33. Nosso Povo.

6.3K 657 124
                                    




          𝓢egurei a risada quando Liam deslizou a tigela de miojo em minha direção. Mesmo que houvesse pensado que o menino daria um de Master Chef Kids, fiquei feliz por partilhar uma refeição com ele. Liam se sentou de frente para mim e logo deu uma garfada em seu macarrão, fazendo Darkless franzir o nariz para a comida. Foi então que me dei conta de algo. 

— Espere… Vampiros comem? 

— Bom, a maioria come até a adolescência e depois para, mas poderia continuar pela vida toda, se quisesse. Apesar de não nos sustentar, ainda sentimos o gosto das coisas, principalmente as doces. — Darkless deu de ombros. — Mas comer mesmo é desnecessário. 

Assenti enquanto comia uma porção de macarrão e Darkless levantou, sumindo pela porta da cozinha. Alguns instantes depois, ele retornou com duas latas de refrigerante e as colocou sobre a mesa. Sorri feliz ao ver a Coca-Cola. 

— Isso, — Apontei para a lata que tinha acabado de abrir. — É a melhor coisa do mundo. 

Liam concordou, sorrindo de orelha a orelha. Pude ver afeição brilhar nos olhos de Darkless ao olhar para o menino e rapidamente ele voltou a cozinha. 

— Coca-Cola é delicioso. — Liam sorriu. — Meu pai sempre compra várias latas e deixa na geladeira. É a única coisa que ele consome além de sangue, mesmo que raro. 

— É a melhor bebida do mundo. — Concordei. — Do que mais você gosta? 

Nesse momento, Darkless voltou da cozinha, com uma taça alta de vinho em mãos. Pelo visto, coca-cola não era a única coisa que ele consumia além de sangue. O Mestre se sentou no seu lugar habitual quando Liam começou a falar em disparada sobre seus gostos. 

— Gosto de livros, são legais, me transportam para uma nova dimensão. E também, gosto de séries e filmes, são super divertidos, mas meu passamento preferido e prestar muita atenção mas cenas para ver se encontro algo errado. 

Terminei de mastigar a porção de miojo que havia posto na boca antes de responder. 

— Quais seus gêneros favoritos? 

— Ação! — O menino exclamou animado. — Tiros e carros! 

— Tipo Velozes e Furiosos? 

— SIM! — Liam gritou tão alto que vi Darkless se encolher na cadeira, ri baixinho. — São meus preferidos! 

— Imaginei que fossem. 

— Ah! Eu procurei no Google o significado daquela palavra que te perguntei hoje. 

Liam falou com tranquilidade e eu deixei meu garfo cair no prato. Darkless arqueou as sobrancelhas para meu espanto. 

— Qual palavra? — O Mestre perguntou depois de dar um gole no vinho. Quando o líquido se agarrou contra o cristal da taça, vi que também tinha sangue no meio. Meu estômago se revirou. 

— Meretriz. — Liam disse tranquilidade. — É uma mulher que exerce o ato de prostituição. Pesquisei o que era prostituição também, e vi que era uma pessoa que visa ganhar dinheiro por atos sexuais. Depois disso a Lizzie chegou, então depois do jantar pesquisarei atos sexuais. 

Eu engasguei e comecei a tossir alto, dando um gole no refrigerante para tentar controlar a crise. Todo o sangue sumiu do rosto de Darkless e pela primeira vez desde que lhe conheci, o vi sem palavras. 

— Liam Darkless. — O Mestre chamou com a voz baixa e séria. Vi o menino se endireitar na cadeira e observar o pai com os olhos azuis arregalados. — Você não vai pesquisar mais nada sobre esse assunto, entendeu? 

Pensei que Liam discordaria, já que parecia super interessado no assunto, mas o menino apenas suspirou e concordou com a cabeça. 

— Sim, senhor. 

Darkless pareceu satisfeito e eu lhe lancei um olhar desesperado antes dele secar a taça de vinho num gole só. Liam terminou de comer seu macarrão em silêncio, mas eu já não estava mais tão interessada em meu prato. Continuei alternando olhares entre o garoto e o Mestre, tentando adivinhar seus pensamentos, mas nenhum dos dois transparecia nada. Bom, Liam estava claramente chateado, mas seus olhos azuis estavam fixos em sua comida. Por fim quando terminou o miojo, Darkless tocou o braço do garoto e pude ver que tiveram uma conversa silenciosa, que durou um minuto inteiro. 

— Lizzie, foi um prazer jantar com você. — Liam disse num sorriso doce e se levantou de sua cadeira, rapidamente sumindo de vista. 

— O que você disse a ele? — Perguntei por fim. Darkless abriu um sorriso enviesado antes de se levantar e novamente ir em direção a cozinha. Dessa vez, o segui. 

— Disse que depois conversariamos sobre isso, quando ele tivesse idade para entender. E também disse que fazia isso para o bem dele. — O Mestre respondeu ao encher a taça até a metade com whisky, e depois, tirou da geladeira uma garrafa de sangue, que usou para completar o copo. Não era vinho, afinal. — Ele ficou chateado porque o repreendi em sua frente. Quando você tentou salva-lo, mesmo que ele tenha te salvo, despertou uma incrível adoração no menino. 

Acabei por rir. Realmente, ele tinha me salvo do híbrido, o que me fez lembrar do momento em que o matei. Eu sabia, sabia no fundo do meu coração, que era uma situação de vida ou morte, onde somente uma das partes poderia sair com vida, mas ainda assim, coisas como aquela deixavam marcas permanentes na alma e eu me flagrei sentindo culpa. Aquele homem provavelmente tinha uma família, pessoas que sentiriam sua falta, e ele estava morto por minhas mãos. 

— O que foi? — Darkless perguntou apoiando os cotovelos no balcão de granito, ficando bem próximo de mim. Respirei fundo. 

— Matei aquele cara. Mesmo que fosse eu ou ele, mesmo que fosse por Liam… Ainda assim… Ele tinha uma família, pessoas que sentiriam falta dele. 

— As pessoas que ele e o bando dele mataram, também tinham familiares que nesse momento choram em luto. — Darkless falou, dando um gole na mistura que tinha feito com Whisky e sangue. — É certo quando dizem que ao matar um assassino, o número de assassinos no mundo não diminuem, mas, quando você mata um assassino, o número de vítimas diminui, e isso é o que importa. Vi nas memórias de Liam quando você disse que respondia a mim, você escolheu um lado, e protegeu seu lado. Se não tivesse ali, Liam não teria o gatilho para enfrentar o híbrido, e mesmo se tivesse, não teria conseguido o segurar por muito tempo. Ele teria morrido quando sua influencia sobre o outro terminasse. Ao escolher um lado, você salvou a vida de Liam, e salvou mais pessoas do nosso povo que poderiam morrer pelas mãos dele. 

— Nosso povo? — Perguntei num sussurro. Darkless me olhou com intensidade, algo que não consegui indentificar brilhando em seus olhos. 

— Você responde a mim, e provou isso salvando meu filho. Então, nosso povo. — Darkless me encarou por um longo tempo enquanto suas palavras queimaram meu coração. Naquele momento, senti uma devoção tão grande e inexplicável por ele que meu peito doeu. Aos poucos percebia que sua crueldade se limitava àqueles que feriam seu povo, e que por mais distorcido que pudesse parecer, ele amava seu povo com toda sua alma, e faria qualquer coisa por eles. Isso me encantou. Um rei que não amava somente o poder, que não amava somente a coroa, mas que também amava os que jurou proteger. — Quer outra Coca-Cola? 

Fiz que não, e olhei para a garrafa de vinho no outro lado do balcão. 

— Talvez um pouco de vinh… 

Me interrompi quando ergui a mão para apontar para a garrafa e ela simplesmente voou em minha direção, não me acertando apenas porque os reflexos de Darkless foram mais rápidos e ele segurou a garrafa com tamanha força que a fez se quebrar em sua mão erguida, sujando nós dois de vinho. Sua expressão de choque era o reflexo da minha.

🥀

Sigam o caminho das rosas,
Elas lhe guiarão por essa jornada.

🥀

A Corte De Sangue - VAMPIRE HISTORY. | CONCLUÍDOWhere stories live. Discover now