Nascer Lupino

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- Elli, Elli você consegue me ouvir? – Eu escutava a voz mais linda desse mundo.

Abri meus olhos, Casper estava bem na minha frente, apoiava suas mãos em minhas costas, meu corpo ainda estava no chão e com todos ao meu redor, espremiam-se para ver-me. Quando todos  viram meus olhos abertos sentiram alívio. Então Anahir aproximou-se de mim, não se importando com a presença do meu namorado.

- Elli, de hoje em diante nossa lealdade estará com você. Peço desculpas pela pequena confusão que causei, eu não iria mandar um dos meus tentar matá-la, nunca iria fazer, ainda mais por você ser uma humana, então tivemos a ideia de descontrolar... o Casper. Afinal, ele é seu ponto fraco e sabíamos que nunca iria descontrolar-se com você. – Anahir me olhava com orgulho. "Sério? Isso tudo foi um plano improvisado dele? É o cara me surpreendeu."

- Tudo bem, fico feliz em ter sido útil e por ter ganhado sua confiança. – Falei sentindo-me instável.

- Você, me siga. – O líder disse para Casper, dessa vez sua voz não estava tão rude, mas eu podia ver a desconfiança em seus olhos. Por mais que estivessem prestes a fazer uma aliança, não significava que seriam melhores amigos, a desconfiança seria óbvia enquanto a confiança não fosse merecida.

Casper o seguiu comigo. Saíram da barraca acompanhados de Suzana, Adam, Amélia e Diggory. Onde fossemos eles nos seguiriam, não seria do dia para noite que os Auduwen iriam confiar nos lobos. Kaleb também veio junto. Entramos em uma barraca menor lá havia algumas camas, em um canto se encontrava uma mini cozinha e ao seu lado prateleiras com garrafas cheias de ervas, líquidos de todas as cores. Sim, eu estava na enfermaria dos lobisomens. Anahir fez um gesto para que Casper soltasse-me na cama, sentei-me assim que me soltaram, então uma garota trouxe-me uma tigela com sopa, estava delicioso e tomei tudo. Enquanto eu comia observava o líder, Kaleb e os Auduwen conversar e discutir sobre o que fariam a partir dali em diante.

Decidiram que os lobisomens também me vigiariam e me protegeriam contra qualquer ameaça que surgisse. Isso significava que veria Kaleb regularmente quase todos dias. O líder dos lobos chamou os Auduwen para conversarem longe de minha vista, acho que ainda tinha alguns assuntos pendentes.

- Você está melhor? – Perguntou Kaleb sentando ao meu lado.

- Muito melhor, essa sopa é revigorante. – Falei sorrindo.

- Com certeza, ela tem propriedades medicinais. – Kaleb ficou sério então, mudando de assunto. – Como você fez aquilo Elli?

- Não sei, é algo confuso e estranho. Só acontece quando eu estou com adrenalina correndo nas veias.

- Posso entender o que você sente, eu sentia o mesmo nas minhas primeiras transformações.

- Kaleb, sei que é um assunto pessoal, mas você nunca chegou a comentar como foi transformado.

- Você gostaria de saber mesmo?

- Sim.

- Ok então lá vai, prepare-se para uma história super emocionante. – Kaleb tentou sorrir, mas seus olhos estavam tristes. Então percebi que a história não seria tão emocionante. – Em meados do século XII vivia em um feudo, no que seria hoje a Nova Zelândia. O feudo ficava próximo de Woodhill, eu não passava de um servo. Aqueles eram tempos de trevas em que as pestes assolavam os reinos, pessoas miseráveis estavam por todo canto e os vampiros e lobisomens dominavam todas as raças.

"Eles guerreavam entre si, ignorando a raça humana como um igual, os humanos para eles só existiam como alimento. Acho que esse era o mal deles, enquanto o homem evoluía, eles continuavam em costumes antigos, pensando que o progresso dos mortais seria algo passageiro."

Conforme Kaleb contava tudo, eu conseguia imaginar as construções romanas e góticas que estavam em seu auge naquele período. Paredes sufocantes de tão espessas, janelas pequenas por onde mal passava a luz do dia, que por essa razão tornavam o local claustrofóbico mesmo o teto sendo a muitos metros de distância de sua cabeça. Lugares limpos de qualquer decoração no interior, mas que por fora possuía diversas formas e criaturas esculpidas, lapidadas.

Uma época em que a crença cegava a razão e superstições era tido como a mais pura e verdadeira sabedoria.

- Eu começara a trabalhar no campo desde cedo. O que ganhava mal dava para sobreviver, mas ainda assim era grato pelo o que tinha. Meus pais moravam em outra propriedade, quando fiz 13 anos meu senhor feudal me vendera a um outro proprietário.

"Seis anos depois morando naquela propriedade, comecei a ouvir muitos boatos vindos de todos os lugares, sobre criaturas letais que devastavam lugares por onde passavam. Diziam ser demônios ou cães do diabo, eu pensava que eram apenas fofocas. Até que um dia no meio da noite, ouvimos uivos e rosnados, passos que mais pareciam de cavalos vindos em nossa direção, conforme aproximavam-se o chão tremia com sua fúria. Fui rápido o bastante para esconder-me em um alçapão que servia de dispensa na casa dos empregados."

" Dali segundos, destroçaram a porta e as janelas. Monstros enormes começaram a matar as pessoas como se fossem apenas frutas a serem colhidas em um jardim. O cheiro que estava no ar me enjoava devido ao sangue em abundancia. Um deles farejava o alçapão então seu farejar mudou para mordidas insanas e arranhões feitos por suas garras afiadas na madeira. Após vários segundos de investidas sobre as tábuas, finalmente elas cederam. A esta altura, eu estava tomado de terror, tentava esconder-me no canto mais escuro do alçapão. Quando a fera entrou veio direto em minha jugular e naquele momento eu sabia que morreria. Mas então o lobisomem largou-me ali no chão e foi embora. Eu não sentia mais dor, estava com o ferimento dormente e incrivelmente cansado, exausto na verdade."

"Quando acordei, já era noite do outro dia. Meu ferimento sumira como um milagre, sentia-me muito bem e surpreendi-me ao notar que conseguia ouvir muito melhor, enxergar o que seria impossível com olhos humanos, sem comentar na velocidade em que podia correr. Minha agilidade havia melhorado muito."

"Meus primeiros dias como lobisomem foram doloroso, cada processo de transformação era uma tortura, meus ossos quebravam e cresciam enquanto outros encolhiam. No início durava horas, hoje em dia é quase tão rápido quanto um piscar de olhos. Nunca descobri quem me transformara. Eu já tinha 3 anos lupinos quando encontrei Anahir e sua matilha."

Kaleb terminou de contar-me sua história com um pesar nos olhos.

- Super emocionante né? – Ele disse sorrindo mas eu percebia que a tristeza permanecia em seus olhos e ainda mais em seus pensamentos.

- Não nem um pouco emocionante. - Respondi timidamente imaginando o quanto Kaleb passara em sua existência, afinal ele era mais antigo que Casper.

Logo meu namorado e o restante de sua família voltaram para ver como eu estava. Ao dizer que já havia melhorado, nos despedimos de todos e fomos embora.

- Parece que você tem nos dado sorte Elli. – Disse Casper enquanto voltávamos para a cidade.

- Porque? – Perguntei.

- Desde que te encontramos as coisas só melhoraram, começando pela profecia. – Disse Amélia sorrindo para mim.

Eu refleti sobre o que disseram e ponderei. Quem sabe eles não estariam certos? Afinal nasci com esse propósito de ajudá-los.

Blood and Moon - A PredestinadaWhere stories live. Discover now