O caminho segue com muitas clareiras, aglomerados de árvores e arbustos diversos, é bem parecido com as florestas do meu mundo eu diria.
— Achei que as florestas eram cheias de fadas e criaturas diferentes — Comento meio extasiado.
— Quando os feéricos chegaram a este mundo descobriram que ele era quase uma cópia do seu. Com a magia dos feéricos ele foi ganhando mais vida e diversidade de espécies, então não se engane com essa semelhança pois logo será surpreendido com algum gnomo roubando seus sapatos — Araevin diz sério com um pouco de ódio nas últimas palavras.
— Onde vamos encontrar civilização no meio desta mata ?
— As fendas não resolvem simplesmente nascer perto de casa se é o que você estava pensando. Nós estamos indo até uma pequena estação de pouso onde eu espero encontrar Darios para que possamos ir a Sétima capital Garzag. — Fala Araevin sereno.
— Darios é o nome do seu jatinho ? — Curioso alguém como ele por nome em um veículo.
— Está brincando ? Darios é meu Grifo — Araevin diz exibindo um sorriso.
— Espera você disse Grifo ? Aquelas criaturas dos livros com asas e garras ?
— Sim — O sorriso parece crescer e fica mais radiante... mais bonito. Araevin provavelmente se lembra de seu animal.
Eu estou sem chão, ele acabou de dizer que tem um Grifo e que ele vai nos levar até uma capital, e que provavelmente será voando ou a coisa não estaria em uma "estação de pouso", estou apavorado e ansioso também pra ver com meus próprios olhos.
— Aqui não tem aviões, carros essas coisas ? — Pergunto curioso.
— Tsc — Faz com a língua *(som de desagrado, desgosto, desaprovação, desdém) — Toda tecnologia que vocês tem não funciona aqui por causa da magia presente em todo canto, tenho certeza que sente isso. Você vai ver apenas civilizações simples que evoluíram junto aos humanos até antes deles criarem tanta tecnologia. Pense como uma era medieval.
— Entendi. — falo pensativo.
Então eles vivem em algo parecido com a idade média. Considerando que são seres sobrenaturais capazes de manipular forças mágicas parece simples viver em pequenas civilizações. Ou o segredo para serem felizes.
— Vamos passar a noite aqui. — Diz Araevin parando de frente uma clareira em meio à mata fechada. O sol passa por entre as folhas das árvores formando uma vista incrível do local.
— Mas ainda é dia. — Falo olhando o sol, devem ser umas cinco da tarde.
— Não importa, passaremos a noite aqui — Repete ríspido.
Araevin começa a juntar pedaços de galhos e pequenos troncos pelo chão e eu logo começo a ajudar, certamente irá fazer uma fogueira. Na segunda remessa de madeira vejo algo no fundo da mata que me chama atenção, é um amontoado de frutas no chão. Olho para trás e não vejo Araevin então sigo em frente me aproximando, quando chego mais perto me concentro no cheiro daquelas frutas e nos sons a minha volta. São apenas pêssegos, mangas, bananas e uvas ali como se fosse uma... ISCA. Começo a me afastar calmamente olhando para os lados, *O que será que isso está fazendo aqui ?, será que é Araevin pregando uma peça?* logo sinto colidir em minhas costas uma superfície firme, meu coração para pois não tinha nada atrás de mim agora pouco, começo a virar o rosto e me deparo com a cara fechada de Araevin.
— Filho da mãe você quer me matar de susto ? Como eu não te ouvi? E seu cheiro como eu não senti ? — Pergunto me afastando com um pulo.
— Eu sou experiente e você é só uma criança — Diz Araevin com um olhar estranho, ele parece contente com a situação super constrangedora pra mim. — Agora saia de perto da Isca.
— Onde conseguiu essas frutas ? E é uma isca para o que ?
— São uma ilusão que eu criei com um feitiço e são para capturar o que chegar nelas primeiro — Araevin diz me encarando com um sorriso irônico.
Saio de perto da isca e sento perto do monte de lenhas, logo me lembro que vamos dormir ali mas não tem nada além de árvores. Droga terá de ser no chão no meio do nada com um cara super estranho.
A noite chega e eu só percebo que Araevin não está ali quando o vejo chegando da direção onde aquela isca estava, traz nas costas dois peixes enormes. *Peixes ?, penso*
— Como aquelas frutas pegaram dois peixes ? — pergunto sem entender.
— Não foram das iscas, eu fui até um lago e os peguei. — Diz e emite uma bufada de puro ódio.
Rio por dentro, então esse cara durão não consegue sucesso em tudo o que faz.
Araevin junta um pouco de lenha e espeta os peixes em galhos finos, logo noto o que falta então com um rápido olhar envolta consigo encontrar dois gravetos com um "V" na ponta, os cravo no chão um do lado do outro com a fogueia no centro.
— Bom trabalho agora acenda a fogueira. Araevin aponta o queixo para o amontoado de lenha.
— Como acha que eu vou fazer isso ? — Pergunto espantado.
— Sua magia é puro fogo, acenda a fogueira.
— Mas eu não sei como fazer isso cara. Por que você não faz ?
— A minha magia não é do elemento fogo — Diz simplesmente.
Eu não tenho ideia de como fazer mas tenho que tentar né, talvez seja fácil. Direciono minha mão direita para fogueira e me concentro na ponta dos meus dedos, ali se passam 15 segundos e eu não sinto nada acontecendo.
Araevin suspira.
— Respire fundo e imagine a sua magia, pense nela dentro de você então pense nela saindo de você. — Diz Araevin com um tom mais calmo.
Imagino um reservatório com um conteúdo verde dentro. Sinto algo se acendendo calmamente acordando em meu corpo então continuo a me concentrar. Meus dedos começam a esquentar e liberam uma chama verde, me concentro mais imaginando cada vez mais então a chama cresce e acende a fogueira depois o fogo e minhas mãos se apaga de súbito. Me sinto maravilhado e decepcionado por ter feito tanta força pra quase nada.
— Parabéns, o que você acaba de fazer leva meses de treino em feéricos adolescentes com a magia recém desbloqueada. — Araevin encara o fogo que cresce.
— Obrigado, eu acho — Falo surpreso com a informação.
Não demora muito e o peixe está no ponto, acho incrível comer no meio do mato, não dispensaria um jantar de Aurora por nada mas isso aqui nessas condições está sendo legal pra mim. Como um acampamento. Comemos e Araevin se deita na base de uma árvore bem próxima, me deito também.
O céu está incrivelmente limpo, não tinha sinal da lua, apenas o brilho das estrelas no céu. Adormeço.
~
A luz forte do dia incomoda minha visão. Acordo e olho para os lados, não vejo Araevin, a fogueira está apagada e ao lado dela o chão perecia chamuscado em um círculo, observo aquilo curioso. Então me levanto. Não arriscarei procurar Araevin pois tudo o que eu menos quero é me perder e tenho certeza de que ele ficaria furioso se não me encontrasse aqui.
Alguns minutos depois Araevin aparece comendo uma maçã com uma mão e com a outra ele segura mais duas. As joga antes de chegar até mim e com um movimento rápido eu as pego no ar.
— Por que não me acordou? Eu sei o que é uma maçã e poderia ajudar a procurar. — Falo mordendo a maçã que por sinal está suculenta.
— Não quis interromper o sono da princesa — Diz com um sorriso então faz uma pequena reverência.
Solto um xingamento feio e sorrio também.
— Você percebeu o que fez de madrugada ?
Fico vermelho, será que eu fiz algo errado ou disse algo ? Faço que não com a cabeça e Araevin fica sério.
— Era tarde e eu notei que a fogueira já devia ter apagado. Abri os olhos e vi uma esfera de fogo verde flutuando ao lado da fogueira mantendo tudo em sua volta aquecido. — Araevin parece surpreso.
— Quer dizer que agora enquanto durmo esferas de fogo saem flutuando por aí ? — Digo com uma expressão preocupada, o que esconde minha empolgação, Eu fiz fogo!
— Eu não sou um especialista em magia de fogo
— A sua magia é de que ?
Ao me ouvir Araevin me observa, sinto algo gelado percorrendo meu corpo então um vento começa a soprar forte, tudo fica frio muito frio. Ao redor de Araevin a grama começa a congelar e morrer então o chão todo em nossa volta se cobre com gelo e neve. Meu corpo se esquenta novamente e o mais estranho é que o gelo não havia sumido.
— Gelo? — Pergunto e ele apenas confirma com a cabeça. — Você é o oposto de mim. Tem muitos feéricos com magia de fogo ? — Pergunto curioso, quero conhecer as pessoas que sabem manipular essa magia.
— Os manipuladores de magia do fogo e da luz reduziram a quase zero depois que os feéricos saíram do seu mundo. Fora alguns que já se extinguiram. Por algum motivo quase não nascem feéricos com essa característica. Hoje com você só existem três. — Conclui com certa tristeza na voz.
— Quem são os outros dois ?
— Um dos mestres da capital e alguém que você nunca vai conhecer. — Diz ríspido, afastando um pensamento. — Agora vamos andando.
Não devo fazer mais perguntas, aparentemente esse terceiro feérico é alguém especial para Araevin. Enfim eu me deparei com mais uma característica única, quem sabe esse tal mestre possa me ajudar.
~
Algumas horas andando chegamos a uma encosta, logo embaixo bem distante tem uma casa grande e ao lado uma enorme rocha redonda com desenhos no centro, igual a um heliporto. Atrás desta rocha tem também um galpão grande com um portão fechado.
— É ali ? — Pergunto.
— Sim, vamos. — Araevin parece estar ansioso pra chegar lá.
Corremos muito rápido e eu até me assusto com tamanha resistência física em correr tanto e não me cansar nada, Araevin também não parece cansado.
Parece estar vazio. Araevin bate na porta da casa enquanto eu observo o galpão, será que lá estava o tal Grifo?
A porta não se abre então Araevin apenas se senta em um banco do lado da porta e fica observando o nada.
— Vai esperar quem mora aí chegar ?
— Sim
— E o Grifo ?
— Se estiver aí pode esperar mais algum tempo. — Diz sério enquanto observa o galpão.
Me concentro em escutar os sons a minha volta afim de ouvir algo vindo do galpão. Não ouço nada além do ranger dos portões e o vento assobiando dentro do galpão. Se há algo ali está muito quieto.
Alguns minutos depois setado nas escadas escuto um som estridente, algo como um grunhido animal vindo de muito longe.
— Você ouviu ? — Pergunto olhando para Araevin.
— O que ?
— Aquilo — Digo apontando um borrão preto muito muito longe de nós que se aproxima rapidamente.
— Darios. — Araevin diz com um sorriso.
~