Surpresas da noite

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Belinda

— Para onde você está indo Jessye? A casa do Kadu é no Recreio, e se ainda me lembro bem, esse não é o caminho. — falei quando vi minha amiga pegar outro caminho.
— Sei muito bem onde fica a casa dele, por que eu estive em todas as festas.
— Então por que estamos indo para São Conrado?
— Por que Kadu alugou uma casa com piscina para a festa de hoje.
— Por que isso agora? A casa dele também tem piscina. — falei sem entender.
— E eu vou saber os motivos da mudança dele? Eu só quero estar no meio da folia. Beber e dançar.
— Já sabe que se beber...
— Você não vai me carregar bêbada para casa. — disse Jessye revirando os olhos. — Eu já sei esse discurso de cabo a rabo. Falei no sentido figurado, já que estou de motorista hoje.
— Você fala como se eu fosse encher a cara. Coisa que nunca acontecerá.
— Não cuspa para cima Belinda, pode voltar e te acertar no meio da testa.
— Tenho absoluta que não passarei por isso. — falei com toda certeza. — Eu e o álcool somos inimigos a anos.
— Claro que é, depois daquele porre no primeiro ano do ensino médio em que sua mãe quase enfartou quando chegou em casa e nos flagrou.

Nós duas rimos ao lembrar da cena.

Meu primo Rian veio passar uma temporada na minha casa, fugindo do controle obsessivo da minha tia Rita, e como ele era mais velho e descolado, foi fácil convencer ele a comprar uma garrafa de vodca. Fizemos uma aposta idiota de quem conseguiria beber mais copos de álcool antes que fizesse efeito. Claro que fui a primeira.

Fiquei tão bêbada que não lembro um terço do que fiz. Só sei que acordei no dia seguinte com ressaca do tamanho de um elefante. E ainda tive que aturar a lição de moral da minha mãe. Nunca vi ela tão furiosa.

Meu primo, claro, tratou de ir embora rapidinho. Coitado, levou toda a culpa por ele ser de maior e ter oferecido bebida alcoólica para menores. Ivy e Jessye ficaram um mês sem ir na minha casa e Rian ficou um bom tempo sem me ligar. Só vim ter notícias suas, ano passado quando ele me ligou da Austrália.
— Podemos pular essa parte da nossa vida e voltar ao presente. Só em falar a palavra vodca, já fico enjoada. — falei sentindo os pelos dos meus braços se eriçarem.
Jessye riu e voltou a se concentrar na estrada.
— Então, voltando ao assunto da festa, que casa ele alugou? — perguntei querendo mudar de assunto.
— Na verdade, eu não sei. Ele mandou o endereço pela sua página na internet.
— Kadu tem uma página?
— Quem em Braz Cunha não tem uma página?
— Eu não tenho. Você tem?
— Claro!
— Por que eu nunca soube disso? — perguntei sem acreditar.
— Por que nunca perguntou.
— Eu sempre sei tudo naquele lugar. Como...
— Você estava tão ocupada em levar informações úteis para o campus que deixou de lado a vida dos alunos. A parte mais importante daquele lugar. Quem diria, a minha amiga Belinda não tem uma página. Não me admira que os garotos não se aproximem. Não te conhecem.
— E quem disse que quero que eles me conheçam? — falei cruzando os braços sobre o peito.
— Você é garota. E como toda garota, deseja ser observada.
— Eu não desejo nada disso.
Ficamos alguns segundos em silêncio até minha curiosidade me vencer.
— Quantos seguidores o Kadu tem?
— Hã... Não sei exato, mas arriscaria milhares e quando digo milhares quero dizer exatamente isso. Depois dá uma olhada. Estou seguindo ele.
— Você acha mesmo que perderei meu tempo olhando a página do Kadu?
— Sei lá. — disse Jessye dando de ombro. — Olha nem que seja para matar a sua curiosidade.
— E quem te disse que estou curiosa?
— Se não estivesse, não teria perguntado.
— Perguntei por perguntar. — falei voltando meu olhar para a pista.
— Eu te conheço de ontem Belinda. Você deve estar se roendo para pegar seu celular e dar uma olhadinha.
— Nossa, estou Surtando para fazer isso. — disse em tom de deboche.
— Você não seria a primeira. Conhecemos bem a lista de seguidoras do Kadu.
— Ele já tem bajuladoras demais, não precisa de mais uma.
— Então se não fosse isso, você seria uma candidata?
— Candidata ao quê Jessye?
Jessye troca de marcha e continua conversando sem tirar os olhos da pista.
— Vocês formariam um belo casal.
— O quê? Agora você surtou de vez. Eu e Kadu juntos? — eu ri. — Nunca em um milhão de anos.
— Por quê?
— Eu e Kadu somos como água e óleo. Duas coisas que não se misturam. É impossível.
— Não tem aquele ditado que os opostos se atraem? Não vejo o porquê de não dar certo.
— Só vou te dar alguns motivos para a sua loucura não ir adiante. Primeiro, eu não gosto da maneira que ele age com as garotas no dia seguinte depois que as enxota da sua cama. Segundo, ele é arrogante, prepotente, mesquinho, idiota...
— Ele é inteligente, será advogado e herdará o patrimônio um dia.
— Nick também vai, e nem age como se tivesse um rei na barriga. Nick é bem mais cabeça feita.
— Estava demorando você tocar no Nick.
Jessye me encarou por alguns segundos.
— O que foi? Falei alguma mentira? A cada dez palavras, onze envolve Nick.
— Isso é mentira. Desde que voltei quase não toquei no seu nome. E quando ele entrou na conversar, foi você quem falou.
— Não falou ainda porque não quer ouvir a verdade.
— Que verdade Jessye?
— Que você ainda é caidinha pelo Nick. Por que não confessa logo? Joga para fora, aposto que será libertador.
— Eu não vou confessar nada, por que não existe nada para ser confessado.
— Ok, se essa é sua palavra final...
— Sim, essa é minha palavra final.
— Então voltamos ao assunto principal, Kadu.
— Ai meu pai protetor da minha paciência esgotada, me ajuda com a minha amiga.
— Eu ainda acredito que vocês formariam um casal e tanto.
— Eu e Kadu juntos seria a causa da Terceira Guerra Mundial, além disso, ele tem namorada.
— Namorada essa que nem liga para suas traições. Como a Babi suporta isso?
— Por um motivo.
— Qual?
— Dinheiro, status.
— Dinheiro ela tem a rodos. E status só se for de chifruda oficial.
Não pude conter o riso. Nem Jessye.
— É sério Jessye. Não dá. Kadu é tão...
Fiquei procurando uma palavra.
— Me dá só um motivo para que você não dê uma oportunidade para o Kadu.
— Além dele ter namorada? — questiono.
— Babi pode ser um detalhe descartável.
Revirei os olhos.

Eu tinha um grande motivo para dizer NÃO definitivamente, mas se falasse, estaria me entregando. E isso, nunca aconteceria. O jeito era tentar sair ilesa da sua ideia maluca.

— Eu não gosto do Kadu.
— Por que não? Ok, eu sei que ele pode ser um pouco grosso e exibido às vezes.
— Às vezes? Defina essa palavra.
— Ok, ele é assim sempre. Mas deve ter um lado dele que não conhecemos.
— Onde você quer chegar com isso tudo?
— Eu não quero chegar à lugar algum, só estou comentando.
— Quando você começa a se envolver demais no assunto, e por que está aprontando algo, e eu tenho certeza que não gostarei.
— Nossa que horror! — Jessye pôs a mão no peito se fazendo de ofendida. — Eu só estava pensando que...
— Viu?! Eu sabia que por trás dessa conversa toda tinha alguma ideia maluca.
— Não é ideia maluca.
— Jessye, para de enrolar e solta logo o que você quer realmente falar.
— Bom, eu estava pensando aqui comigo...
— Continue.
— Já que você ainda vive à sombra do Nick...
— Eu já falei que Nick é passado. O que tenho que fazer para provar isso? Você quer que eu fique com Kadu, irmão gêmeo do Nick para te provar algo? Em que isso vai me ajudar?
— Só penso que você deveria se aventurar um pouco. Sentir um pouco de adrenalina.
— Fala a garota com experiência nisso. — zombei.
— Eu não estou na questão, e sim você. Belinda você quase não sai. Passa a maior parte do tempo enfiada naquele jornal.
— E você achou.
— Eu ainda acho.
— Ok, você julga que ficar com o Kadu é a solução?
— Não precisa ser o Kadu, já que você demonstrou tanto desprezo. Pode ser outro cara, alguém que te tire de órbita.
— E esse alguém estará na festa?
— Não sei, mas podemos procurar. Vamos lá Belinda, se deixe levar uma vez pelo menos. Você já começou a mudança. — Jessye apontou para os meus cabelos e depois meu vestido. — Que tal se arriscar um pouco mais?
Olhei Jessye para me assegurar que ela estava falando sério. Nenhum sinal de brincadeira.
Soltei um longo suspiro.
— Ok, você venceu. — falei derrotada.
— Isso! — Jessye fez gesto com uma mão enquanto segurava a direção com a outra.
— Mas não fique tão animada. Posso não me encantar com algum cara bombado da festa.
— Prometa que tentará pelo menos.
— Eu vou tentar.
— Estou louca para ver isso. — Jessye fez a dancinha da vitória.
Eu tinha lá minhas dúvidas em relação a isso. Eu já conhecia quase todos os caras, eu os observava pelos corredores enquanto seguia para a aula. Nenhum deles chegou a chamar minha atenção, mas se fosse para Jessye parar de falar em Nick, eu toparia numa boa.
Quando chegamos ao condomínio, fomos barradas. Jessye baixou o vidro do carro para falar com o segurança.
Nomes, por favor. — o segurança com cara fechada falou.
— Jessye e Belinda.
— Desde quando ele barra as pessoas para sua festa? — perguntei incrédula.
— Belinda, em dois meses você perdeu muitas festas. — Jessye falou enquanto aguardávamos o segurança correr o desdo na lista.
— Ok, estão liberadas.
— É claro que estamos. — Jessye piscou para o cara enquanto ele abria o portão.
Estacionamos em um local que fosse fácil fazer o retorno depois. Saí do carro e fiquei aguardando Jessye trancar o carro. Dei uma arrumada rápida no vestido e depois seguimos para a entrada.
A primeira coisa que notei foi a escuridão do lugar. A sala estava com as luzes especiais, dessas de festa de boate. Já havia casais dando uns amassos nos sofás, cantos da sala e nas escadas. Nada de novidade.
Passamos quase despercebidas, com Jessye na frente abrindo espaço. Trocamos alguns olhares e sorrisos, nada muito íntimo.
— Vamos procurar o bar. Deve estar lá fora. — Jessye falou alto devido à música alta.
— Você não disse que não iria beber?
— Eu não vou beber álcool, mas preciso molhar a garganta.
Jessye agarrou minha mão e seguimos pelo longo corredor, atravessando a cozinha, onde estavam caixas e caixas de cervejas.
Do lado de fora, o som estava suportável, dava até para ter uma conversa normal. O bar parecia o melhor lugar da casa, pessoas estavam amontoadas tentando pegar uma bebida.

— Preciso ir ao banheiro rapidinho, vai pedindo nossas bebidas que eu já volto. — Jessye começou a se afastar.
— O que você quer beber? — perguntei com ela já estando longe.
— Qualquer coisa sem álcool. Eu não demoro.
Jessye sumiu entre as pessoas e só me restou enfrentar o tumulto do bar. Eu morreria de sede antes de ser atendida.
— Sei como conseguir o que quer mais rápido. Basta me pedir morena.
Reconheci a voz assim que proferiu a primeira frase. Virei-me para observar a cara de surpresa do Kadu.
— Belinda?
— Olá Kadu.
— Uau! Você...
Kadu me olhou dos pés à cabeça, parando na minha boca.
A noite não seria tão desastrosa como eu imaginava.

Antes de você - Livro 3Onde as histórias ganham vida. Descobre agora