Capítulo 4.

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— Leonardo, me pega com mais força!

Encarei-o e estalei a língua, frustrada com sua resistência em realizar o golpe. Por um lado eu entendia, (bastava ver o tamanho do seu bíceps em comparação ao meu) mas de nada adiantaria aquela prática se a situação real me desestabilizasse completamente.

Sem surpresas, ele recebeu meu pedido com um sorriso malicioso, mas logo tratou de disfarçar para não deixar zangar Paulina. Nossa "instrutora" estava parada na sombra da varanda, observando-nos enquanto tomava um gole da garrafa de água. Seus cachos estavam presos num rabo-de-cavalo baixo e, assim como eu, vestia um top e shorts de treino, expondo seu abdômen e pernas bem malhadas.

— Rebeca... — Ele começou, no tom complacente que eu odiava.

— Vai lá, Leonardo — Paulina interveio, porque já conhecia aquele tipo de discussão, assim como o seu desfecho. Ou, principalmente, porque estava cansada e definitivamente não queria ser a minha parceira naquele momento: — Pode colocar mais força.

O garoto respirou fundo, mas afinal caminhou um pouco para trás. Paulina deu o comando e iniciamos a coreografia. Dei dois passos, sentindo o coração acelerado de excitação.

O mata-leão veio fulminante, cortando minha respiração no instante em que seu braço rodeou meu pescoço. Se antes estava se contendo, reconheci uma das poucas vezes em que Leonardo se atrevia a descuidar da força enquanto treinava comigo — e só o fazia porque sabia que eu não seria tão imprudente de não pedir para parar, se achasse necessário. Minha garganta queimou quando fui puxada de encontro ao seu corpo e percebi o movimento do braço esquerdo que fecharia a chave.

Se ele a encaixasse bem, mesmo com a técnica certa eu não conseguiria sair. A realidade era essa: independente do quanto eu treinasse, nunca ganharia de um homem de sua estatura na força bruta, por isso sentia a necessidade de um treinamento como aqueles, para tentar ao máximo igualar minhas chances numa situação de combate. A defesa pessoal não se baseava na força, mas era preciso treino para entender o impacto de uma tentativa de mobilização e ter a frieza da reação em uma situação real.

Como num flashback, lembrei quando enfrentei Enrico, um dos homens de Klaus, caída sob ele numa chuva torrencial. Eu não era fraca, mas se não tivesse conseguido uma abertura quando enfiei meu canivete na perna dele, teria sido impossível para mim sair da mira da pistola.

Agarrei o braço de Leonardo com as duas mãos e o puxei com força, fazendo o mata-leão ceder o suficiente para conseguir enfiar meu queixo entre ele e ganhar uma folga para respirar. Virei o rosto na direção do seu bíceps. Seria possível me desvencilhar agora, com um movimento simples como tirar uma blusa, mas eu sabia que machucaria meu rosto quando seu braço "raspasse" por ele. Ao invés disso, usei a mão direita para segurar sua blusa na altura do ombro. O agarrão me dava estabilidade, mas o segredo estava no movimento.

Numa virada rápida, usei o impulso certo para jogá-lo no chão por cima do meu ombro. Com a chave de pescoço afrouxada pela minha posição, eu consegui escapar no meio do movimento. Ouvi o som oco das suas costas batendo no chão (o treino de jiu-jitsu também envolvia aprender a cair direito) e Leonardo arfou.

— Tudo bem? — perguntou, assim que me viu levar a mão ao pescoço, mesmo que fosse ele quem estivesse esparramado no chão.

Limpei a garganta, ignorando a sensação de queimação. Em um mundo pré-apocalíptico, provavelmente nenhum professor seria tão descuidado para nos permitir abusar da força na tentativa de simular uma situação real, correndo o risco de um ferimento mais sério. Felizmente, Paulina não era uma professora de jiu-jitsu de verdade (apenas fizera aulas no passado) e reconhecíamos uma necessidade maior de nos prepararmos para uma possível situação real.

Em FúriaDonde viven las historias. Descúbrelo ahora