INOCENTE TRAIÇÃO

4"Melissa"

Os últimos dias foram um grande borrão, tudo que acontecia ao meu redor, não parecia ser real ou certo, onde estava minha mãe? Porque ela não vinha até mim? Porque isso doía tanto?

Pareço estar vivendo em uma realidade que não é a minha e eu daria tudo para voltar aquele dia e simplesmente abraçá-los e dizer o quanto os amava, mas eu não disse, e eles... Se foram, para sempre!

As vezes sinto as lágrimas, outras vezes não sinto nada...

Meus olhos ainda estavam fechados e resolvi que estava na hora de abri-los para um novo dia,mesmo que para mim todos estejam cinzas ultimamente. Devagar os abri percebendo que me encontrava em um lugar diferente, a cama não é a minha, pois a do meu quarto não tem dóceis ou lençois coloridos.

Olho tudo e ao invés de me assustar, continuo sem reação, tem horas que isso me assustava, era como se eu não tivesse mais controle sob o meu corpo, mas ao mesmo tempo, porque não me entregar a esta dor e deixar que ela me consuma?

Noto que não estou sozinha e lentamente minha consciência registra de quem se trata, Doroti. Eu quero ir até ela, quero limpar as lágrimas que agora escorre por seu rosto, mas a única coisa que consigo fazer é derramar minhas próprias lágrimas.

Por dentro eu gritava: eu vi nossos pais morrerem, e não pude dizer que os amava, eu não consegui...

Doroti se aproximou sentando na cama devagar, como se um movimento mais brusco fosse me assustar, ela pegou em minha mão beijando de leve.

— Vai ficar tudo bem... Eu prometo! Vou cuidar de você.— ela beijou demoradamente minha mão. — Está com fome?

Eu queria tanto reagir, dizer algo, mas eu sei que quando o fizer, algo vai se quebrar ainda mais dentro de mim e não sei se estou pronta para isso, não respondo, ao invés disso, fecho os olhos. Doroti respira fundo, parecendo frustrada.

— Reaja, minha irmã, reaja... Eu te amo tanto minha pequena. — Doroti escorregou a mão em meus cabelos. — Volta para nós meu anjo, você não tem culpa do que aconteceu, foi um acidente, sei que dói, mas são tragédias que nos fortalece.

Não é verdade, eu tenho culpa, os desrespeitei, não disse que os amava, como vou viver com isso? Não consigo encarar minha irmã, não sem me sentir um lixo. Minha mãe perdeu seus últimos suspiros tentando me acalmar, tentando me manter sã, mas no fim, tudo que me restou foram pesadelos e a ausência deles.

— Se ela não comer, teremos que chamar o médico. — disse meu cunhado entrando no quarto.

— Ela vai comer... — Ela disse doce. — Eu não quero vê-la sofrer, tendo um cano entrar em sua garganta, não... ela não merece isso.

— Então faça-a reagir... Mais um dia sem comer e teremos que intervir radicalmente.

Richard deixou o quarto, minha irmã suspirou chateada e me olhou.

— Você ouviu, Mel? Não quero ver você comer a força, acho isso uma atrocidade. — Ela se levantou, duas mulheres me puxaram para me sentar, colocaram um babador e ela voltou com um prato na mão, se sentou. — Coma... Mesmo que seja pouco, precisa.— Levou a colher a minha boca.

Engoli em seco e por ela eu abri a boca, mas parecia que estava comendo pedra, uma lágrima escorreu pelo meu rosto, ela me ofereceu mais um pouco de sopa e a próxima colher foi ainda pior que a primeira. Tentei fazer mais por Doroti, mas não conseguia, simplesmente não dava. Comecei a tremer e Doroti parou de me forçar e me abraçou.

— Tudo bem! Tudo bem. — Doroti colocou o prato de lado, mesmo sorrindo amável chorou comigo. — Volto logo, agora descanse.

Segurei fracamente em seu vestido e o susto que ela tomou foi grande, mas não queria ficar sem ela, foi tudo que me restou, se ela se for, como eu fico? Foi a única reação que tive em dias e até eu estou surpreendida. Doroti pareceu perceber que essa seria uma coisa rara. Ela me abraçou mais um tempo e prometeu voltar, mas se foi, levando com ela uma parte de mim, se algo acontecer com ela, seria o meu fim.