Clara Jones: A sós com Lucy

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     Acordei destruída, meu corpo doía, meu rosto estava inchado, mal pude me colocar de pé. Eu estava tão indisposta, a minha noite estava tão perfeita, mas ela estragou tudo, tudo. Eu a odeio. Olhei e vi meu vestido no chão uma mistura de sentimentos me tomou, raiva, tristeza, mágoa... Eu não consigo entender o porque que ela faz isso comigo, eu sempre a obedeço, não a respondo, tudo bem que eu dou um pouco de problema na escola, mas isso é fácil de resolver, é só largar, na escola todos me odeiam mesmo. Ainda me lembro do meu primeiro dia de aula, quando passei para o ensino médio, foi terrível, eles me xingaram, fizeram umas brincadeiras horríveis, passei o intervalo sozinha, foi nesse momento que eu percebi o quanto as pessoas me odeiam, talvez por que eu sou esquisita, ou tímida de mais, ou... Não sei. Não sei o que fazer com a minha vida.
- Oh Deus! - eu estava me desmanchando - por que isso sempre acontece? Quando? Quando eu irei ser feliz de verdade!? - deitei novamente, não conseguia parar de chorar, meu braço já não tinha mais espaço para os cortes, eu estava em pedaços, e nada era capaz de coloca-los no lugar. Ben. Nem mesmo ele. Ele só estava perdendo tempo, não tem jeito pra mim.
- Clara? - batidas na porta - você esta aí? - não era minha mãe, era Mason.
- O que você quer?
- Posso entrar?
- Não! Vá embora!
- Deixe eu conversar com você. - e ele entrou fechando a porta atrás de si, senti meu corpo se contraindo, eu sabia que ele me faria algum mal, seria meu fim. Ele olhou para meu vestido no chão, e a lâmina ensanguentada. - O que houve?
- Nada. Saia daqui.
- Eu quero lhe ajudar. - falou sentando-se na cama.
- Quer mesmo?
- Sim.
- Então saia daqui. Agora.
- Tudo bem. Quando quiser conversar, eu estarei aqui. O.k?
- Humm. - ele saiu. Ele me parecia uma boa pessoa. Mas ainda não confio nele.
   
    Dentro do ônibus, sentei no lugar de sempre, esperei por Ben, eu esperava que ele me abrassasse e dissesse que ficaria tudo bem, e por um momento eu me sentiria melhor.
- Sabe Clara. Hoje você esta mais feia que o normal. Olha essa sua cara. - disse Martha, uma das garotas que sentava no meio - já pensou em usar um pouco de maquiagem pelo menos?
- Não. Ela não precisa. Mas você vai precisar depois que eu deixar essa sua cara toda roxa. E eu vou cuidar para que isso aconteça o mais rápido possível. - era Ben.
    Ela se levantou e voltou para o seu lugar. Ele sentou-se ao meu lado e me abraçou, beijou minha cabeça, senti seus lábios quentes, aquilo me confortava, ele pegou meu braço e olhou para aquelas marcas, passou a mão entre elas, fitou meu olhos e disse:
- Um dia você não vai mais precisar fazer isso, e eu vou está aqui para fazer isso acontecer. - apoiei a cabeça no seu ombro e fechei os olhos.

   O dia foi do mesmo jeito, aula chata, pessoas ruins, almoço horrível. Mas eu estava com Ben. O que fez tudo melhor. Resolvemos ir a pé para casa, no caminho falamos sobre várias coisas, ele me fez rir e esquecer tudo, não tinha perguntado o que aconteceu e eu preferia assim.
- Vai me contar o que houve? - pensei cedo de mais.
- Não foi nada. Já passou.
- Eu quero saber.
- Ok - suspirei - foi minha mãe, nós brigamos.
- E porque?
- Porque...não sei...eu cheguei e ela...simplesmente rasgou meu vestido. Eu não entendo porque ela fez isso. Sabe Ben, eu...eu a amo, faço tudo por ela. Por que ela me odeia?
- Não sei. Mas eu não odeio você - ele me abraçou e fomos em silêncio o resto do caminho.
   Cheguei em casa, estava vazia, melhor assim, fui na cozinha comi alguma coisa e me tranquei no quarto, era hoje que eu iria jantar com a Dona Lucy, eu estava um tanto ansiosa.

   20hrs00min, Dona Lucy estava na minha sala, falando com minha mãe.
- Sabe, Clara é uma garota maravilhosa, eu estou muito feliz que ela e Ben estejam juntos.
- Eu também. - disse minha mãe friamente.
    Quando me viram se levantaram, Dona Lucy me abraçou delicadamente, ela era um amor. Me despedi da minha mãe indiferente, e não vou mais chama-la de mãe, ela não merece, a partir de hoje, a chamarei de Abigail.
    No carro Dona Lucy e eu conversamos sobre várias coisas, ela era muito inteligente, simpática, amável, uma mãe que eu nunca tive e nunca terei. Chegamos no restaurante, já havia uma mesa reservada para nós, o lugar era lindo, moderno, os garçons muito bem vestidos, as toalhas das mesas eram de uma seda vermelha, as cadeiras acolchoadas, a comida aqui deveria ser cara. Fizemos nossos pedidos e enquanto o garçom trazia ela começou a falar.
- Então Clara, você já sabe porque eu a trouxe aqui.
- Sim.
- Eu...não quero que você fique assustada com as coisas que eu vou lhe dizer. Nem se afaste de Ben por isso.
- Isso não vai acontecer Dona Lucy.
- Que bom. - ela suspirou - Bom, nem sei por onde começar. Quando eu conheci Call, o pai de Ben, ele era uma homem incrível, amável, doce, super atencioso - ela fez uma pausa - mas quando nos casamos ele... Ele se mostrou totalmente diferente do que eu pensava que ele fosse.
- Com licença - o garçom encheu as nossas taças com água. Depois que ele saiu ela continuou.
- Então. Com o passar do tempo,Call começou a se mostrar extremamente agressivo, ele começou a beber diariamente e eu estava pensando em me separar mas...eu...eu descobri que estava grávida e eu não queria que meu filho crescesse sem a figura de um pai. Então eu aguentei tudo, mas quando Call descobriu que eu estava gravida, ele começou a ser menos agressivo, eu cheguei a pensar que ele havia melhorado mas...depois que Ben nasceu, ele voltou a ser como antes.
- Com licença. - o garçom trouxe nossos pedidos. Mas eu não queria comer agora, queria ouvir o restante da história.
- Será que podemos comer depois? - falei
- Tudo bem. Vou continuar então.
- Sim. - sorri
- Ben começou a crescer e todos os dias ele presenciava o pai me agredindo e me xingando de tudo quanto era possível, parecia que ele me odiava, e então com o tempo ele também começou a bater em Ben, ele o batia com tanta violência - ela baixou a cabeça, e começou a chorar - eu tentava defende-lo... Mas ele me jogava para longe e continuava, tinha vezes que eu achei que ele mataria Ben. - ela enxugou as lágrimas com o guardanapo - Ben passou por isso até os 9 anos, então um dia, eu cheguei em casa e ele estava com Ben de quatro na sala, nu, e ele o batia com tanto prazer, como... Como um louco. Eu não conseguia fazer nada, então liguei para a polícia e eles levaram Call para a cadeia.
- Nossa. Isso...isso é terrível.
- Sim. Mas...a partir desse dia Ben começou a ser agressivo comigo, e eu estava muito preocupada, eu sabia que aquilo era um reflexo do que ele vivia, então aconteceu o episódio na escola, da qual Ben foi expulso, e a partir daí eu comecei a leva-lo na psicóloga. E o que ela me disse me deixou abismada. Quando Call foi preso, nos exames eles descobriram que ele tinha psicose e Ben...ele tinha desenvolvido a mesma doença. Eu acompanhei algumas consultas dele e...ele contou alguns, como posso dizer? Alguns pensamentos em relação as pessoas e em relação a mim. Ele disse que me odiava e queria me matar, ele acha que a culpa do que acontecia com ele era minha, porque eu não fui capaz de defende-lo - ela voltou a chorar - mas...eu tentei Clara, eu não queria que isso tivesse acontecido, eu juro que eu não queria.
- Dona Lucy. Eu sei muito bem que a culpa não é sua. - segurei sua mão - eu...eu nem sei o que dizer, imagino como deve ser horrível para a senhora, a senhora é uma pessoa maravilhosa, é tão injusto ter que passar por tudo isso.
- Obrigado querida, você é um anjo. Eu fico muito feliz que você e Ben estejam juntos, isso é muito bom para a recuperação dele.
- Mas ele pode ficar curado?
- Não. Mas tem o tratamento e ele esta se relacionando com alguém que ele gosta pode ajudar a desenvolver o lado sentimental dele.
- Bom...eu gosto muito do Ben,quando estamos juntos é tão...tão diferente. - sorri
- Fico muito feliz. Agora vamos comer que já esta frio.
   
   Durante o resto da noite, ficamos conversando sobre música, ela também gosta de música clássica, falamos de filmes, arte, livros...foi muito legal. Mas eu teria que voltar para casa ou melhor meu inferno.

BloodWhere stories live. Discover now