Capítulo V - Um Espectro Ronda Circodema / Parte 3: O Rapaz da Farmácia

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Primeiro dia de trabalho. As sextas-feiras tornavam-se mais caras e demandavam de mim, com meus dezessete anos, um aumento de renda. "Atendente de farmácia!", pensei eu, como se houvesse desvendado a cura do câncer. Pouco trabalho e dinheiro fácil era minha certeza e, de fato, após os três primeiros clientes, tudo estava tão simples quanto parecia ser. Boa-tarde; entregar o remédio; receber; obrigado, volte sempre! Já podia sentir o toque gelado da cerveja em minha boca... Tudo ia bem até, claro, até aquele homem aparecer.

***

No momento em que ele passou pela porta, arregalei os olhos, com absoluta certeza de que seria assaltado em meu primeiro dia de trabalho. A camisa do sujeito estava toda suada e o mesmo tentava cobrir seu rosto com a mão – rosto que possuía traços de que não estava em seu melhor estado.

Assaltado por um drogado; não havia como evitar.

"Eu...", o homem disse; afastei-me um pouco. "Eu preciso de algo pra dor de cabeça. A merda mais forte que você tiver, por favor."

"Meu Deus, essa for por pouco!", pensei, arfando, assentindo ao pedido. "Onde será que está essa merda?", pensava, um pouco abalado, olhando para as grandes prateleiras repletas de milhares de medicamentos. O homem do outro lado do balcão me intimidava com sua presença; quanto mais rápido achasse o bendito remédio, mais rápido ele sairia de lá. E isto, na minha modesta opinião, seria ótimo.

"Rápido, porra!", ele esbravejou.

"Meu Deus, meu Deus, meu Deus!", as palavras aceleraram em minha cabeça. Peguei uma cartela que estava ao alcance da minha mão, rezando para ser o que o homem desejava.

"Aqui... aqui está, senhor", entreguei-lhe a cartela com seis comprimidos, que foram bruscamente puxados de minha mão. Dipirona, 1g; o farmacêutico me dissera para indicá-lo para tomar, no mínimo, um comprimido a cada seis horas, mas não seria eu que o lembraria disso.

"Obrigado", disse, deixou uma nota sobre o balcão e se direcionou à saída. "Pode ficar com o troco, moleque."

Olhei o dinheiro e voltei os olhos para a conturbada figura. A nota nem ao menos pagava o medicamento! Mas, novamente, não seria eu que o lembraria disso. No momento em que ele finalmente saiu, suspirei aliviado, levando a mão à cabeça e questionando as decisões que tomara em minha vida. Abriria mão de qualquer sexta-feira para manter distância de caras assustadores como aquele.

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