Capítulo 20

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"Os bebês vão ficar bem, Shane." Disse Byron.

"Cara, eu sei. Se você confia no baixinho magricelo eu também confio."

"Então por que está tremendo?"

Eu quase tropecei nas minhas pernas. Estava tão óbvio assim? Porque era tão ridículo. Nas últimas semanas eu naufraguei em alto-mar, fui atacado por piratas e agredido por um grandalhão com dentes pontudos. E ainda assim, aquele era meu momento de maior nervosismo.

Meu primeiro encontro. Não apenas com Byron, mas meu primeiro encontro de modo geral.

O sol da tarde iluminava a beleza quase infinita daquela ilha. Naquela parte da cidade as ruas fervilhavam em movimento, com dezenas de pessoas carregando caixas, potes e sacolas. Era difícil lembrar que todos ali eram tritões, embora muitos passeassem completamente encharcados sem que isso causasse o menor estranhamento, e também haviam muitos pares de caras musculozões com caras magrinhos. Também haviam alguns casais de tritões e sereias, embora elas fossem muito mais raras que sua contraparte masculina.

E caralho, parecia dia de fralda em liquidação. Para onde eu olhasse, haviam bebês. Bebês chorando no colo dos pais, bebês rindo das gaivotas nos telhados, bebês engatinhando pelo chão da praça em meio às crianças. As crianças conseguiam ser ainda mais numerosas, e os idosos...

Ahm, reparando bem, onde estavam os velhos? Alguns poucos tritões aparentavam meia-idade mas nenhum passava disso. Os caras mais velhos que encontrei foram os pais do Byron, e mesmo eles não deviam passar de uns sessenta anos.

O olhar de todos fazia suar minhas mãos. Olhares desconfiados, com aquele brilho sobrenatural que apenas tritões tinham. Mas se olhares me preocupassem eu não seria um rockstar com cabelo verde, tatuagens e piercings. Minha preocupação era o homenzaço do meu lado, tão próximo e tão... distraído. Quando ele perceberia minha mão ao lado da dele?

Pelo visto nunca, porque Byron decidiu brincar de guia turístico. Ele não parava de falar, me apresentando cada detalhe da paisagem.

Tudo aquilo era fascinante, óbvio, mas Byron tremia ainda mais que eu, como se ao menor silêncio eu fosse agarrá-lo na frente de todo mundo.

Ok, talvez eu quisesse fazer isso, mas se ele preferia distância podia simplesmente pedir. E depois do climão de antes, era óbvio que ele desejava mais que um simples passeio.

Nunca conheci um cara tão desonesto consigo mesmo e aquilo começava a me enervar de verdade.

"Aquela é a barraca do Jinen. Ele vende tesouros marinhos, decoração pra a casa, mobília... é um cara legal às vezes. Ali tem a lojinha do Berlan, com produtos do continente, e ali o chafariz central. A água é doce para evitar que as crianças bebam, mas eu não recomendaria você beber, porque às vezes..."

Eu acompanhei com os olhos cada detalhe, sobrecarregado com tanta informação. Naquela praça devia haver umas trinta barraquinhas dispostas em fileiras, todas contornando o chafariz e cedendo caminho para a maior escadaria que já vi. Os degraus desapareciam montanha acima, subindo até encontrar o castelo mais louco do mundo.

Paredes de cristal, teto de cristal, amplos portões de cristal. Era uma construção imensa e complexa, com terraços, torreões e muitas janelas, além de uma cachoeira que escorria ao pelas laterais até desembocar em um fosso, que contornava a coisa toda. Parecia cenário de filme da Disney, ou sei lá. E pelo que Byron falou, era tudo escavação. Uma montanha translúcida escavada no formato de um castelo.

"Quer conhecer o viveiro de mergulhões? As crianças adoram." Disse Byron, já ofegante pelo falatório.

"Aquela estátua dourada é o seu pai?" Perguntei, avistando-a ao longe, pouco antes do começo da escadaria.

Romance ao Som de Violão (AMOSTRA)Where stories live. Discover now