XVI - Inside

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Pegamos o metrô na direção norte e descemos em um bairro mais vazio e mais sujo. Ninguém sai da estação conosco e não há nenhuma placa indicando para onde fica nosso último destino.

- Estamos no lugar certo? - pergunto.

Lauren coça a cabeça.

- Acho que sim. Vamos tentar ali.

Ela aponta para uma área que parece menos deserta. Subimos a rua, dividindo o guarda-chuva da melhor forma possível. A chuva se transformou em uma névoa fina. Na calçada, brotam plantinhas por entre as brechas do cimento. Tudo parece abandonado. Por fim, nos deparamos com uma colina enorme, com várias escadarias e escadas rolantes. Escadas rolantes. Nunca as vi assim, do lado externo, espremidas entre apartamentos e lojas de lembrancinhas. Mas, apesar desses sinais promissores... a rua continua deserta.

À medida que subimos as escadas rolantes, a névoa fica cada vez mais fraca. Quando chegamos ao topo da colina, ela desaparece completamente e dá lugar a um céu azul e límpido. À luz do sol. Inclinamos a cabeça para trás e nos maravilhamos com a beleza do céu. Há mais uma colina, menor, do outro lado da rua.

- Parece que o lugar que estamos procurando fica para lá - digo.

Em um gesto repentino, Lauren agarra minha mão e corre em direção à colina. Chego a berrar de tanto rir. Ela também ri, extasiadas paramos de rir quando chegamos aos portões no topo da colina.

Ela ergue os braços no ar, vitoriosa.

- Ganhei! - E depois curva o corpo feito uma dobradiça. - Estou morta.

Sorrio.

- Bem-feito!

Lauren ergue a cabeça.

- Ah, é?

Então ela percebe que mudo de expressão ao me dar conta do que há atrás dela. Lauren se vira e, em seguida, endireita o corpo, atônita.

Não chegamos apenas ao topo da colina. Estamos no topo de Barcelona.

A cidade se estende de um canto a outro do horizonte, retângulos perfeitos de marrom, cinza, amarelo e vermelho. Sobrepondo-se a tudo estão os pináculos e os guindastes de construção da Sagrada Família, mas bem abaixo de nós há um caminho aparentemente interminável e sinuoso que perfila uma vegetação mediterrânea.

Parc Güell.

Ao longe vemos as torres e as esculturas que Gaudí desenhou para o parque - e a multidão que o frequenta -, mas, daqui, tudo é sereno e verde. O ar é tão fresco e puro que meus pulmões ficam surpresos. Pela primeira vez em meses o mundo para. Desde antes de Paris, antes de Nova York... para falar a verdade, nem consigo lembrar quando foi a última vez que fui invadida por essa sensação tão completa de paz.

- Acho que viemos pela parte de trás - comento.

- Devíamos perder o mapa mais vezes.

Seguimos pelo caminho principal em silêncio, as mãos entrelaçadas. Estou extasiada. Vários minutos se passam sem que cruzemos com uma pessoa sequer. O primeiro que vemos é um jovem com um cobertor estendido sobre o chão, tentando vender brincos de pena para duas japonesas. Lauren indica com o queixo um caminho estreito em meio às árvores.

Tiro a água do cabelo enquanto andamos, Lauren faz o mesmo. Gotas espirram por toda parte.

- Ei! Olha para onde você espirra essa coisa!

Lauren mira a cabeça para mim e esfrega o couro cabeludo com mais força ainda.

- Boba!

- Mas você me ama.

Kismet [concluída] Tahanan ng mga kuwento. Tumuklas ngayon