Enredo #3 - Plot points

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Descobrir o que as boas histórias têm em comum é objeto de estudo há alguns milênios. Entre várias outras qualidades destas, de personagens carismáticos e convincentes até a conexão com os conflitos vividos pelo protagonista, um fator que é eleito por muitos como principal é um bom enredo. Então, para fazer uma boa história, precisamos entender o que é um enredo e do que ele é feito.

Como vimos em Enredo #1, enredo é a espinha dorsal da história. A soma de tudo o que acontece (ações). Neste capítulo, analisaremos os 4 Plots Points que são os eventos mais importantes do enredo, aqueles que desalinham a trama e provocam uma reviravolta. É importante ressaltar que esse é um padrão constante, mas não é a única opção para construir um bom enredo. Inclusive, o tamanho do livro pode criar a necessidade de aumentar ou diminuir o número de plot points.

Incidente incitante:

É o primeiro deles. O incidente incitante é, como o nome diz, o evento que incita a história. Faz isso ao desequilibrar a vida do protagonista. O incidente precisa ser forte, radical, bem estruturado e, principalmente, verossímil. Tudo o que acontece antes deve preparar o protagonista para resistir e em seguida aceitar as mudanças.

Usando o exemplo de Harry Potter e a Pedra Filosofal, é o momento que Harry recebe o convite para entrar em Hogwarts. A partir daí, seu mundo se transforma para sempre .

Ponto de virada 1 ou Lock in:

Acontece quando o protagonista aceita as mudanças trazidas pelo incidente incitante e inicia a sua jornada. O nome lock in (prender) dá-se porque, a partir daí, o protagonista não pode voltar atrás. Ele está preso ao seu destino. É a transição do Primeiro Ato para o Segundo e, como dito em Enredo #2, deve acontecer durante o primeiro quarto da história.

Continuando com o mesmo exemplo, o lock in acontece quando Harry chega à plataforma 9 ¾ da estação King's Cross e decide enfrentar a realidade (a parede) para acreditar na magia. Quando ele cruza a parede, sua jornada começa de fato. Nada nunca mais será igual.

Primeiro ponto culminante ou Mid point:

Localizado no meio do Segundo Ato, é quando o protagonista conquista sua primeira vitória (ou derrota importante). Segundo o roteirista americano Mel Brooks, deve ser uma grande reviravolta inesperada. Se tudo está indo bem, um desastre. Ou vice-versa. Também tem uma ligação importante com o final. Quando este for "feliz", o mid point tende a ser negativo.

E de face a um revés, o protagonista precisa mais uma vez decidir se vai agir ou não. Mas, pela primeira vez, ele conhece os riscos e decide agir contra as forças antagonistas conscientemente.

Acontece quando Harry descobre que Hagrid esconde a Pedra Filosofal em Hogwarts e acredita que Snape quer roubá-la. Pela primeira vez, ele entende os riscos e decide enfrentar as forças antagonistas.

Clímax

Ao final do Segundo Ato, a história alcança o seu ponto mais alto de tensão. O clímax é a reviravolta mais importante da trama. Nele, o herói chega no seu ponto mais obscuro. É a hora que seus aliados morrem ou não podem ajudá-lo e ele se vê sozinho, sem esperança e precisa enfrentar seu vilão diretamente. Se ele falhar, tudo está perdido. Pensa em desistir, já que suas chances de vitória são mínimas. É nesse momento que o herói emerge das cinzas com determinação renovada, disposto a morrer por sua causa.

Deve acontecer por volta do terceiro quarto da história.

Cabe ressaltar que o antagonista nem sempre é uma pessoa (como veremos em um capítulo sobre tipos de personagens). Em alguns casos é algum defeito do próprio herói. Nesse caso, ele precisa combater essa falha moral.

No nosso exemplo, Harry descobre que um agente de Voldemort é quem quer a pedra para recuperar os poderes do mestre e que Hagrid deu a última informação que ele precisa para roubá-la. Harry sabe que Voldemort e seus agentes são fortes a ponto de assassinar ótimos bruxos, como seus pais, mas precisa colocar a sua vida em risco para tentar impedi-lo.

Considerações

- Quando o enredo do personagem é tratado em mais de um livro, a história deve ser avaliada de forma integrada. Assim, mesmo sendo ideal que os plot points sejam respeitados para que cada livro se aguente em pé por si só, algumas concessões devem ser feitas. Por exemplo, o herói pode ser derrotado na batalha final ou precisar fugir com o rabo entre as pernas só para evoluir durante o próximo livro e finalmente conseguir vencer o antagonista. Um exemplo é o filme 300. A derrota de Leonidas é fundamental para unir a Grécia e finalmente vencer a Pérsia.

- Teóricos diferem quanto a quantidade essencial de plot points e da estrutura dos Atos. Abaixo resumirei os dois que eu acho mais importantes (existem muitos outros modelos):

Syd Field: Divide o segundo Ato em dois. Dessa forma o mid point é uma reviravolta entre os Atos 2A e 2B. Também empurra o clímax para o meio do terceiro Ato. Para isso precisa criar mais uma reviravolta entre o segundo e terceiro Atos. Além disso, ele cria reviravoltas menores no meio dos Atos 2A e 2B.

Robert Mckee: Defende começar com o incidente incitante, para dar mais dinamismo à trama. Além disso, ele defende que cada cena tenha uma carga dramática (positiva/negativa) oposta e superior à anterior. Dessa forma, as reviravoltas são mais constantes e o número de plot points necessários menor. Para ele o desfecho do terceiro Ato deve ser o mais breve possível.

- Como mídia, eu deixo um breve vídeo (em inglês) do The Script Lab. Eles usam 5 plot points. O último (Reviravolta do terceiro Ato) quase sempre está contido no clímax, por isso, nem sempre é necessário, por isso não o coloquei aqui. No entanto, pode ser uma ferramenta importante para ajustar um clímax prematuro ou para impulsionar sequências.


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