Capítulo 17 - O suicídio

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"Até a morte" o acordo dizia.

Sabia que tinha que libertar Miranda disso tudo. Só sabia de uma forma de isso acontecer, e infelizmente eu precisaria de ajuda.

Apenas uma pessoa eu sei que poderia me ajudar.

Eu pego meu celular, que havia deixado em cima do casaco que vestia sobre uma pedra para não molhar, e vejo que Celine havia me mandado várias mensagens me procurando. De repente me lembro de que ela me vigia, com essa câmera do Inferno grudada em mim. Tenho que usar minha cabeça pra conseguir resolver as coisas. Mas quem consegue pensar direito quando o coração está gritando por socorro.

Fatos começam a fazer sentido: Benjamin é meu anjo-irmão. Não existe suicídio para anjos. Simplesmente não morremos se intentarmos contra nós mesmos. Apenas nosso anjo-irmão pode nos matar, sem sofrer consequências, em casos justificados. Esse seria um deles. Só Benjamin pode me ajudar agora. A questão é como chamá-lo sem Celine suspeitar.

De repente, a ideia me surgiu. Eu só precisaria da minha adaga estelar. Voei de volta a Pequim a toda velocidade, sabia que toda equipe deveria estar dormindo naquele momento, o que facilitaria muito o que eu viria a fazer.

(...)

— Dylan, querido – Celine disse, assim que eu abri a porta do quarto — onde você estava?

— Não é da sua conta – falei, sem olhar pra ela.

— Que besteira, é claro que eu sei EXATAMENTE onde você estava. Afinal, sei de tudo o que você faz.

Eu apenas suspirei. Me aproximei do armário onde guardava minhas coisas e peguei a arma que precisava. Bastava que eu saísse de lá. Não dava a mínima se ela visse o que eu ia fazer, na verdade, seria muito interessante ela me assistisse cometendo... Isso.

— Onde você está indo? – ela me intercepta antes que eu pudesse sair pela porta.

— Celine, você venceu, não está vendo? Me deixa pelo menos me recompor do melhor jeito que eu conseguir – eu pedi. Não, na verdade eu implorei que me deixasse sair dali. Ela felizmente abriu o sorriso de triunfo nos lábios e deu passagem para mim.

(...)

Voei até a Grande Muralha. Já era final de tarde quando cheguei lá. Eu precisava estar em algum lugar calmo para fazer o que vim fazer. O primeiro passo do meu plano eu tinha conseguido, agora tinha que colocar em prática o passo nº 2.

Eu sabia que ia doer, e sabia que não ia me matar, ou seja, ficaria sofrendo até ele chegar, porque eu sei que ele chegaria. A gente sempre voltava, apesar do que acontecesse. Nossa ligação era muito forte, como de todos os anjos-irmãos.

Eu precisava criar coragem para isso. Não podia ligar, nem mandar mensagem. Viagem astral também só poderia se ele estivesse pensando em mim, o que, convenhamos, era muito pouco provável. Não tinha tempo, não tinha opção. Fechei meus olhos e a imagem dela apareceu na minha mente, naquele dia em que, pela primeira vez fomos um. Senti meus olhos umedecerem e tive, ali, a certeza de que faria qualquer coisa pra que Miranda não precisasse derramar nenhuma lágrima mais.

Me aproximei do muro de pedras e olhei para baixo. Tudo que conseguia ver era um precipício imenso, quase escondido pela névoa branca típica da estação e do horário. Não havia mais visitantes, nem humanos, nem seres sobrenaturais. Desembainhei minha adaga da cintura e empunhei seu cabo com a lâmina apontada para mim. Tinha que ser de uma vez, tinha que ser certeiro. Respirei fundo e senti aquele metal mortífero adentrar minhas entranhas. Não consegui sentir mais dor porque já estava anestesiado pelo meu sofrimento.

Sabia que Benjamin viria, mas não sabia quando. Nós sempre sentimos quando nosso irmão está em perigo. Era só questão de tempo.

Agora só precisava esperar.

— Que porra, Benjamin, por que demorou? – Cinco horas depois falei assim que ele chegou.

— O que aconteceu? Quem fez isso com você? Onde está Miranda? – ele disse, correndo na minha direção para checar o que havia. — Não entendi nada. Você foi ferido?

Eu tinha pensado em duas possibilidades: contar a verdade a ele, e esperar que ele me ajudasse, ou provocá-lo o suficiente para que ele quisesse me matar por conta própria.

— Eu... me envolvi em uma briga, acho que bebi demais depois da apresentação – falei.

— Meu Deus, isso está horrível. Era uma arma estelar, com certeza, está necrosando a área ao redor. E Miranda? Onde está?

— Não sei – falei em um tom ríspido de propósito. – bebi demais e tinham algumas meninas.

— Meninas? Como assim meninas? Dylan o que tá acontecendo? Onde está Miranda? Porra! Responda algo!

— Ah! Você sabe como é – dei um tapa nos ombros dele, embargando um pouco a voz para parecer alterado – depois das apresentações, sabe, as meninas ficam loucas por vocalistas...

— Você é idiota? – ele perguntou, irritado.

— Não sou idiota, Benjamin. Apenas compreendi que você tinha razão, ok?! Como sempre o senhor Comandante da Missão tinha razão!Com relação à Miranda, não sei dela, não estamos mais juntos.

— Como assim? Dylan, o que você fez, seu filho da puta? – Benjamim se levantou.

— Você tinha razão, desde o início. Eu não conseguiria conciliar a música com ela, e, bom, não queria ter família mesmo – esperava que ele acreditasse nisso.

— Como é que é? – ele disse, vagarosamente, e começou a me empurrar e me chutar, sem se preocupar com meus gemidos de dor. — Seu filho da puta! Seu... seu... você a abandonou grávida?

Eu nada falei, fiz apenas aquela cara de safado que tanto sabia fazer, e que o irritava tanto.

— Fala alguma coisa, seu bosta! Seu merda, covarde. Onde ela está agora? Dylan, fala onde ela está agora?

— Não sei, deve estar com aquele feiticeiro lá, em algum lugar por ai.

— Eu vou descobrir, espero que você sofra muito. Eu vou descobrir onde ela está e vou cuidar dela, porque eu sim a amo de verdade, mesmo eu não tendo certeza se sou ou não o pai do filho dela.

— Como assim? Hahaha – ri da cara dele. — Para de ser louco! Inventar algo assim, até para alguém como você, é um sinal de fraqueza absurda! Vocês nunca tiveram nada! Eu sei porque eu fui o primeiro!

— E quem disse que estou inventando, Dylan? Você se aproveitou dela, mas isso não significa que não tenhamos transado em nenhum momento. – ele voltou a me chutar, mas sinceramente, o que ele disse me deixou mais atordoado do que todos os ponta-pés – E o que isso te importa agora?

Benjamin estava se afastando, com força e contra toda dor que sentia, empunhei minha adaga e parti pra cima dele. Evidentemente, pela minha própria condição física, ele não teve a mínima dificuldade em me render, e sem que eu me desse conta, torceu meu braço até eu soltar a adaga. Sem largar de mim, se abaixou e a pegou quando caiu no chão, forçando a mesma contra meu pescoço.

— Vai Benjamin, seja corajoso uma vez na vida e acaba comigo. Ou toda vez que estiver com ela vai se lembrar de que ela esteve em meus braços, na minha cama, na minha boca... – falei a última palavra lentamente, pra provocar mesmo.

Ele nada respondeu, apenas apertou ainda mais o instrumento contra mim. Eu podia sentir as veias no rosto dele saltarem e ele começou a respirar apressado. Senti quando ele fez força, como fazia antes de abater os inimigos que tínhamos. Apenas uma coisa era diferente daquelas caçadas que enfrentávamos: dessa vez ele se concentrou em me encarar profundamente nos olhos. Eu não conseguia desviar o olhar dele. Ele ia me matar ali, mas antes queria enxergar o fundo da minha alma.

— Vai seu covarde, seu perdedor. Não consegue me matar? O que te impede? Saiba que mesmo se ela ficar com você, enquanto eu estiver vivo, Miranda vai se lembrar de mim. Toda vez que você estiver ao lado dela, vai imaginar se ela não vai te confundir de novo comigo. Você sabe que isso só vai acabar se me matar, então o que você está esperando? Não tem coragem suficiente? – falei, por último, antes de sentir o frio cortar meu pescoço.

Condemnnatu - Série Além Da Alma - Livro 2Where stories live. Discover now