- E você, já? - pergunto, porque muitos dos alunos da nossa escola já têm alguma experiência profissional.
Lauren franze o cenho. Ela fica envergonhada, e a resposta que sai de sua boca é uma confissão de uma única palavra:
- Não.
- Nem eu.
Nós duas carregamos a culpa por esse privilégio.
Lauren olha para o celular novamente. Eu me aproximo e observo a foto de novo.
- Nossa, que uniforme horrível! Será que tem alguém no mundo que fica bem com poliéster marrom?
Ela abre um sorriso.
A escada chega ao fim. Lauren digita uma resposta rápida, põe o telefone no modo silencioso e o guarda no bolso. Fico me perguntando se ela contou para Dinah sobre o nosso encontro. Se sou uma novidade digna de ser contada para sua melhor amiga.
Seguimos em direção às galerias, mas a multidão no restaurante da cobertura nos impede de chegar até lá. As mesas foram retiradas, e um exército de modelos esqueléticas, com perucas crespas e brancas, batom branco e o rosto pintado com blush branco bem no estilo marionete fazem malabarismos com bandejas de champanhe por entre o enxame de corpos.
Lauren se vira para mim.
- Podemos?
- Por que não? - digo, tão cintilante quanto o champanhe. - Acredito que sim.
Nós nos enfiamos na multidão, e Lauren pega duas taças da primeira bandeja que passa por nós. Somos as mais jovens aqui, por enquanto. Deve ser uma festa particular. A vibração das vozes entusiasmadas e a música bizarra e caleidoscópica torna o ambiente estranhamente barulhento para Paris.
- Isso aqui está parecendo ano novo - grito.
Lauren se abaixa para responder:
- Mas não o ano novo verdadeiro. Está mais para aquelas festas cheias de frescura que a gente vê nos filmes. Sempre passo a virada do ano vendo TV sozinha no meu quarto.
- Isso! Eu também!
Lauren me entrega uma das taças e meneia a cabeça em direção a uma das prateleiras gigantes e decoradas do restaurante. O barulho diminui um pouco. Eu ergo minha taça.
- Ao ano novo? Ao nosso novo ano na escola?
Ela leva a mão ao peito, em um gesto de lamentação.
- Desculpa, mas eu simplesmente não posso fazer um brinde àquele lugar.
Sorrio.
- Ok, ok. Que tal, então... aos quadrinhos? A Joann Sfar?
- Proponho um brinde... - declara Lauren, com uma seriedade brincalhona - ...a novos começos.
- A novos começos!
- E a Joann Sfar.
Rio de novo.
- E a Joann Sfar.
Fazemos tim-tim com nossas taças e ela mantém os olhos vidrados em mim. Meu sorriso fica ainda mais largo, e malicioso.
- Há! Eu sabia! - digo.
- Sabia o quê?
- Você me olhou nos olhos enquanto brindávamos. Você finge que não se importa, mas se importa, sim. Eu sabia. É uma excelente observadora.
Tomo um gole triunfante do meu champanhe. As bolhinhas efervescentes fazem cócegas na ponta da língua, e eu sorrio com tanta intensidade que Lauren cai na gargalhada.
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Kismet [concluída]
RomanceTímida e romântica, Camila tem uma queda pela introspectiva Lauren desde o primeiro ano na SOAP, uma escola americana em Paris. Mas sua timidez nunca permitiu que ela trocasse mais do que uma ou duas palavras com ela, quando muito. Depois de um enco...
VIII - Sledgehammer
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