— Eu estive pensando... — A menina iniciou sem ao menos me dar um bom dia.
— Bom dia para você também. — Ouço a risada dela.
— Bom dia, meu amor! — Sinto o rápido beijo dela. — Voltando ao que eu dizia, o que acha de irmos a quinta da boa vista? Podemos fazer um piquenique.
— Essa empolgação toda é por isso?
— Sim!
— Ok, criança. Podemos marcar e ir.
— Eu nunca fui lá, sabia? Desde que vim morar no Rio, minha mãe nunca me deixou visitar a quinta da boa vista.
— Você não é do Rio?
— Não, sou de Itapema. Vim morar no Rio com nove anos. — Libero um murmúrio. — Sou louca para ir lá e também visitar o zoológico.
— Lá é um lugar realmente lindo Selena, mas não sei se vai conseguir aproveitar todo aquele lugar comigo.
— É por que está cega? Demi, eu não me importo com isso ou com o que podem dizer sobre nós. Quero aproveitar tudo o que posso ao seu lado, mas se te incomoda tanto, podemos deixar para lá.
— Você não precisa deixar de ir aos lugares por minha causa, querida.
— Não será a mesma coisa sem você. — Suspiro. — Seu café está na mesa, eu vou estudar porque preciso apresentar um trabalho na faculdade. Quando terminar pode deixar a louça na mesa mesmo, depois eu arrumo tudo aqui.
— Ei, docinho. — A seguro. — Escolha um fim de semana, nós vamos fazer o nosso piquenique.
— Não precisa Demi...
— Estou dizendo para escolher, querida. — Sinto os lábios dela nos meus.
— Obrigada!
Tomei o meu café da manhã ouvindo Selena fazer seus planos para o nosso futuro passeio, ela listou tudo o que queria fazer em minha companhia, os lugares que queria conhecer ou simplesmente passear mais uma vez. Assim que terminei o meu café, a menina lavou a louça e nós fomos para o jardim, eu me sentei na mesma cadeira de sempre para apreciar a brisa.
— Quer que eu descreva o dia para você?
— Por favor...
— Está um dia ensolarado, quase sem nuvens e com uma brisa boa. Hoje eu conversei com as suas flores mais uma vez, elas estão ficando lindas, e eu também plantei mais algumas flores que comprei ontem. Seu jardim é o mais bonito que conheço. — Sorrio, sinto a menina se sentar em minhas coxas. — No jornal deu previsão de chuva para amanhã, mas eu não quero que isso aconteça.
— Os dias de chuvas também possuem a sua beleza.
— Não mesmo, a chuva só faz assustar as pessoas e traz as trovoadas com ela.
— Vai me dizer que nunca gostou de sentir o cheiro de terra molhada após a chuva? De sentir a grama molhada, de brincar na chuva, de sentir cada gota tocar sua pele e no final tomar uma caneca de chocolate quente para se aquecer.
— Eu nunca fiz essas coisas.
— Nunca?
— Nunca. — Murmurou, acaricio a coxa da menina.
— Bom, você ainda vai fazer. — Sinto ela deitar a cabeça em meu ombro. — Está amuada, o que houve? Pensei que estivesse feliz porque vamos fazer o nosso piquenique.
— Eu estou, mas estou com medo da sua mãe brigar. Madison disse que ela não gostou de saber que te levei a praia, se ela souber que estou te levando a passeios vai ficar brava e pode até me expulsar daqui.
— Minha mãe não vai te expulsar daqui e muito menos me proibir de dar passeios, Selena. Posso estar cega, mas isso não me impede de viver e de aproveitar meus dias das melhores formas. Não vou deixar que ela brigue com você.
— Minha defensora. — Sorrio, sinto o beijo dela em minha bochecha. — Eu...
— Você? — A incentivo, a menina tinha se calado e.me deixado um pouco curiosa.
— Eu ainda não acredito que você quer estar com alguém como eu. — Murmurou, deslizo minha mão pela coxa nua dela.
— Como assim “alguém como você”?
— Alguém cheio de defeitos, sabe? Com problemas de autoestima, com problemas psicológicos, uma pessoa que não tem nada de bom a te oferecer, feia e gorda.
— Quanta bobagem, Lena! — Reviro os olhos. — Já lhe disse que aparência não importa para mim, você é linda com a sua singularidade, é linda sendo magra ou gordinha, é linda tendo aparência padrão ou não, você é linda de qualquer forma. Problemas psicológicos todos temos, sabia? Eu frequentava uma psicóloga desde os treze anos e parei depois que fiquei cega. Problemas com autoestima todos temos, eu levei muito tempo para me aceitar como sou, para aceitar a minha beleza e aceitar que a singularidade que possuo não deve me causar mal, sou única, sou linda da forma que sou. E você também é, meu amor.
— M-Mas...
— Encontrou sua mãe de novo? — Ela suspirou contra pele do meu pescoço.
— Você tem um cheiro tão gostoso... — Tentou desconversar.
— Não quero que dê atenção as palavras de sua mãe, ela quer te atingir, quer te deixar mal. Você é linda, amor. Você é a pessoa mais linda que conheço e, mesmo nunca tendo te visto com os meus próprios olhos, eu não tenho dúvidas disso.
— Por que você sempre sabe o que dizer? — O tom manhoso me fez rir, dou um aperto leve em sua coxa.
— Porque ver você bem é o que me deixa feliz. — Sinto o beijo dela em meu pescoço. — O que acha de lasanha para o almoço? De sobremesa podemos comer um pote de sorvete ou de açaí, o que você quiser.
— Açaí! — Disse mais empolgada. — Acho que não tem todos os ingredientes para lasanha.
— Podemos ir comprar.
— Oba, mercado!
Acabei rindo com a animação da menina, ela pegou as coisas que pedi e fomos juntas para o mercado mais próximo que tinha, a menina foi o caminho todo debatendo com ela mesma qual seria o sabor da lasanha. Selena foi escolhendo todos os ingredientes para lasanha, na hora de pegar o pote de açaí fiz ela pegar dois potes de dois quilos e pude ouvir a comemoração dela.
Uma verdadeira criança.
Gomez cantarolou o caminho todo de volta pra casa, assim que chegamos ela foi preparar o almoço, eu tentei ajudar dela em tudo que pude.
— Amor, vem aqui, por favor. — Levanto, vou até a garota. — Lave as mãos, por favor.
— Por quê? — Pergunto confusa, lavei as mãos como ptenido por ela. Selena se posicionou atrás de mim e guiou minhas mãos, sinto a massa macia da lasanha. — Selena?
— Vamos montar juntas... — Murmurou próximo ao meu ouvido. — Imagino que sinta falta disso, que sinta falta de ter toda sua liberdade na cozinha. Estava aqui refletindo, imaginando como deve ser querer fazer algo e não poder, mas hoje você pode fazer tudo. Não só hoje, todos os dias. Vou ser sua auxiliar na cozinha, te ajudar a ter a sua liberdade outra vez. — Mordo o lábio inferior tentando conter a minha emoção.
— Obrigada... De verdade, você é a primeira que tenta me ajudar a ter minha liberdade.
— É que eu sou a mulher da sua vida, a mulher que vai te proporcionar muitas coisas. — Comentou em um tom brincalhão.
— Talvez você seja mesmo... — Murmuro.
Ela me deu auxílio enquanto eu montava a lasanha, Selena guiou minhas mãos para os locais onde estavam os recipientes e também me auxiliou a posicionar eles dentro da travessa. Quando terminei de montar a lasanha, ela a colocou no forno e foi arrumar a mesa para poder comermos.
Suas palavras ainda redizendo em minha cabeça, em meu peito, Selena é a primeira que tenta fazer com que eu me sinta livre de novo, que eu me sinta capaz de algo mesmo estando cega. A emoção causada por suas palavras me deixou sem ter o que dizer, suas palavras mexeram comigo e ela percebeu, porque a cada cinco segundos me dava um selinho demorado.
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Beautiful Eyes - Semi
FanfictionPela primeira vez após meses, Demetria consegue enxergar a beleza do mundo a sua volta.