Capítulo 21

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Édrilan serviu mais dois pães dourados e quentinhos. O aroma maravilhoso desafiava meu estômago a abrir mais um espacinho.

Sem pensar duas vezes abocanhei aquele par de delícias. O recheio de atum e camarão desmanchou na minha boca, tão saboroso quanto a casquinha crocante.

O sol começava a se por e percebi que passei a tarde comendo e me lamentando. Byron realmente havia evaporado, não tentou me encontrar ou explicar suas atitudes. O florista adolescente me odiava, o tal de Papillon me achava um otário e os pais do Byron me desprezavam. E Byron nunca me ajudou, exatamente. Eu pensava que fosse timidez ou passividade no começo, mas talvez ele nem se importasse.

Talvez eu fosse apenas um novo Isha, sem uma fração de seu talento ou carisma. Uma forma de o Byron esquecer alguém que não deveria ser esquecido.

Édrilan voltou com o jarro de água e repôs meu copo. Eu bebi com vontade, matando a sede e tentando matar aquela angústia também. Nunca pensei que afogaria as mágoas com água de cascata e pão de atum, mas todo poço tem um fundo.

Enquanto eu comia, a cadeira à minha frente rangeu. Édrilan sentou-se comigo e percebi que eu era o último cliente. Ele sorriu para mim, iridescendo seus olhos tão incomuns e bonitos: um lilás e outro verde.

"E então, pretende me contar o problema ou apenas esgotar meu estoque de pães?" Perguntou ele, com sua voz grave e tranquila.

Eu bebi outro copo de água e suspirei.

"Sou só uma sombra do Isha, cara. Preciso competir com um cara que nem tá mais vivo."

O padeiro riu, fazendo tremer seus bíceps de puro músculo. Sério, como tritões conseguiam ser tão porradões? E ao mesmo tempo aquele cara era dócil e compreensivo.

"Este é o seu problema, humano novo. Isha foi o predestinado do Byron, o vínculo mais forte a existir entre dois seres vivos. Você não pode competir, não haveria como ganhar."

Eu engoli meu pãozinho todo atravessado. É, pelo visto além de sombra, eu era o saco de pancadas emocional também.

Édrilan percebeu a devastação no meu olhar e amaciou a voz.

"Não digo que suas chances com Byron são nulas. É raro, mas tritões viúvos são capazes de formar novos pares. É outro tipo de relação, algo que vocês humanos conhecem como amor."

Aquela palavra disparou meu coração. Amor. Eu nunca havia me preocupado com tal bobagem, mas desde que Byron caiu de paraquedas na minha vida o amor regia cada um dos meus passos. Eu atravessei os oceanos por um sentimento novo. E eu me ferrei por conta disso.

"O que Byron quer de mim, de verdade? O cara se aproxima, e se afasta, e provoca, e no instante seguinte somos apenas conhecidos, depois surge algo mais de novo..."

"Após a morte do predestinado o chamado do outro adormece, mas o sentimento permanece como um membro fantasma." Édrilan abocanhou um dos pãezinhos, com o olhar baixo. "Às vezes a sensação nunca vai embora. Alguns tritões aprendem a conviver com ela, outros enlouquecem ou coisa pior."

Édrilan retornou ao balcão e trouxe mais pães, estes cobertos de flocos de coral vermelho. Ele me entregou um e provou o outro. "Minha lojinha não vendia muito, esses tritões de Egarikena comem peixe cru como se fossem bárbaros. Mas Isha adorou a culinária do clã Amalona e ajudou a popularizar meus pães. Este era o favorito dele."

Eu parei as mãos a meio caminho de morder e devolvi o pão ao prato.

"Já entendi, o cara era o pica das galáxias, e eu sou apenas o trouxa de cabelo verde." Resmunguei, me sentindo o lixo dos lixos.

Romance ao Som de Violão (AMOSTRA)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora