Capítulo 23

38 4 0
                                    

Ondas de ódio mundano
Buscam destruir memórias perdidas

***

Enquanto Marcus caminha buscando esperança nos olhos de Dane Kinsey, uma discussão acalorada nasce na sua antiga residência.  A conversa em tom de briga é ouvida atentamente por Bettina, que não cansa de se benzer pedindo proteção divina para o seu menino:

- Já temos a confirmação!  O que estamos esperando? - Grita uma voz masculina.

- Não adianta gritar, isso não irá mata-lo! Trate de se acalmar. - Diz outro homem mais controlado.

- Amanhã cedo vocês dois irão até a vila resolver esse problema. - Ordena uma voz rouca feminina.

- O que meu pai acha disso? - Questiona de maneira quase inocente outra mulher.

- Seu pai acha que o mundo vai acabar amanhã e precisa beber todo vinho que puder hoje. Olhe para ele, bêbado como um porco. - Retruca a mulher da voz envelhecida. - Ele já deve estar tramando algo para voltar. Não podemos correr esse risco. 

- Estou certa de que se o deixássemos em paz, nunca mais teríamos notícias dele. - Defende a jovem moça.

- Deixe de ser tonta menina, já está decidido. Vocês partem amanhã cedo e só voltarão quando alma do rapaz tiver sido devidamente encaminhada para o inferno. – Concluiu a dona da voz envelhecida.

O bando começa a se dispersar, cadeiras são arrastadas e a empregada trata de voltar furtivamente para o trabalho, em sua mente, infinitas orações são direcionadas para a Vila da Passagem. Querem roubar a única coisa que deixaram com o Marcus, sua vida.

Na vila, Marcus traça seu caminho até o balcão do armazém, onde sua esperança o aguarda ansiosa. Cumprimenta Mat e sorri quando confirma que Dane está ali.

***

- Gostaria de falar com você, mas peço para ser de maneira reservada e de preferência agora. - Pede com urgência na voz o rapaz.

- Deixe-me primeiro atender todos que estão no armazém. - Brinca Dane com o lugar que chega a fazer eco de tão vazio. - Venha. - Convida a moça dirigindo-se para o corredor que termina em sua casa.

- Se não se importar prefiro que seja na minha casa. Sugere Marcus.

Sem demonstrar objeção Dane o segue pela estrada da vila. O silêncio do passeio nubla a esperança de que o assunto possa ser do seu agrado. E perdida em um céu de possibilidades começa a se preparar para más notícias. Mas suas nuvens são sopradas para longe tão logo a porta da casa é aberta:

- Não se preocupe Dane, não é nada demais. Na verdade nem sei por onde começar. Vou omitir toda a história e lhe fazer apenas uma pergunta e dependendo da resposta lhe ponho a par de toda situação. - Completa o rapaz.

- Tudo bem, mas trate de falar logo. Meias palavras me deixam louca. - Pede Dane permitindo-se sorrir para um mar de felizes possibilidades.

- Sente-se. - Fala Marcus para a sorridente moça enquanto coloca o livro na mesa aberto e virado para ela. - A pergunta é: Você consegue ler o que está escrito neste livro? - Indaga indo direto ao ponto o esperançoso Marcus.

Dane olha com uma expressão séria para o livro, encara Marcus como se estivesse brava e sem resistir começa a gargalhar:

- Não sou a mais indicada para ler a você uma história Marcus, mas se houvesse ao menos uma linha escrita aqui eu poderia tentar.

A alegria da moça, achando que aquilo era apenas uma brincadeira tola do seu enamorado, rompeu o último fio de esperança que prendia Marcus às palavras da Lizandra. Visivelmente abatido fecha o livro e agradece:

- Obrigado Dane, vejo que infelizmente não será necessário lhe contar toda a história. - Diz tentando guardar dentro do livro o desenho a carvão.

- O que é isso? - Pergunta Dane tentando entender o que de errado possa ter dito que causou tanto sofrimento.

- Só um desenho que encontrei tão sem sentido quanto as páginas em branco do livro para você.  – Fala Marcus decepcionado deixando a folha desenhada nas mãos e Dane.

- Essas frases eu consigo ler.  - Busca a moça, de maneira desesperada, uma solução para o clima que se estabeleceu.

- Infelizmente essas eu também, apesar de não entender o que está escrito.  Responde ele com ar de derrota.

- Você vai explicar o que está acontecendo? Porque sinceramente acho que perdi alguma parte desta história.  Desculpe se não reagi como deveria diante do livro em branco, se é uma brincadeira eu não entendi. - Tenta resolver a situação a senhorita Kinsey.

- Você não fez nada de errado Dane, eu é que preciso pedir desculpas por lhe fazer perder tempo comigo aqui. - Relata o apático Marcus apoiando suas mãos sobre a mesa e suspirando de cabeça baixa.

Dane se levanta, apoia a mão sobre o seu ombro e pede:

- Conte o que está acontecendo, deixe-me tentar ajudar. Já acreditando que há algo sério por trás de tudo aquilo.

Marcus se vira, segurando a mão que desce lenta em frente ao seu peito. Leva-a até a boca e a beija como se fosse a última vez. Um sorriso regado com lágrimas repletas de preocupação nasce em Dane. Mesmo sem saber o que está acontecendo sente que hoje algo se perdeu, ou pior, que presenciou uma esperança morrer.


O Livro (Lizandra's Book)Where stories live. Discover now