prisão aquática

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Eu queria poder dizer que acordar foi fácil e um momento muito bonito ou que eu pelo menos morri de um jeito até que legal porque eu tava vestido muito bem naquela noite, mas bastou que eu sentisse minhas roupas molhadas coladas no corpo e respirasse a primeira lufada dolorosa de ar para que eu me virasse na areia e acabasse me transformando num croquete que vomita água mais feio do mundo.

Espero que vocês nunca tenham se afogado nessa vida, porque acho que a pior parte de estar debaixo da água é quando você sai dela; mesmo respirando, por mais que cheio de dor, eu ainda sentia o pânico de ter meu nariz e boca cheios de água, e bastou que eu me sentisse ainda um tanto dentro dela por conta das ondas que chegavam em mim para que eu ficasse em alerta e, bem, mais um pouco desesperado.

Quando abri meus olhos, a noite já tinha se transformado em manhã e eu estava numa praia tão distante do píer da cidade que tive que criar um mapa mental para que eu conseguisse me localizar ao menos um pouco no meio de toda a confusão. Eu já me sentia sóbrio apesar da dor de cabeça por conta da ressaca e a água ainda cobria um tanto das minhas pernas e quadril quando enfim notei que, puta merda, se eu caí tão feio na água quanto eu me lembro, provavelmente perdi meu celular e carteira e tudo o que era meu, o que é um problema bem pequeno perto de quase morrer, mas parecia importante naquele momento. Me levantei no mesmo instante, cuspindo um tanto mais de água salgada durante o processo de tentar não cair de novo.

— Ah não, não, não, não... — tateei os bolsos da minha jaqueta e da minha calça, revirando-os e tirando montes de areia dali de dentro, tudo pra encontrar apenas uma balinha de iogurte que eu tinha guardado ali na noite anterior. — Ótimo, Jimin. — falei comigo mesmo, fazendo questão de jogar a bala para trás de mim, em direção ao mar, por conta de toda a raiva. — O que você tem na cabeça pra pular na água daquele-

— Ai!

Então arregalei os olhos, me virando no mesmo momento pra ver quem eu acabei acertando com a balinha de iogurte de morango, e a visão que tive me fez paralisar no lugar em que eu estava, o que era um perigo se eu fosse levar em consideração todas as lendas que meu pai contava. Atrás de mim, com parte do corpo coberto pelas ondas e com o doce nas mãos, estava uma... Sereia? Tritão, não? Era um cara com uma longa cauda, no caso uma cauda de peixe, e eu nem me preocupei com o belo verde azulado das escamas ou o azul dos seus cabelos quando soltei o maior berro da minha vida e acabei caindo de bunda na areia quando tentei andar correndo pra trás.

Ele pareceu notar que eu estava impactado pela sua presença só quando eu gritei e foi bem nesse momento que ele começou a fazer "shhh" e colocar o indicador em vertical sobre os lábios, me pedindo um silêncio que não cabia naquele momento porque, puta merda, tinha uma sereia bem ali na minha frente e, céus, isso quer dizer que existem aliens entre nós? Meu pai tinha dito que ver uma sereia seria a última coisa que alguém veria antes de morrer né? Então por que eu tava tão preocupado em ter chutado água e areia naquele rostinho bonito durante a minha queda? Ah não, eu estava enlouquecendo em menos de um minuto e nem consigo explicar o tamanho do desespero que fez meu coração disparar como louco.

Não existia mais celular ou carteira ou qualquer outra preocupação na minha cabeça, as únicas coisas que passavam na minha cabeça eram as palavras "sereia", "cara bonito" e "eu não ligaria de ser morto por alguém tão lindo", o que era preocupante porque eu fui de impressionado com o protagonista de uma lenda da cidade para desejar morrer nos braços de um tritão bonito. Acho que deve ser isso o que os piratas pensavam né? Sempre ensinados a temer esses seres sobrenaturais, mas era dar de cara com um que o único pensamento era "Pode me levar sim, mas leva com vontade".

— Acalmou? — ele perguntou com aquela, uau, voz grossa que era uma das mais lindas que eu já tinha ouvido. Mesmo que ele parecesse ter uma cara de neném com aquela expressão curiosa super fofa, era como se ele tivesse um tigre dentro do corpo dele quando ele abria a boca pra falar.

o conjurador de marés | vmin / pjm +kthWhere stories live. Discover now