Capítulo XXVIII

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Sara

A Igreja e a Casa Paroquial ficaram impecáveis para receber o novo padre. Eu e o grupo de oração deixamos tudo brilhando. Léo organizou todos os documentos que estavam pendentes para serem assinados e a agenda que sacerdote teria que cumprir nos próximos dias. Fazia uns quatro anos que ele era sacristão, ninguém conhecia a paróquia, as outras igrejas, a cidade, como ele. Leonardo era um bom garoto e tinha a minha idade.

_ Sara, ele chegará por volta das 14:00 horas. A Assembleia vai se reunir para recebê-lo, melhor irmos pra casa tomar um banho.

_ Claro Léo, vamos lá!

Léo era humano, 100% humano; tinha a pele tão branca que alguns o confundiam com um albino, seus cabelos eram louros e seus olhos azuis. Enquanto caminhávamos reparei que os óculos dele estavam sujos, aliás, nós dois estávamos muito sujos.

_ Léo, a quanto tempo sabe sobre a Assembleia e as Predestinadas?

_ Desde que mudei pra cá.

_ Sua família é de onde?

_ Somos do Paraná.

_ É bem longe, as pessoas do norte costumam ir para o sul e não o contrário. Como vocês vieram parar aqui?

_ Nós fugimos.

_ Fugiram? Fugiram de quem?

_ De um bruxo muito poderoso.

_ O quê aconteceu para ele ameaçar vocês?

_ Eu tinha uma irmã, ela se envolveu com um bruxo. Ele era louco por ela e Juliana soube muito bem se aproveitar da situação. Ela o usou, e tornou-se uma feiticeira. O poder a cegou, ela só queria mais e mais. Não sabíamos o que estava acontecendo com ela, o porquê de estar estranha, então meu pai a seguiu e o que ele descobriu foi um golpe na nossa família. O bruxo quis nos matar, disse que era uma ameaça pra ele; eu cheguei a pensar que ela o ajudaria. Juliana enfrentou o namorado, se sacrificou por nós, morreu pra nos salvar. Tivemos que fugir. Depois que isso aconteceu estávamos arrasados com a morte dela e sem dinheiro. O irmão do meu pai morava em Esperança, viemos passar um tempo com ele e acabamos ficando por aqui. Meus pais conheceram o padre Estevão e aos poucos eles cederam e contaram nossa história. O padre conseguiu um emprego de gari para o meu pai e de doméstica pra minha mãe e ele fez mais: Deu aos meus pais um lugar na Assembleia, era a chance de impedir que outras garotas morressem nas mãos de bruxos negros. Agora temos a oportunidade de ajudar as Predestinadas a salvar todos nós.

_ Tenho certeza de que elas vão precisar de nós, de todos nós.

Paramos em frente a minha casa.

_ Não se atrase Sara.

_ Pode deixar.

...

Quando cheguei a Igreja as meninas já estavam lá. Pastor Pedro e Monge Megumi estavam com Rodrigo em um canto. Tiago correu até mim e pulou para eu abraçá-lo; ele era muito fofo.

_ Oi Tiago! Que bom que você veio; eu estava com saudades.

Léo entrou na Igreja e anunciou que o carro estava chegando. Fomos para os fundos da Igreja, lá havia um jardim e a garagem. Um carro antigo, mas muito bem conservado manobrou e estacionou a nossa frente. Eu estava ansiosa para conhecer o novo padre, esperava que fosse um bom homem, correto, leal, atencioso, amigo... A verdade é que eu queria que ele fosse igual ao padre Estevão. Sempre nos demos bem, ele era muito gentil e no fim deu sua vida para proteger Ester. Já tinha algum tempo que eu não ia visitar o túmulo dele, estava com vergonha do que Rebeca fez, mesmo sabendo que não sou culpada, seria estranho falar com ele depois de tudo. Uma hora dessa ela estava sozinha em uma ilha deserta, talvez estivesse com frio ou fome. Meu coração apertou; eu não queria que ela sofresse, mesmo depois de tudo, eu a amava. Respirei fundo; ela precisava disso, precisava voltar a ser uma bruxa boa, alguém que protege, se doa, é gentil e solicito. Eu tinha certeza de que Rebeca iria voltar e que seria uma pessoa melhor. Encarei Morgana por um instante, ela também sentia falta da avó, embora não falasse sobre isso e sempre aparentava ser fria. Meus olhos percorreram o rosto de cada uma das Predestinadas; alguns meses atrás ela eram meninas com problemas em manter a média na escola e agora tinham a responsabilidade de salvar o mundo. Todas mudaram muito nesse tempo, agora eram como uma família, sempre juntas, mesmo com desentendimentos e pequenas ofensas. Não sabíamos quanto tempo elas viveriam, e eu queria que houvesse uma forma de salvar o mundo sem sacrificá-las. Queria que minha irmã estivesse viva, queria que Pablo e seus seguidores fossem embora, queria paz... Era pedir muito? Quantos ainda teriam que morrer nessa guerra estúpida? Sentia nojo de mim mesma toda vez que lembrava que o sangue dele corria em minhas veias; sangue amaldiçoado. Fui arrancada de meus pensamentos pelo barulho da porta do carro abrindo, finalmente íamos conhecer o novo padre, eu o imaginei de muitas formas; alto, baixo, magro, sério, risonho... Entretanto eu não tinha imaginado nem de longe como ele realmente era, arregalei os olhos e depois pisquei; ele era muito... Diferente.

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