25.2 | ou ❝a verdade, de verdade❞

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Seja por curiosidade ou hesitação, Lucas permaneceu me fitando.

— Eu fiz uma coisa muito ruim no dia do incêndio em Viveiro.

— Fazemos coisas ruins o tempo todo. — Lucas me tranquilizou — Eu, pelo menos.

— É muito gentil da sua parte, mas você salva tartarugas. Você está anistiado pelos seus erros só por isso.

— E você está me assustando.

Respirei fundo umas duas vezes. Não ia ser fácil. Todas as pessoas daquela cidade me odiariam para sempre, caso alguém soubesse o que eu estava prestes a dizer. Minhas mãos tremiam. Eu não conseguia organizar as palavras.

— O incêndio na minha antiga escola é responsabilidade minha.

Eu esperava que ele demorasse para entender, me esquecendo do seminário e das investigações. Sem esboçar nenhuma reação, ele perguntou:

— Como você começou o fogo?

Eu ergui as sobrancelhas quase até a raiz dos cabelos, finalmente ligando os pontos.

Lucas Avelar não sabia de nada. A polícia, os investigadores privados, ninguém. Se estavam procurando um culpado que tinha fugido da cidade, eles não sabiam de nada. Se Lucas achava que era eu, ele não podia estar mais distante da verdade.

O que só tornava mais difícil contar tudo a ele.

— Eu não comecei o fogo. — falei, exasperada — Eu disse que é minha responsabilidade porque eu sou a razão pela qual uma pessoa decidiu incendiar a escola.

— E você estava na escola quando isso aconteceu?

Fiz que sim com a cabeça. Lucas empalideceu, e sua respiração ficou ofegante. Os olhos pareciam que iam saltar das órbitas.

— Alguém tentou te matar, Valéria? É isso que você está dizendo?

— Não foi proposital. O que eu fiz, não o que a pessoa... enfim. — apressei-me em corrigir — Mas... aconteceu uma coisa naquele dia. Algo que não há uma pessoa viva que saiba.

Lucas parecia estar prestes a vomitar

— Você está calado.

— Como espera que eu reaja, Corrêa? Você acabou de me dizer que uma pessoa tocou fogo em uma escola para tentar te machucar!

— Eu sabia demais a respeito de um assunto sobre o qual eu não deveria saber nada. Era mais fácil se livrarem de mim do que me convencerem a ficar calada. A intenção era só explodir o laboratório comigo dentro, mas as chamas saíram de controle. — disse eu, batendo com a mão no chão de areia, perdida em pensamentos; Lucas se indignou ao me ouvir dizer a palavra "só". — E quando vi o fogo, não o contive. Não alertei as autoridades. Essa é a parte proposital. — fui abaixando gradualmente meu tom de voz, de modo que minhas últimas frases mais pareciam murmúrios — Sabia que pareceria acidental, pois estávamos em um laboratório de química com vários históricos de pequenas explosões. Eu só... fugi.

Fechei os olhos por um momento, e o cheiro de fumaça química me veio à memória.

Como? Um incêndio daquele tamanho...

— Saí correndo do laboratório até o subsolo, onde fica o sistema de incêndio. Cortei todos os fios que transmitiriam os sinais do alarme. Os bombeiros nunca chegariam a tempo. O responsável pensaria que eu tinha morrido, porque meu corpo nunca seria encontrado. Essa era sua intenção, na verdade.

Lágrimas quentes rolaram pelo meu rosto, enquanto eu lembrava daquele dia terrível. Todo o medo que eu senti. Meu coração disparado, suor frio escorrendo pela minha testa, e tanta, tenta fumaça.

Onde Há FumaçaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora