O caso Tom: Parte final - Que o destino se encarregue

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Eu e o Silva estávamos entediados, e ai adivinha onde decidimos ir? Sim, Tunnel, bem criativos. Lá, encontramos o ex-namorado do Ed, Mauro, que eu sabia que pintaria por lá, tínhamos trocado uma ideia antes. Conversamos um pouco e o Silva disse que ele era bonito:

"Por que você não pega?"

Não! Era impossível. No passado, eu, Ed e Mauro tivemos muitos contratempos. Comecei a me comunicar com o Mauro pelo bate papo do gmail. O Ed, apesar de ter dito que não ligava, meio que discutiu comigo por causa disso. E não, nunca havia rolado esse tipo de química entre mim e o Mauro. Não passava da mais pura amizade. Acho que namorado de amigo deve ser encarado como mulher, mesmo após o término. Jamais o faria.

Curtimos a noite. O Silva não estava no pique, não queria se envolver com ninguém por causa de um rolinho que estava tendo e eu fui à luta. Dancei algumas horas, estava mesmo a fim de curtir a balada e só ficar sem compromisso, nem trocar telefones.

Alcancei o objetivo algumas vezes. Fiquei com quem quis ficar.

Somente um não foi alcançado.

Não não soube seu nome. Não soube de onde ele era. Sabia que usa boné, era um pouco mais baixo do que eu e vivia na Tunnel,conversando com caras mais velhos. Sempre nos encarámos pelos cantos.

Às vezes, traço metas, objetivos a serem cumpridos na minha vida. Pegar aquele cara era um deles. Eu e o Silva conversávamos nos banquinhos e de repente, ele surgiu. E meio que me olhando, falou:

— Oi...

Eu respondi bem baixinho, mas então ele beijou no rosto do cara do meu lado.

O "oi" não tinha sido para mim, que vergonha!

Aquela noite acabou sem alcançar a meta, apesar de todas as outras terem sido alcançadas.

No dia seguinte, sábado, fui ao teatro com uma velha amiga que nunca citei por aqui. Não sei por que nunca falei dela. Acho que nunca surgiu oportunidade. Fomos eu, o namorado dela e o irmão dela em uma peça chamada NuConcreto, uma crítica à sociedade moderna e à globalização que vive afetando nossas vidas.

Adorei a peça, adorei o sábado chuvoso, apesar de algumas insinuações com relação à homossexualidade feitas por pessoas de fora do universo que nem sonhavam que eu fazia parte de tal contexto. Bette era minha colega (não considero amigos pessoas a quem não contei sobre mim), e por muito tempo quis contar a ela, mas nunca rolou a oportunidade.

Seu irmão começou a me perguntar o motivo de frases que em uma época coloquei no msn (as quais aparentavam que eu estava gostando de alguém, não lembro na época de quem foi), mas desconversei. Sei lá, não mentia mais em relação ao assunto, se me pressionarem demais acabo contando, mas havia um motivo importante pelo qual ninguém dessa família sabe de mim: O irmão de Bette era um dos melhores amigos do meu irmão, que nem sonhava sobre mim.

E eu não tinha interesse nenhum em mudar isso.

Uma vez Ed viu o namorado de Bette e jurou de pés juntos que ele é gay. Mas isso era impossível... era mesmo?! Nunca teria certeza.

Enfim, a peça foi genial, mas me senti meio mal por mentir para todos, por não poder ser eu mesmo. Não quero mais interpretar papéis nem ter que mentir para as pessoas sobre meus gostos. Por isso geralmente me afasto. E outra: Eram pessoas que, provavelmente quando soubessem de mim, se afastariam automaticamente. Ao menos era o que eu pensava.

Encontrei o Tom online, eu havia readicionado no msn depois de nossa experiência quase ataque-homofóbico. Em meio à conversa, eu atribuí nossos encontros anteriores na Tunnel e na porta da Loka, outra baladinha, como "obras do destino". Pra que...

— Não, Arthur, na boa, destino? Não vai querer falar de destino justo comigo, né?

O mesmo niilista frio de antes, naquele momento me senti mal.

No fim de semana seguinte, voltei à Tunnel.

Dançando na pista, avistei o Tom e nem fui até ele, desci para a pista debaixo. Encontrei novamente o garoto do boné, minha meta. Comecei a dançar bastante abaixo do ventilador, com o vento batendo em mim naquele calor insuportável. Tom desceu e começou a dançar também. Ele me viu. Veio até mim, me cumprimentou e deu a punhalada final:

—É o destino, né?

É, com certeza era o destino. Ele continuou dançando longe de mim e então, de repente, o destino começou a movimentar suas peças.

O garoto de boné.

Tom.

Dançando.

Na mesma pista.

O garoto de boné então falou algo em seu ouvido.

Mais cochichos.

Não demorou muito, e o destino cruel se revelou.

Tom agarrou o garoto pelos braços e o levou lá para fora. Eu os acompanhei com os olhos. Eles começaram a se beijar. Estavam curtindo a noite. Minha noite acabou ali, óbvio. Meu passado obscuro e meu futuro não realizado se agarrando loucamente... Nunca tive uma noite tão chata naquele lugar.

Mas o destino se encarregou de concluir o caso Tom de uma vez por todas. Nunca mais o vi. Bola pra frente.

Diário de um ex-virgem gayOnde as histórias ganham vida. Descobre agora