Cap. 11

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Era tiro para todo lado. Eu ainda me acostumava com a arma diferente e que pesava no meio da correria. O pior é que eu não estava totalmente preparado, por mais que eu dissesse mil vezes para mim mesmo, eu sabia que seria mentira. Tem um campinho ao lado da operação, apenas algumas casas e ruas de distância. As crianças gritavam e corriam desesperadas, dava até dó, até porque, elas não têm culpa de morar em um lugar como esse.

Tio...

Levo um susto e cambaleio com a arma, já que eu estava escondido para me preparar para atacar. Olhei para baixo, a direção em que minha farda era puxada; era um garotinho mais ou menos da idade do meu filho.

Eu tô com medo... — seus olhos pequenos não escondiam o grande medo que o menino estava sentindo.

Olho para frente, para os outros caveiras, finalmente voltando meu olhar para a criança.

— Você está sozinho?

Ele apenas balança a cabeça para cima e para baixo, afirmando.

— Cadê seus pais? — eu sei, acabei de quebrar o artigo número não sei o que que eu mesmo inventei na minha cabeça de que não podemos ser tão manteigas derretidas assim. Quer saber, que se dane. Eu já tive a idade dele, já morei em bairros perigosos, sei como é. — Vem aqui.

Seguro na mão do menininho e saio correndo morro a cima, onde sei que não descerá traficantes, já que eles vem de baixo. Paro no caveirão — carro blindado do BOPE — estacionado onde eu deixei ele e coloquei um colete no garotinho, que ficou bem grande por sinal.

— Agora vem comigo.

Novamente volto a andar com ele. Paro em uma garagem aberta de uma casa abandonada.

— Fica aí dentro, por favor, ok? - Assente. — Venho te buscar quando terminar a operação.

Empurro o portão velho que desliza para o lado esquerdo para fechar.

— Tio... — ele chama antes que eu pudesse voltar para a operação. Olho por uma brecha vazada do portão, observando ele atrás de algumas latas de tintas velhas. — Obrigado — sorriu. Retribuí o sorriso e assenti.

Corri imediatamente, ninguém poderia saber do meu breve sumiço e do que eu acabei de fazer. Do outro lado da rua eu vejo mais umas seis crianças me olhando como o gato de botas no filme do Shrek. Suspiro fundo. Com as mãos eu chamo elas e volto a empurrar o portão para que ele abrisse novamente. Elas se esconderam atrás de objetos abandonados assim que fechei o portão. Eu lembro delas, são as mesmas que estavam no campinho. Será que vou levar uma suspensão por ter feito isso? Ah, não estou nem aí, policiais estão aí para isso, para defender e apoiar a sociedade.

Dessa vez sim eu pude ir até lá embaixo, na operação, sem interrupção. O Capitão ordenou que eu subisse em uma laje junto a uma mulher e um homem de uns trinta anos que também eram do BOPE.

Tem sujeitos subindo, fiquem atentos — informo no radinho, assim como o Capitão pediu que eu fizesse ao chegar aqui em cima.

Atirei no pé de um sujeito que estava apontando para a policial ao meu lado. Foi assim até eu ouvir meu nome no rádio com o mandado de que eu entrasse na biqueira. Desci da laje, conforme aprendi no curso do COEsp. Imediatamente vem em mente os momentos em que aprendi cada movimento e ação que estou fazendo aqui. Sorrio mentalmente ao perceber que está fazendo efeito.

Acho que já estamos aqui a umas duas horas e meia perseguindo os traficantes e sujeitos responsáveis pela briga entre si sobre o domínio de controle do tráfico de drogas entre as regiões por ali.

Escuto que eu devo atravessar a rua olhando para cada canto dela, observando a movimentação e se tem sujeito. Nossa! Acabei de escapar da morte. Um deles estava apontando diretamente para mim, sorte que Emerson apareceu para atirar em seu braço, fazendo o mesmo cambalear na laje. Nos entreolhamos e agradeci.

Ao final do dia ficamos responsáveis por supervisionar a região, já faz quase vinte e quatro horas que estamos aqui. Não pegamos tantos traficantes como esperávamos. Meus olhos estão pesados, meu corpo dói da cabeça aos pés, mas não que eu desista agora. Quando havia dado doze horas da operação, voltamos ao BOPE e fizemos um novo plano, que foi esse de esperar pelos traficantes. Ouvimos um tiro durante o tempo que estávamos escondidos. O sinal de interrogação subiu na cabeça de todos nós. Quem será que atirou? O que acertou? Olhei, saindo um pouco do esconderijo que se tratava de um muro. Havia um policial morto com uma poça na cabeça. Volto para o esconderijo e fecho os olhos; isso me dói na alma.

Policial morto — sussurro no rádio para o Capitão, que estava comandando um outro grupo escondido e me deixou responsável por esse, que contém mais ou menos vinte policiais. Eles me olharam com pena, provavelmente lamentando a morte do policial.

Um novo tiro é disparado, dessa vez parecia ter ido em direção ao céu. O que era estranho para nós e muito comum para os moradores eram esses tiros frequentemente. Tipo, deve ser muito normal para eles.

"Fechem as janelas e as portas, se escondam de baixo da cama"

Nossa, deve ser horrível isso. E são esses pensamentos que me mantém acordado durante essas doze horas. Essa operação nem acabou e eles já escalaram os policiais que vão na próxima operação que acontecerá em menos de uma hora em outro morro. Os policiais descobriram por fontes infiltradas na comunidade de que haveria uma troca de favores e envolveria muita droga e dinheiro.

Eles finalmente dispensaram nós, que estávamos na operação a vinte e quatro horas. Respiramos fundo, voltando para os caveirões, que eram três. Na volta não fui eu quem voltou dirigindo, mas sim, um policial que ficou responsável por supervisionar a área praticamente desde o início da operação, e o motivo é óbvio; ele foi o que menos fez esforços.

— Esperem um minuto, eu já volto — informo e vou atrás das crianças.

Corro pelas ruas que me vinham na cabeça com as imagens de mais cedo. Lembrei exatamente do portão que era. Abri ele e...

Eles estavam simplesmente fazendo uma festa só! Correndo para lá e para cá, outros brincando de brincadeiras de crianças mesmo. Acabo soltando um levo sorriso.

— Tio!!! — elas vem correndo ao meu encontro. Retribuo o abraço coletivo, mesmo que eu esteja todo quebrado.

— Viu? Eu falei que vocês estariam seguros aqui — sorrio.

— Obrigada — uma garotinha me abraça após todos os outros me soltarem.

— Essa é minha obrigação. Vocês sabem o caminho para casa?

— Na verdade todos nós somos órfãos e moramos no abrigo da tia Sônia, ela é muito legal com a gente, nos dá comida, roupas, sapatos, cobertas e tudo que temos direito — o primeiro que conheci diz.

— Onde é mais ou menos? — olho para a ladeira abaixo que era o morro.

— Fica logo ali — ele aponta.

— Vou levá-los até lá — peço que eles fiquem perto de mim e obedeçam os meus comandos, já que eu não tenho mãos para segurar todos. Ao chegar mais ou menos na décima casa descendo o morro, vejo que tem mesmo um muro pintado com desenhos de lápis, materiais escolares e crianças, por mais que estivesse escuro eu ainda conseguia ver.

Meu Caveira (Concluído)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora