Capítulo 1 - Allison

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As ruas de Phoenix, no Arizona, costumam ser cheias de vida na maior parte do dia. Algumas delas são extremamente movimentadas até mesmo nas horas mais tardias da noite, mas nesse momento tudo estava deserto, silencioso. Eu diria que parecia muito como eu me sentia nesse momento, mas isso seria mentira. Nesse momento, dentro de mim havia, na verdade, um caos que eu tentava a qualquer custo silenciar.

Eu estava voltando do trabalho. Trabalhava em uma empresa de telemarketing, em uma área bem distante de onde eu morava. Meu horário cobria o fim da tarde até o final da noite e, por ser longe da minha casa, esse era o horário que eu costumava chegar. Era meu primeiro dia de volta desde as semanas que passei em licença maternidade.

O que chegava a ser cruel, visto que eu não tinha um filho para exercer a minha maternidade. Não conseguia esquecer. Não conseguia fingir que aquilo não tinha acontecido. As horas mais tristes de toda a minha existência foram entregues assim, como uma simples obra do acaso, há exatas duas semanas.

Não era pra ser.

Era desesperador ficar em casa. Submersa na agonia que me preenchia ao passar tanto tempo cercada com todas aquelas lembranças de um futuro que poderia ser mágico, ainda que desafiador, mas não foi. Meu próprio corpo sendo um lembrete doloroso da maior perda da minha vida, a cada vez que vazava leite dos meus seios. Os mesmos médicos responsáveis pelos meus cuidados, recomendaram remédios para que o meu corpo inibisse a produção de leite, mas eu não quis. Apesar de tudo, eu queria fazer algo bom com a minha própria desgraça. Decidi que doaria tudo, em algum momento em que eu estivesse mais preparada pra isso, eu não sabia quando seria, mas o leite deveria ser o quanto antes.

Quando vi que ficar em casa seria a minha ruína, decidi conversar com meus chefes e pedir pra voltar. Eles relutaram e, mesmo que meu desempenho no trabalho fosse dos melhores, não foi tão fácil convencê-los. Embora achassem melhor que eu permanecesse em casa e me cuidasse, já que havia sido, de fato, uma infecção grave, eles acabaram aceitando o meu pedido.

Aquele era meu primeiro dia de volta. Eu passei o dia inteiro sendo tratada como uma vítima. Como uma coitada e eu odiei cada segundo daquilo. Perdi as contas de quantas vezes precisei mentir que estava bem, porque sabia que, na verdade, ninguém realmente ligava. Eu sabia que eu era a pobre Allison, a que perdeu o bebê de uma forma tão cruel e prematura. Odiava a forma que me olhavam, com aquela pena no olhar, que eles tentavam a todo momento disfarçar de compaixão.

O meu primeiro dia e eu só esperava que ele acabasse logo. Embora tivesse sido horrível, enquanto eu dava passos solitários em direção à minha casa, eu pensava que aquele era o início do longo, e doloroso, processo da minha cura.

Eu mal podia imaginar como isso mudaria a minha vida.

Continuei caminhando pela calçada, torcendo para alcançar logo o portão da minha casa quando ouvi um chorinho de bebê distante. Senti um frio na espinha, me perguntando o porquê da minha cabeça me pregar tantas peças como aquela. Senti meu coração se comprimir e as lágrimas arderem em meus olhos, tornando-me incapaz de enxergar qualquer coisa diante de mim. Sacudi a cabeça, tentando focar no que estava fazendo e sequei as lágrimas com força. Respirei fundo e então o choro parou. Achei que tinha funcionado, que era mesmo uma peça sendo pregada pela minha própria mente, a boa e velha autossabotagem.

Foi então que o choro voltou e eu percebi que era real, que vinha de algum lugar ali naquela rua. Não de dentro de uma das casas, mas sim da rua.

Sem eu perceber, minhas pernas voltaram a se mover. Como se o mesmo som que as tinha paralisado, de alguma forma lhes trouxessem a vida outra vez. Segui o som do choro. A cada passo o som se tornava mais alto e claro e eu quis chorar ainda mais quando me aproximei do portão de uma igreja e percebi que o choro vinha dali.

Destinos Cruzados || Henry CavillDär berättelser lever. Upptäck nu