mulher do outro lado da linha riu.

— Não me faça rir. É lógico que não. – ela respondeu com desdém – Mas suas suspeitas foram confirmadas. Ele tem outra mulher, tenho certeza disso. Só ainda não consegui identificá-la, mas estou trabalhando com isso.

— Como não conseguiu? – perguntei irritada – E se não conseguiu identificá-la, qual o motivo da sua ligação?

— Seu marido pode ser bem escorregadio quando quer se esconder. – ela me informou e eu bufei – Se você achou que isso seria fácil, sinto informá-la que você estava completamente enganada.

— Eu não pago os seus serviços pra que você ficar dando opiniões que eu não pedi. – falei entredentes e ela riu – Pago para você me dar os resultados que eu exijo!

— Que seja. Recomendo que você resolva o que precisa resolver. Do lado de cá, eu vou ter mais trabalho.

Desligamos a chamada e eu bufei, enterrando o rosto em minhas próprias mãos. Eu precisava encontrar essa menina. Sabia bem que ela seria a solução de todos os meus problemas.

Destinos Cruzados || Henry CavillWhere stories live. Discover now