The Real Side

Autorstwa hiddles-evans

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Segredos e mentiras fazem parte do nosso dia-a-dia. Em alguns momentos, simplesmente mentir ou ocultar fatos... Więcej

Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36¹
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 40

Capítulo 39

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Autorstwa hiddles-evans

Sons aleatórios preenchiam seus ouvidos, que não condiziam com a pouca informação que conseguia pegar no ar que a cercava. Prestando um pouco mais de atenção, ela conseguiu distinguir o ruído de folhas secas sendo esmagadas, sons de disparos, alguns gritos e o som de seu batimento irregular ecoando em seus ouvidos. Um choro alto foi o que fez com que Avril voltasse a ter controle sobre seu corpo, tentando se sentar em um movimento rápido, mas falhando por algo a segurar.

O ambiente estava quase que por completo escuro, com exceção das máquinas que monitoravam pacientes, e a luz forte do corredor do prédio que mal entrava no quarto. Entre as coisas que a mantiveram no lugar, estava o tubo que conectava o acesso em uma de suas veias à bolsa de soro, os diversos eletrodos que monitoravam seus batimentos cardíacos, e o musculoso braço de alguém.

- Avril, sou eu. Steve – se apressou uma voz próxima a dizer, a segurando firmemente contra o colchão, sua respiração também descompassada pela movimentação repentina. Quando a mulher fechou os olhos e voltou a depositar a cabeça no travesseiro, o soldado arriscou olhar para o outro lado da cama, encontrando um arqueiro praticamente desmaiado, dormindo até de boca aberta. Steve até chegou a sorrir descrente. Sabia que ele não ia aguentar mais ficar acordado por muito tempo – Você está em casa. Está tudo bem.

- Pete...? – disse ela com a voz engasgada, fraca e falha pelo que deveria ter sido alguns dias sem uso.

- À sua esquerda. Pai à direita.

- O que aconteceu com Tony? – perguntou a mulher um tanto desesperada, sem saber para que lado olhar. À sua esquerda, ela encontrou o irmão dormindo tranquilamente em outra maca, com Clint em uma situação parecida em uma poltrona para visitantes. De seu outro lado, atrás da poltrona de Steve, seu pai dormia abraçado a um travesseiro, sem nenhum tipo de aparelho ligado a seu corpo, diferente dos mais novos da família.

- Você quase morrendo de novo? – arriscou Steve rindo, embora sua voz não tivesse nenhum humor. Ela sequer precisava se esforçar para identificar o cansaço em seu timbre, ele estava exposto em seu rosto – Ele não tem mais o reator no peito, Av. Você está testando o coração dele e ele não pode mais trocar as baterias. Você está ficando muito boa em matar a gente de susto.

- E os imprevistos estão ficando cada vez piores – acrescentou ela, forçando as palmas das mãos no colchão fino para se sentar, logo sendo repreendida pelo soldado.

- Av, fica deitada...

- Há quantas horas vocês estão aqui?

Steve olhou rapidamente para o relógio, tentando calcular algum espaço de tempo que não o deixasse em problemas, mas os números sequer fizeram sentido para ele no momento. Seu cochilo nos últimos cinco minutos não havia ajudado em nada o seu estado.

- Algumas...

- Vai para o quarto, dormir um pouco para variar. Vocês dois – ordenou Avril, se inclinando para dar um tapa de leve no ombro de Clint, que acordou sem saber o que acontecia – Eu cuido deles. Eles são meu problema, afinal das contas.

- Você precisa de cuidado também, Av – argumentou Steve, com as perguntas confusas do arqueiro de fundo sonoro.

- Preciso saber que todo mundo está bem, e isso inclui vocês. Podem negar o quanto quiserem, sei que os dois estão há dias sem dormir direito – insistiu ela, e Clint foi o primeiro a se dar por vencido, suspirando alto antes de se levantar da poltrona que ele temia já ter se tornado parte de seu corpo – Por favor, vão descansar.

- Ouviu a garota, Capitão – brincou o arqueiro, se debruçando sobre a cama para beijar o rosto da mulher enquanto afagava seus cabelos completamente fora de ordem e cheios de nós – Bom te ver acordada, para variar.

Avril resmungou um "engraçadinho" antes do homem se afastar, esperando Steve no corredor vazio, já que imaginava que ele fosse enrolar o máximo possível para obedecer a ordem da mulher. Ele tentou convencê-la com os olhos para permitir sua presença, mas ela estava decidida. Na verdade, a cada segundo a mais que passava olhando para o soldado, mais certeza tinha de que ele precisava de um tempo afastado, de um pouco de sono em um local mais adequado. Um tanto incerto, Steve se debruçou sobre a maca da mulher quando se levantou, depositando uma mão com cuidado sobre sua nuca, em um toque tão delicado que Avril chegava a questionar se realmente existia. Mesmo assim a hesitação estava muito bem expressa em seus movimentos, até mesmo quando seus, lábios encostaram de leve na testa agora sem machucados da mulher, que apenas pode sorrir com o gesto. Quando se afastou sem pressa, Steve ainda buscou um sinal de que ela desistira da ordem, suspirando vencido e deixando os ombros caírem quando Avril murmurou um calmo "boa noite".

- J.A.R.V.I.S.? Como está o resto da equipe? – perguntou Avril, assim que Steve deixara o quarto, e ela voltou a se deitar.

- Os únicos comprometidos em combate foram você e o Sr. Ivanov. O Sr. Stark apresentou problemas com ansiedade no trajeto e assim que retornaram à Torre. O restante da equipe está sob as melhores condições que a situação permite.

- Todo mundo uma pilha de nervos? – arriscou a mulher.

- Acredito que se pode dizer isso, senhorita.

- Pode avisar para o Barton e para o Rogers que se eles não forem para seus respectivos quartos nesse exato momento, eu vou subir e arrastar os dois? – pediu ela, a voz mais abafada ao se virar de costas para tentar ajeitar seu travesseiro, que agora mais parecia uma pedra de tão desconfortável.

- O Sr. Barton pediu que eu ressaltasse que você não deveria estar utilizando seus poderes, senhorita.

- Não estou. Só sei que os dois idiotas não iriam me obedecer logo de primeira – suspirou ela cansada, olhando para todos os fios que a ligavam a máquinas, outra fonte de desconforto – Chame uma enfermeira, por favor. Esse monte de coisa ligada em mim está começando a me irritar.

Não demorou muito para que uma das enfermeiras de plantão entrasse no quarto, lhe enchendo de perguntas que ela sequer lembrava das respostas que dera. Algumas talvez fossem pelas mentiras para que fosse liberada da monitoração, e Avril se agradecera mentalmente por ter insistido em expulsar Steve do quarto, ou teria sido descoberta. Ela até conseguira tirar um cochilo considerável depois de um tempo, acordando mais tarde com aquela sensação ruim no peito de que as coisas estavam prestes a desandar e tudo que ela podia fazer era observar. Maldito estresse pós-traumático. Uma fina cama de suor já frio cobria seu rosto, e somado à boca seca, Avril se viu obrigada a se levantar para pegar água.

Demorou mais do que ela se orgulhava para sentir firmeza em suas pernas, para garantir que elas não iriam simplesmente ceder assim que deixasse de apoiar seu peso na maca, e demorara ainda mais para se arrastar até o armário onde duas jarras de água fresca estavam. Até que o corpo de Avril estava dando uma boa resposta, todos os músculos obedecendo a seus comandos – até ela tentar segurar a alça da jarra e seus dedos moles deixarem que ela tombasse na bancada. Fosse o barulho da jarra caindo ou Avril praguejando baixo, mas a movimentação despertara um dos pacientes do quarto, que acordara agitado.

Tony murmurava pedidos de ajuda desesperados, tentando se livrar do lençol que o envolvia e apenas se enrolando ainda mais.

- Ei, respire. Devagar – pediu ela com calma, deixando a mão apenas apoiada no ombro do homem. Ele ainda se debatera mais algumas vezes até localizar a fonte da voz, sentindo dificuldades para identificar o rosto no ambiente com pouca luz – Não queria te acordar, desculpe.

- Voc...? – ofegou Tony ao reconhecer a filha, começando a perder o controle de sua respiração – Eu estou alucinado?

- Sério mesmo? Se fosse para me imaginar, você me imaginaria assim? – brincou Avril, puxando a poltrona que Steve usara mais cedo para perto da maca – Parecendo uma morta viva e com a bunda de fora? Já disse que odeio camisola de hospital?

- Minha mente não parece gostar exatamente de mim, não seria nenhuma surpresa.

- Disso eu entendo muito bem... – resmungou ela baixo, rindo antes de pegar a mão fria do pai entre as suas ainda machucadas – Como você está?

- Não dando a mínima, quero saber como você está – retrucou Tony, a afastando um pouco para se sentar no colchão fino.

- Ainda estou respirando, então já é vitória.

- Como está seu irmão?

- Não acordou ainda, mas vai sobreviver também.

- Krigor?

- Não perguntei – Tony estranhou em um primeiro momento a resposta da filha, mas logo notou que ela estava sendo sincera – No momento ele é problema de outra pessoa. Tem um limite de pessoas com quem eu consigo me preocupar no momento, e os dois estão aqui.

- Você quase me matou de susto.

- Ajuda se eu disser que eu também fiquei bem assustada? – brincou ela incerta.

- Na verdade, nem um pouco. Mas já passou – desconversou o homem, jogando as pernas para fora da maca para ficar de frente para a filha, tomando seu rosto em suas mãos – Agora temos que nos focar em recuperar o cetro, e estabilizar você e Petr. Quão estranho seria se eu adotasse um cara de trinta anos? Facilitaria muito as coisas.

- Se você sugerir isso para ele, é capaz que ele acabe te dando um soco.

- Nós melhoramos um pouco no quesito ódio nos últimos tempos...

- Sério mesmo? – Avril questionou brincando. Nas últimas semanas havia notado a mudança na dinâmica entre os dois. Na verdade, apenas queria ouvir o pai admitindo aquilo.

- Ele não é tão ruim assim – confessou ele com um suspiro, um vestígio de sorriso travesso aparecendo no canto de seus lábios – Para falar a verdade, ele é mais agradável do que você.

Avril revirou os olhos brincalhona, rindo em descrença.

- Vá em frente e diga que você queria um menino.

- E por que eu iria querer um menino? – Tony se fingiu de desentendido, buscando seus sapatos que se lembrava de Steve ter deixado em algum lugar próximo – Você sabe que eu não queria nenhum.

- Me sinto tão amada quando você diz isso...

- Mas eu tive o que eu precisava: uma criança teimosa que me fez e ainda me faz querer sempre ser melhor por ela – concluiu ele, beijando sua testa com o som do riso baixo dela de fundo.

- Você está convivendo demais com o Steve – comentou dela depois de devolver o beijo no rosto, reclamando baixo em seguida pela barba por fazer a pinicando – Esse é o tipo de clichê que ele diria.

- Acha que Steve seria um pai como eu? – a pergunta lhe escapara antes mesmo de entender o que fazia. A ideia o incomodou mais do que admitiria, mas o problema era Avril se sentir pressionada por aquilo.

- Todo excesso é perigoso, Tony. Imagine eu crescendo sob a guarda de alguém tão rígido como Steve. O resultado seria o mesmo – respondeu ela, sem parecer dar importância ao tópico – E o mais importante: eu nunca te trocaria, você é meu pai. Não importa toda essa zona familiar, mesmo que não fossemos parentes de sangue. Você é meu pai, e isso nunca vai mudar.

- Você não está esperando que eu diga aquela palavra com a, certo? – Tony brincou, tentando disfarçar a leve fungada que deu. Avril logo estava no mesmo estado que ele, revirando os olhos marejados divertida enquanto mordia o lábio.

- Não acreditaria se você dissesse.

- Mas é verdade – ele se apressou em dizer, a ponta dos dedos percorrendo as leves marcas de ferimentos no rosto da mulher, que deveriam sumir nas próximas horas – Mais do que tudo nesse mundo.

- Eu também – sussurrou Avril com a voz um tanto engasgada, se pondo de pé para abraçar o pai. Tony continuava não sendo o maior fã de abraços, mas daquela vez ele não reclamou, pelo contrário. Depois de todos os sustos que levara nos últimos meses, em especial o dos últimos dias, tudo que ele queria era tê-la na proteção dos seus braços. E perceber que ela estava tão assustada quanto ele não ajudava em nada no quesito manter o controle. Mas estava tudo bem agora, aquilo era passado.

Não havia mais ameaças.

---

Depois de muita discussão e gritaria, Avril ganhara aquela briga.

Quando pararam em um hospital próximo para estabilizarem o quadro dos irmãos abatidos, Krigor foi entregue para a OTAN, onde estava encarcerado. O problema era que ele apenas abrira a boca uma vez, e foi para dizer que apenas responderia aquelas perguntas se elas fossem feitas por sua filha, e pessoalmente. Tony ficou irado ao receber aquele vídeo, principalmente por aquele homem ainda ter a audácia de chamar Avril de sua filha, gritando aos quatro ventos que não existia a menor possibilidade de concordarem com aquela exigência. Avril por sua vez concordou sem pensar duas vezes, o que transformou o que era para ser uma reunião da equipe em uma discussão familiar, onde a única mulher ficou sozinha, já que nem Petr concordara com a ideia.

Algumas horas mais tarde e depois de muitos argumentos que foram simplesmente ignorados, Avril e Steve estavam em uma nave a caminho da prisão da OTAN. Eles precisavam da colaboração de Krigor, e, se ele queria um interrogador mais qualificado, era o que ele teria. Era até mais aconselhável ser ela e não o irmão, já que Petr não era o mais bem controlado dos dois quando o assunto era família, e Avril conseguia se manter um pouco mais indiferente do que ele.

O som do salto de suas botas e do solado pesado do coturno de Steve eram as únicas coisas que ecoavam pelo corredor. Nenhuma palavra a mais foi trocada desde que receberam instruções antes de a entrada deles ser permitida, ambos ocupados com seus próprios pensamentos. Steve não poderia entrar na sala de interrogação junto com ela, acompanhando toda a conversa assim como os Vingadores, por vídeo. Fora um pedido da própria Avril, já que não lhe agradava muito fazer um interrogatório com a sala cheia, além de que não tinha nada que Krigor pudesse fazer para a atingir.

Pelo menos era nisso que ela queria acreditar.

Krigor tinha ambas as mãos algemadas à mesa quando ela entrou na sala. Embora já estivesse lá por mais de uma semana, ele parecia estar perfeitamente bem, como se ainda fosse o líder da organização, onde nada o atingia. Avril engoliu em seco, se sentando a sua frente, deixando o tablet com o roteiro de perguntas na mesa antes de se sentar, lhe mostrando um sorriso contente e cruel assim que já estava acomodada.

- O uniforme de prisioneiro te cai bem... – comentou ela – Deveria ter tentado esse visual mais cedo.

- Não vou mentir, não esperava que você fosse atender meu pedido, criança – suspirou o homem, seus olhos gélidos parecendo querer invadir sua alma, mas falhando. Não, ela sabia exatamente como lidar com ele agora.

- E perder a chance de te ver sem nada? – riu a mulher, seu sorriso se alargando – Estava à espera disso há meses, tinha que ver pessoalmente.

Krigor assentiu em concordância algumas vezes antes de erguer o olhar para ela.

- Bem, você disse que entregaria as informações se eu viesse, estou esperando – avisou ela, seu cenho franzindo quando o homem começou a rir com vontade. Se ele não tivesse recursos ali, Avril poderia jurar que ele ainda tinha alguma carta na manga – Por que está rindo?

- Me deu vontade – respondeu ele cínico, e a mulher revirou os olhos.

- Mentira.

- Sua mãe deve estar orgulhosa de você – começou Krigor de repente, parecendo deixar o assunto anterior de lado. Ela só não sabia que ele estava falando da mesma coisa – Acredito que você tenha seguido todos os passos que ela planejou.

- Eu diria para você perguntar para ela, mas espero que tenha uma vida longa nesse buraco – debochou a mulher, seu sorriso irônico permanecendo em seu rosto assim como Krigor desejava.

- Ela está sempre te observando, meu amor – continuou ele, voltando a rir de leve ao notar a expressão da enteada se tornando aos poucos mais confusa – Comigo fora do jogo, não estranharia se ela fizesse uma aparição.

- Você está chapado? – questionou ela, séria – O que estão te dando aqui?

- Sua mãe é esperta, mas é sentimental demais – continuou ele, ignorando por completo Avril que continuava perdida. Em seu ouvido, Tony pedia que ela retomasse as rédeas do interrogatório, já que começava a se irritar pela filha estar deixando ele livre para falar o que quisesse – Não me surpreenderia em nada se ela escolhesse aparecer no seu aniversário de novo.

- Nossa, uma semana preso e você já perdeu a sanidade.

- Sua mãe está viva, coração – concluiu Krigor – Mais viva que eu e você, provavelmente.

- Sério? – disse ela cínica.

- Acha que estou mentindo? – constatou ele, rindo ao ter sua confirmação nos olhos inexpressivos da mulher. Ela estava se forçando a não acreditar no que ele contava, era tudo que ele mais queria.

- Eu sei que está – retrucou Avril, sua irritação começando a ficar evidente – Sou um detector de mentira, esqueceu?

- Então você está apresentando defeito porque não estou mentindo.

- O Soldado Invernal a matou.

- Você deveria saber melhor do que confiar em alguém que passou por todos aqueles processos... – o forte tom de conselho e sarcasmo na voz de Krigor fez com que Avril perdesse um pouquinho a cabeça, algo que seu próprio pai percebeu, já que voltou a despejar ordens em seu ouvido.

- Não muda o fato de que você está mentindo – disse ela por fim, encerrando o assunto – Vim aqui para você me passar informações úteis, não para perder tempo. Tenho coisas mais importantes para fazer.

- Em alguns momentos eu entendo o motivo por ela ter te escolhido, embora não saiba dizer como que ela pôde prever isso tudo... – continuou ele, claramente a ignorando – Petr não é como você. Ele não teria como continuar o que ela começou.

- Você acha que eu que eu me importo com Valerik? Com o legado dela? – a mulher finalmente explodiu, se pondo de pé e espalmando as mãos na mesa com um estalo alto – Eu não quero saber se ela mudou de ideia no meio do caminho, se queria tirar Pete e eu das suas mãos. Foi ela que me colocou nesse inferno. Além de ter colocado meu pai em constante perigo por me deixar sob a proteção dele. Você acha que eu me importo com uma dessa assim? – seu tom de voz mudou drasticamente, diminuindo para algo um pouco mais alto que um sussurro – Então você não sabe merda nenhuma sobre mim. Ela só não é pior do que você. Provavelmente vocês se mereciam, formavam um bom casal.

- Você parece com ela mais do que pensa – replicou Krigor, sem parecer ter se abalado com a fúria da enteada. Avril apenas riu em deboche antes de se jogar de volta em sua cadeira.

- Em que momento eu disse que eu era uma boa pessoa?

- Ah, eu nunca ousaria dizer algo parecido com isso... – esclareceu ele, se debruçando levemente sobre a mesa para encarar a mulher mais de perto, seu olhar falsamente intrigado – Me diga, Stark: como é colocar seu uniforme de Vingadora com tanto sangue inocente nas mãos? Sangue de amigos, não é? Você não é digna do título que carrega, mas sim do título que se recusa a aceitar.

Foi visível Avril engolindo em seco, tentando manter a postura firme e determinada, e conseguir notar aquilo apenas deixou Krigor mais satisfeito. Ele estava ali, sem HYDRA e seus brinquedos favoritos, algemado a uma mesa, e ele ainda podia facilmente controlar a garota. Não, melhor: até mesmo com sua mente livre de mecanismos e em perfeito estado, ele ainda sabia como operá-la.

- Se estamos em um mundo de heróis e vilões, acho que você precisa ter certeza se está na categoria certa – aconselhou ele, voltando a encostar suas costas na cadeira, o sorriso divertido nunca abandonando seu rosto. Avril franziu os lábios e ergueu levemente as sobrancelhas, ponderando qual seria seu próximo passo.

- Você não tem nenhuma informação útil, não é?

- Já disse tudo o que você precisava saber.

No mesmo instante, Avril voltou a espalmar as mãos na mesa, mas agora em um movimento muito mais delicado e silencioso, se levantando em seguida. Aquela viagem fora apenas perda de tempo. Krigor provavelmente sequer tinha alguma informação valiosa, apenas queria brincar um pouco mais com sua mente, e o pior era que ele conseguiu. Sem trocar mais nenhuma palavra com o homem, ela apertou o botão no tablet que lhe fora entregue para que a porta fosse aberta e abandonou o aparelho sobre a mesa, passando pelo portal sem pensar duas vezes.

Ela planejava deixar suas costas contra a fria porta de metal assim que ela se fechasse quando saiu a sala, mas suas pernas não a obedeciam. Na verdade, nenhuma parte de seu corpo estava a respondendo. A mulher apenas parou quando encontrou a parede oposta à porta, deixando seus punhos pressionados contra o concreto, assim como sua testa. Sua respiração agora estava desregulada, e, se não controlasse, logo ela desmaiaria. No fundo, talvez fosse aquilo que Avril acreditava precisar: desligar, preferencialmente por tempo indeterminado.

- Eu não consigo... Eu não consigo...

- Avril, o que aconteceu? – perguntou a voz de Steve no fim do corredor, com claros sinais de que ele tinha corrido até ali, o que significava que logo oficiais do prédio apareceriam para devolver Krigor a sua cela. Embora não soubesse o motivo, já que pelo vídeo de segurança por onde acompanhara não parecia que Krigor tivesse feito algo, o soldado com facilidade notou que ela estava passando por um ataque de pânico. A morena repetia as mesmas palavras repetidas vezes com o mesmo tom de voz, seu corpo inteiro tremia, e seus músculos todos tensos e travados. Quando finalmente a alcançou, ele parou a alguns passos de distância – Av, preciso que fale comigo. Preciso que me diga o que aconteceu para eu te ajudar.

Sua vontade era tomar a mulher em seus braços, mas sabia que seria perigoso, não para ele, que pouco se importava com os possíveis ataques que sofreria, mas por Avril, já que podia acabar a assustando mais e a deixando mais instável. Um dos guardas logo apareceu perguntando se estava tudo bem, e Steve apenas pediu mais um segundo para que pudesse acalmá-la e removê-la do corredor, já que nem por cima de seu cadáver iria permitir Krigor vê-la naquele estado.

- Eu não consigo mais... – ela continuava a repetir, cada vez mais baixo e com mais desespero – Não consigo mais fazer isso... Não consigo mais...

- O que Krigor te fez, Av?

- Não foi ele, fui eu! – grunhiu ela, com as mãos trêmulas próximas ao rosto, finalmente se virando para ele, o rosto contorcido em uma expressão sofrida e lavada por lágrimas – É sobre o que eu fiz.

Ignorando as ordens de Natasha para não se aproximar mais ainda, Steve extinguiu a distância entre eles, travando os braços ao redor da mulher, que surpreendentemente não tentou o afastar, embora também não tivesse retribuído o abraço. Avril permaneceu naquela posição travada, os braços presos entre ela e o soldado. O máximo de movimento que ela conseguiu fazer foi apoiar a testa em seu ombro protegido pela jaqueta grossa.

- Eu matei, e-eu...

- Você estava sendo controlada – Steve tratou de interrompê-la logo de cara, apenas para ouvir uma risada desacreditada enquanto ela se afastava minimamente para poder fitar seu rosto. A mataria dizer aquilo vendo o desapontamento logo nos olhos dele.

- Não, eu não estava – corrigiu ela, seguida por uma risada sem humor engasgada. No mesmo momento Steve ficou mais sério, e ela sequer precisava analisá-lo para saber que ele estava questionando mais uma vez seu posicionamento naquela história toda, assim como ela – Eu não recebi ordens para metade das atrocidades que eu fiz. Eu matei, recrutei crianças... E entregava para o Strucker como cobaia para os experimentos dele. Eles nunca me pediram nada disso. Eu ainda não tinha recuperado memórias o suficiente para entender a outra personalidade, mas isso não importa. Isso já estava dentro de mim, desde o começo... E eu fiz tudo porque eu queria! – naquela pausa, Avril optou por fechar os olhos. Não conseguia mais manter o contato visual quando era tão visível como ela não era a única ali sofrendo. Steve não tinha nada a ver com aquela história, e ela estava o arrastando junto. Aquilo era errado – Não é algo que eu consigo mais ignorar. Eu matei amigos, matei pais em frente de seus filhos, e se a criança não aceitasse vir comigo, eu também a matava. Eu não consigo mais...

- Av... – Steve tentou intermediar, mas não teria prosseguido mesmo que a mulher não tivesse o cortado. Aquele tom de pena na voz, ele sabia que Avril não o aceitaria, que não era digna daquilo. Com cuidado, o soldado tirou os braços de ao redor dela, levando suas mãos até o rosto excessivamente corado, tirando os vários fios que grudaram em sua pele pela confusão de suor e lágrimas.

- Não dá mais... Não consigo continuar com isso... Eu não consigo enfrentar um inimigo e me defender quando sei que dizer que mereço uma bala na testa é pouco – desabafou ela com seu olhar baixo, só então percebendo como seus dedos se agarravam com desespero a camiseta de Steve – Eu cansei de fingir ser alguém que não sou mais, aceitar uma redenção que sei que não mereço. Não consigo continuar nisso.

- Está tudo bem, Av... Avril, olhe para mim – pediu ele, erguendo seu queixo e depois segurando seu rosto com ambas as mãos, a puxando para mais perto – Se você quer sair, você sai. Você está fora. Ninguém vai te obrigar a nada. Queremos seu bem. Se isso significa você sair da equipe, não é um problema. Você é mais importante.

- Aí é que está o problema: eu não quero sair – continuou ela, seu riso triste refletindo aquele infinito conflito de sentimentos – Vou precisar de umas três vidas para tentar de alguma forma compensar tudo que eu fiz, mas eu não acho que consigo mais.

- Rogers, o que diabos está acontecendo aí? – a voz alterada do arqueiro interrompeu a tentativa inexistente de Steve de a confortar, ganhando sua atenção – Eu estou quase desistindo de segurar o Tony e deixar ele ir para aí. Por que a Avril parou de responder?

- Você tirou seu comunicador? – perguntou ele para a mulher, acompanhando seus olhos se arregalarem em desespero.

- Eu não quero voltar para casa. Por favor – pediu ela, finalmente jogando os braços ao redor de seu pescoço, o mantendo em um aperto firme – Pelos menos não agora. Me dá um pouco mais de tempo.

- Gente? – disse Steve, sem pensar duas vezes – Voltar agora vai ser muito cansativo. Vamos ficar por aqui.

Na Torre, todos queriam explicações pelo motivo de Avril ter encerrado o interrogatório de maneira tão abrupta, já que não esperavam que as palavras do prisioneiro teriam algum poder sobre ela, mas algo na voz do Capitão os avisava que era melhor não questionar no momento. Se estivesse tudo bem, Avril teria entrado na linha e se explicado, mas isso não aconteceu. O difícil foi convencer Tony e Petr a deixar aquilo quieto no momento, que Steve podia muito bem lidar com ela sozinho, como praticamente vinha fazendo nas últimas semanas, que ele avisaria caso precisasse de assistência.

Com o auxílio de um taxista simpático que tivera a decência de não questionar o estado de Avril mesmo tendo reconhecido a dupla, quase uma hora depois eles estavam hospedados em um hotel próximo, com Steve aproveitando sua vez no chuveiro enquanto Avril zapeava os canais da TV sem o menor interesse, bem acomodada em um robe quentinho e comprido, as costas apoiadas contra a cabeceira da cama de casal.

Vez ou outra ela parava em um canal de notícias ao perceber que falavam sobre a HYDRA e os Vingadores, sempre estranhando quando a citavam sem mencionar sua estadia na organização inimiga, a pintando sempre como uma heroína. Avril não fazia ideia de como estavam abafando aquela história, mas no fundo até agradecia. Se já estava sendo difícil lidar com o seu próprio julgamento, sabe-se o que poderia acontecer quando fosse o mundo inteiro.

- Pensei que finalmente falar aquilo em voz alta faria com que eu me sentisse melhor... – Avril suspirou alto, assim que Steve deixou o banheiro, trajando um robe semelhante ao dela. Com um sorriso discreto ela fez uma aposta consigo mesma: não dava mais de dez minutos para ele se livrar da peça alegando calor, mesmo que estivesse um frio chato no quarto – Não fez.

- Você precisa parar de querer tudo pronto de imediato. Não funciona assim, e você sabe – alertou-a Steve, gastando alguns poucos segundos checando seu celular antes de se juntar a ela – Por que está rindo?

- É engraçado... Nós costumávamos falar até que bastante dessas coisas, sabe... Essas coisas de problemas mentais e tal – disse a mulher, a forma que ela gesticulava deixando claro seu desconforto – Bem no começo, lembra? Antes do Fury convocar a gente.

Steve concordou com um aceno de cabeça vago, sem querer comparando os cenários tão distantes, tanto temporalmente como em um sentido de gravidade, que dava uma falsa sensação de uma ser mais séria que a outra. Em uma a ameaça viera do espaço, coisas que eles não tinham compreensão, a outra viera de algo mais familiar, que eles conheciam muito bem. E em ambas estava ele, sem a menor ideia de como resolver as coisas.

- Depois disso nós apenas passamos a esconder coisas um do outro, ou pelo menos ignorar – continuou Avril, já que seu interlocutor não parecia muito disposto a continuar a conversa, seu comentário o intrigando – Sabe do que eu me lembro de antes de ir para a HYDRA? Lembro de estar feliz, e o maior motivo disso tudo era você. Parece até que são memórias intocáveis, estão em um nível que sinto que nunca vou alcançar. Sabe o porquê? Porque elas são falsas.

Steve até chegou a abrir a boca ofendido, pronto para gritar alguma coisa que nunca chegou a ser verbalizada. Ela estava certa e ele sabia, mesmo que lhe faltasse coragem para admitir.

- Aquele paraíso que estávamos vivendo era só fachada – continuou ela – Duas pessoas destruídas por dentro fingindo serem inteiras. Ambos abalados pelos acontecimentos de Washington, e individualmente por coisas ainda mais antigas. Nós estávamos nos sentindo felizes, mas era só algo superficial. No fundo nós estávamos morrendo.

- Você chegou nisso sozinha ou a Monica te ajudou? – indagou Steve, com uma sobrancelha erguida. Já conhecia muito bem algumas daquelas palavras, e não era pela voz de Avril. Ela por sua vez, riu de leve.

- Não vou mentir, ela me manipulou para chegar a essa conclusão – admitiu a mulher, soando um tanto impressionada – E de forma bem sutil, devo dizer. Ela é boa.

Steve riu em concordância, voltando a ficar em silêncio em seguida, o que fez Avril suspirar alto.

- Nossos quadros são bem parecidos, apenas em níveis e situações diferentes – continuou ela – Além do fato que todos esperam que eu seja a louca que grita e esperneia enquanto sequer duvidam de você. Ninguém espera que o Capitão América caía por uma ameaça tão insignificante como a própria mente.

Avril esperou que ele dissesse alguma coisa, aquele silêncio todo começando a incomodar. Era para ser uma via de duas mãos, certo? Era assim que as coisas deveriam funcionar. Não adiantava em nada ela estar disposta a ajudar se ele não permitia.

- Você não tem que se fazer de forte por mim, Steve. Admito que já tentei fazer isso para ver se você se toca, mas fica difícil te enganar quando você sabe que eu estou fingindo – a brincadeira não parecera surgir muito efeito, o soldado mantendo o olhar nos próprios pés ao longe, olhando para a mulher ao seu lado apenas quando ela pediu – Não quero te pressionar, mas... Eu não sei dizer quando você está guardando algo, certo? Mas não me deixa de fora. Sempre foi assim entre nós desde o começo, não é? Um ajudando o outro. E eu não quero isso porque você está me ajudando, eu... Eu quero você bem, e se eu posso ajudar, eu quero.

Steve voltou a assentir, dessa vez pegando a mão da mulher apoiada no colchão ao seu lado, entrelaçando seus dedos e lhe dando um aperto carinhoso. Sem separar suas mãos, ele a puxou para mais perto, a deixando parcialmente deitada sobre ele, beijando seus cabelos depois de murmurar um agradecimento pelo gesto.

- Odeio ter que dizer isso, Capitão, mas você está completamente ignorando o conceito de trabalho em equipe – brincou Avril enquanto se aconchegava em seu peito, o acompanhando na risada quando sentiu seu peito vibrando – Você deveria se envergonhar.

- Ainda bem que tenho uma boa segunda em comando do meu lado, hm? – devolveu Steve, e ela quase chorou de alegria por ele ter voltado a soltar frases mais completas. Ele ter sido sincero na discreta brincadeira fez com que seu sorriso se alargasse.

- Boa? Meu amor, eu sou incrível.

Steve concordou rindo, soltando sua mão para buscar o controle remoto de sua posse, já que ela falhara na missão de escolher algo decente para assistir.

Eles fizeram check-out no começo da manhã do dia seguinte, deixando que J.A.R.V.I.S. na maior parte do tempo pilotasse a nave, já que eles estavam ocupados demais passeando os olhos pelos nomes das novidades de filmes e séries que perderam nos últimos meses, já se programando para alguma maratona assim que o primeiro tempo livre aparecesse. Na Torre tiveram um pouco de problema para explicarem o motivo de terem adiado o retorno, mas logo aquilo tudo foi esquecido. O primeiro a desistir daquele assunto fora Tony, para surpresa geral, e, como perdera seu principal apoio, Petr desistiu logo em seguida.

A verdade era que o Stark mais velho tinha algo em sua mente o incomodando, algo que Krigor dissera durante o interrogatório, algo que todos estavam assumindo como mentira, mas que não saia de seus pensamentos. Não me surpreenderia em nada se ela escolhesse aparecer no seu aniversário de novo. Talvez fosse a aproximação da data real do nascimento de sua filha, mas Tony não conseguia esquecer aquela fala. Ele precisava passar algumas coisas a limpo, apenas para garantir.

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Steve praticamente já não respirava mais.

Ele deveria saber que aquele tipo de aproximação em algum momento lhe colocaria em um cenário como aquele. Avril dormia pesado, completamente alheia ao que estava acontecendo ali. Se ele próprio não tivesse acordado, também ainda estaria dormindo em paz, só que sua mente decidira torturá-lo um pouco mais. O costume era ele adormecer de barriga para cima, com Avril deitada por cima dele. Se Steve não se perdesse em pensamentos, aquela posição não lhe causava problemas, e até o ajudava a dormir: o movimento sereno da respiração de Avril contra seu peito o acalmava como nada mais conseguia, o aperto leve de suas mãos em seu tronco lhe transmitia uma sensação de segurança tão grande como adormecer com ela firmemente em seus braços. Suas pernas não demoravam muito para se entrelaçarem, como faziam com tanta naturalidade meses atrás, e, se Steve evitasse pensar no que acontecia, podia facilmente se manter alheio ao que acontecia. Sem crise nenhuma. O problema era ele acordar no meio da madrugada, Avril agora de costas para ele, só que seus braços a mantinham perto, seus corpos perfeitamente encaixados. Para apenas o distrair ainda mais, seu rosto estava perto demais da nuca da mulher, o perfume de seus cabelos bagunçando seus sentidos. Esse era um dos motivos de ele mal-estar respirando. O outro era que, quando ele respirava, seu corpo se mexia, e quando ele se mexia, Avril também acabava se mexendo, e os braços dela envolvendo os seus em um aperto firme descartava por completo a possibilidade de se afastar e tomar um banho frio. Outro detalhe era que ele realmente não queria. Ele sentia sua falta, de todas as formas possíveis. Uma vez ou outra por dia ele conseguia ter um vislumbre da mulher por quem originalmente se apaixonara: as vezes uma risada mais alta, ou até mesmo uma mais discreta; alguma frase que ela gostava de repetir, ou até que repetia sem ter consciência; algum olhar ou gesto em resposta à alguma brincadeira do resto da equipe. Eram meros detalhes, mas que já o deixavam feliz, esperançoso. Só que não era apenas aquilo de que ele sentia falta: seus momentos sozinhos, as conversas aleatórias no meio da noite, seu toque, seus beijos, a energia que ela emanava de alguém intocável, de uma pessoa que poderia passar por qualquer provação e continuar sendo a pessoa mais feliz do mundo. Sem que ele quisesse, uma frase de Petr voltara a seus pensamentos. "Dominik está incompleta". O rapaz talvez não fizesse ideia de que aquilo pudesse carregar mais de um significado, mas estava coberto de razão. Avril era uma pessoa incompleta agora, precisava de mais tempo e espaço para se recompor, para voltar a ser alguém inteiro. E Steve sentia que aquele tipo de desejo violava aqueles direitos da mulher.

Ele tinha completa ciência disso, só que seu corpo resolvera o trair. Os sons que Avril produzia enquanto dormia lhe eram tão familiares e reconfortantes que seu subconsciente se sentia na liberdade de lhe pregar uma peça, o fazendo sonhar com um período onde tudo estava em perfeita ordem – havia inimigos para se derrotar, problemas para resolver, mas nada disso passava da porta do quarto. Porém quando ele acordava, uma realidade completamente diferente que o recebia.

Quase que pondo um fim em seus esforços para manter a cabeça no lugar, o quadril de Avril se remexeu com mais empenho contra ele, e, ao mesmo tempo que sua respiração ficara presa na garganta, seus braços se fecharam com mais vontade ao redor do corpo da mulher, a puxando para mais perto, se é que isso era possível.

Ah, ela estava acordada.

- Você não está jogando limpo, Av – sussurrou Steve com certa urgência, sua respiração já pesada batendo em seu ouvido, seus lábios abertos encostando de leve em seu lóbulo.

- E desde quando eu jogo limpo? – retrucou ela, um riso distante em sua voz. O próprio soldado se flagrou rindo, embora fosse mais de nervoso e desespero do que por achar graça. Avril girara o corpo em seus braços, agora ficando ambos frente a frente, a confusão de pernas aumentando ainda mais.

- Qual é, Av...! As coisas estão diferentes agora, isso não é mais apropriad... – Steve até fizera um bom trabalho em se manter centrado, não vacilando sob o olhar próximo da mulher até ela abaixar os olhos para seus lábios, fazendo com que ele se perdesse um pouco – Você só está sendo cruel no momento.

Avril sorriu de lado. Assim como praticamente toda as vezes em que eles estavam sozinhos, a mulher mais uma vez estava forçando a barra com Steve. A diferença era que ele já estava acostumado com ela praticamente forçando discussões, e não aquele tipo de cenário. Outra diferença essencial era que ela não estava de fato o testando. Avril sentia sua falta, sabia que não o teria de volta, muito menos na velocidade que desejava. Não havia um relacionamento que ela não tivesse estragado e que agora tinha que lutar para recuperar, mas a distância entre ela e o soldado era o que mais a machucava, e definitivamente seria o que levaria mais tempo para consertar. Avril não era idiota, tinha completa noção de seus limites, e o que Steve realmente queria ela ainda não tinha estruturas emocionais para dar, mas talvez o que ele parcialmente queria talvez pudesse ser considerado.

Ainda com o olhar baixo, ela tocou de leve com o polegar os lábios entreabertos do homem, que até chegou a minimamente avançar com o rosto em sua direção, apenas para recuar em seguida. Como ele não parecera se opor ao seu toque, Avril deslizara a mão pelo seu rosto, passando as unhas pela barba que começava a dar sinais de vida até alcançar seus cabelos, percorrendo sem pressa o caminho até sua nuca, voltando depois e deixando seus dedos na linha do seu maxilar. Apenas quando o movimento parou que Steve se permitiu abrir os olhos, estudando o olhar conflitante da mulher a sua frente.

- Eu continuo sendo a mulher que você ama? – perguntou Avril depois de várias vezes hesitar, quase se desesperando ao ouvir a risada baixa de Steve.

- Se você sente a necessidade de perguntar, eu não estou exatamente fazendo um bom trabalho, não é? – suspirou ele, posicionando uma mão sobre o pulso da mulher, acariciando a região com o polegar.

- Você sabe que não é isso... Eu só preciso ouvir você dizer.

- É claro que você é, Avril... – sussurrou Steve, sentindo um pesar ainda maior por se encontrarem naquela situação. Em um momento de coragem, e de falta de bom senso, ele encostara sua testa na dela, seus narizes timidamente se tocando – Sempre foi. Sempre vai ser.

- Só que eu não me sinto completamente confortável para voltar a ser aquela pessoa em tempo integral – contou ela, erguendo o olhar para os seus olhos por um breve instante antes de retornar a focar em seus lábios – Mas para isso eu me sinto mais do que confortável.

Mesmo se Avril tivesse lhe dado a chance de responder, Steve não tinha exatamente o que dizer, por isso agradeceu quando ela ocupou seus lábios com outra função, imediatamente correspondendo ao beijo enquanto suas mãos garantiam que ela não se afastaria tão cedo. Ele não sabia dizer se estava confortável ou não com aquela ideia, mas ele não estava pensando direito desde que acordara. Apenas em um primeiro momento o beijo fora calmo, com Avril receando se Steve iria ou não recuar de vez, a dinâmica das coisas mudando drasticamente quando ambos perceberam que nenhum deles pretendia voltar atrás.

Uma de suas pernas passou por de trás da dele, seu pé percorrendo toda a extensão desde a panturrilha, e ele na mesma velocidade passeava uma mão por sua coxa, até que a perna dela estivesse travada em sua cintura. Steve girara seu corpo sobre o dela, mas ele não planejava se deitar, e Avril agradecera mentalmente por ter envolvido o pescoço do soldado com os braços, já que ele a puxara junto quando se sentara. No instante que sentira as mãos ágeis de Steve na barra de sua camiseta, Avril interrompera o beijo e criara uma distância o suficiente para que ele conseguisse se livrar do material, sequer se importando em saber que rumo a peça tomara.

- Estou assumindo que vai ser sem enrolação, certo? – ofegou Steve contra a pele exposta de seu pescoço, beijando a região enquanto uma de suas mãos tentava segurar os fios de cabelo da mulher que insistiam em lhe escapar, enquanto a outra mantinha o quadril dela pressionado contra o seu. Avril deixou que uma risada grave e baixa lhe subisse pela garganta, Steve sorrindo contra seu pescoço antes de morder sua pele ao sentir a vibração de sua risada, algo que o lembrava um ronronar. Quase que como resposta, as mãos de Avril em seus ombros aplicaram uma quantidade considerável de força, fazendo com que ele caísse de costas no colchão, ela agora por cima dele.

- Pelo menos não no primeiro round.

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Steve se espreguiçou mais uma vez na esperança daquele incômodo no ombro o abandonar, apenas para bufar iludido em seguida, mesmo com o sorriso bobo ainda no rosto. O dia não tinha ainda nem amanhecido quando ele deixou o quarto para rumar para a cozinha, esperando assim ter um pouco de paz na primeira refeição para variar, já que a cada dia ficava mais difícil conseguir encontrar o cômodo sem superlotação.

Por isso seus ombros caíram em desânimo quando percebeu que já tinha alguém lá.

- Bom dia, Capitão...! – lhe desejou Tony assim que ele passou pela porta, um sorriso largo em seu rosto que o deixou incomodado. Ele não era uma pessoa matinal. Na verdade, ele não era uma pessoa animada em nenhum momento do dia, a não ser que estivesse tramando alguma coisa.

- Bom dia... Stark – respondeu ele desconfiado, se adiantando para a cafeteira. Quando passou ao seu lado, Tony perguntou o paradeiro da filha – Ainda está dormindo... Certo, o que foi?

- Do que você está falando? Eu só perguntei, credo – desconversou Tony rindo, pegando um pacote de frutas secas e se sentando do outro lado da mesa, um brilho divertido nos olhos enquanto levantava sua caneca para beber um gole do café recém passado – Até parece que tem algo que você não quer falar...

- Você já sabe! Como q...? – ofegou Steve, apontando acusadoramente para o homem quando lhe ocorreu uma explicação, e mesmo assim seu rosto estava vermelho de vergonha – É melhor você não estar espionando meu quarto.

- Relaxa... Queria que a Avril revisasse um projeto para mim, e pedi que J.A.R.V.I.S. a chamasse. Ele disse que não podia fazer isso e que não podia explicar o motivo. Não há uma variedade muito grande de situações que o J.A.R.V.I.S. se recusa a explicar, se você quer saber – explicou Tony, seu sorriso cínico se alargando enquanto ele apontava como quem não quer nada para a própria nuca – E o puta hematoma que você tem na lateral do pescoço não parece ser do tipo que você consegue caindo. A não ser que você tenha caído na boca de alguém. Eu estou apenas assumindo que foi a boca da Avril, ou você vai estar com problemas.

Steve respirou fundo e fechou os olhos. Queria acreditar que aquilo era apenas um sonho ruim, mas era tão a cara do Tony insistir em uma conversa daquelas que ele teve que aceitar que se tratava da realidade.

- Então...? – incentivou o engenheiro, claramente na expectativa para que o soldado continuasse o assunto, o que deixou Steve completamente horrorizado.

- Pelo amor de Deus, Tony! Ela é sua filha, é estranho demais.

- Eu não estou pedindo por detalhes, idiota – resmungou Tony nervoso, rindo em seguida ao perceber que estava conversando com o soldado como normalmente conversava com a filha, assumindo que entendia todas as suas intenções – Quero saber se vocês voltaram. Sabe, de verdade.

- Eu não sei, acho que não... – respondeu Steve incerto, se jogando em uma das cadeiras vazias com uma expressão confusa. Quando Tony voltou a rir, ele revirou os olhos cansado – O que foi dessa vez?

- O grande Capitão América acabou de ter um caso de uma noite? – alfinetou o homem, que até tentara se manter sério, mas falhara sem nenhum peso na consciência.

- Você não pode chamar de algo de uma noite quando a mulher dorme do meu lado todas as noites, Tony – retrucou Steve, aproveitando do rápido momento de choque de Tony para puxar seu pacote de lanche, jogando uma pequena quantia na boca antes de se levantar com a caneca vazia em mãos.

- Olha só! O menino certinho sabe responder! – Tony riu ainda mais – E ainda pegou minha comida sem pedir... Minha filha é uma péssima influência para você, pelo visto.

- J.A.R.V.I.S.? – suspirou o soldado alto, enquanto lavava a pouca louça que sujara – Por acaso a Avril mudou as coisas de maquiagem dela de lugar ou ainda está no mesmo?

- Quer brincar com maquiagem a essa hora, Rogers? – brincou Tony depois que seu sistema disse que permanecia no mesmo lugar, quase se arrependendo ao ver o sorriso estranho que o Capitão lhe lançara por cima do ombro. Aquilo era novidade...

- Melhor eu dar um jeito nisso antes que o pessoal acorde e fique fazendo perguntas – explicou o soldado, se referindo ao hematoma que Tony comentara mais cedo.

- E você sabe passa essas coisas? Tem quase um arco-íris de corretivos.

Steve sorriu travesso, jogando o pano de prato de volta a seu lugar e se virando para Tony.

- Se eu não soubesse usar, já teríamos tido essa conversa muito antes, se é que me entende.

Se ele estivesse com seu celular, teria registrado a expressão horrorizada do mais velho dos Stark.

- Oh, Rogers! É a minha filha, lembra? – resmungou Tony assim que recuperou a fala, aumentando a voz quando o soldado deixou a cozinha – Não te dei essas liberdades!

- Pior que deu, Stark – respondeu Steve do corredor – O pior é que deu, sim.

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Avril ainda tinha o celular em mãos quando saiu do elevador, nervosamente batucando o aparelho com os dedos. Sabia que não receberia atualizações por alguns bons dias, ou até semanas, mas mesmo assim não conseguira se separar do aparelho na hora de deixar seu quarto. Temendo que alguém fosse notar seu nervosismo, ela guardou o celular em um dos bolsos do short jeans que usava, logo se juntando ao restante da equipe que estava espalhado pela sala em frente da grande TV.

Steve, Thor, Petr, e Clint estavam no meio do tapete, completamente entretidos com as imagens que viam, mal tocando nos baldes de asas de frango fritas que os cercavam. Tony e Natasha dividiam um dos sofás, enquanto Bruce tinha outro apenas para ele. Antes que Avril pudesse o questionar sobre o que assistiam, o narrador do jogo elogiou Tom Brady pelo belo passe que resultou em um touchdown. Era Super Bowl, e eles estavam no meio da semana, não tinha como aquele jogo estar acontecendo agora, já que ele sempre era de domingo, e no começo de fevereiro.

- Por que vocês estão assistindo um jogo antigo? – perguntou Avril, parando atrás do sofá que estava de frente para a TV, o que seu pai ocupava.

- A gente estava em missão – respondeu Steve.

- E por que estão assistindo agora? – continuou ela – Patriots ganharam. Até eu sei isso, e olha que nem estava procurando a informação.

- O que importa é a gente parar para assistir. Confraternização, querida – resmungou Clint, rapidamente se virando para ela apenas para apontar para o local vago ao lado de Bruce – Senta a bunda ali e come.

- Depois desse convite transbordando educação, não tenho outra escolha, não é? – bufou a mulher, se jogando ao lado de Bruce e negando com a cabeça quando ele lhe ofereceu o balde com frango. Avril tinha feito uma rápida parada na cozinha há pouco tempo, e só não tinha recusado aquele convite porque era engraçado ver o quarteto no tapete sofrendo com cada lance do jogo como se fosse ao vivo.

Foi em meio a uma onda de reclamações que Avril notou algo estranho com um pouco mais de antecedência de que seu irmão, já que ele estava distraído com o jogo. Havia uma pessoa a mais na sala, alguém que não fora anunciado e que ela tinha dificuldades para sentir a presença, seu reflexo na TV sendo o único indício de que estava realmente ali. Havia uma diferença muito grande entre não estar se focando para monitorar seus arredores, com praticamente não registrar alguém próximo daquela forma. Só havia um tipo de pessoa que Avril tinha dificuldades para registrar: aprimorados.

Em um movimento rápido, ela se jogou do sofá e deu uma cambalhota em direção a mesa de centro, até ouvindo algumas reclamações por ter atrapalhado a visão de todos ao passar na frente da TV, algo que logo se cessou ao notarem ela tirar uma pistola escondida de debaixo do móvel, e apontar para algo às costas de todos.

- Mãos para cima! – ordenou ela, ignorando todas as exclamações surpresas da equipe, que não haviam entendido ainda a seriedade da situação. O único que se manteve em silêncio foi seu irmão, que parecia estar tendo uma reação confusa muito mais controlada do que ela – Pete, você está a sentindo? Petr?!

- Ei, Avril... Abaixa a arma – pediu Steve com cuidado, assim como os outros, já de pé. Provavelmente ela estava certa e se tratava de uma ameaça, mas as mãos trêmulas de Avril poderiam ferir alguém. Aquilo na verdade era o que mais estava o surpreendendo: se conheciam há muito tempo e já haviam vivido praticamente todo tipo de situação, e ele nunca a vira empunhar uma arma com tanta falta de concentração. Observando tudo de um contexto mais geral, ela como todo não estava agindo como de costume: a respiração descompassada; os músculos tensos, não para realizar melhor certos movimentos, mas sim travados; e os olhos agitados que expressavam algo que ele quase se recusava a acreditar como medo. Petr não estava no mesmo estado que a irmã, mas o mínimo que se podia dizer era que ele também estava assustado. Tinha algo muito errado ali, e parecia que a fonte era a intrusa.

A intrusa em um primeiro momento não parecia ter nada demais: uma mulher alta que deveria ter algo perto de quarenta anos, cabelos negros em um corte irregular um pouco acima da base do pescoço, olhos de um castanho mais amigável, e um sorriso inocente que, fosse paranoia sua ou não, parecia se tornar mais satisfeito e cruel a medida que se alargava.

- Quem é você? J., status da segurança? – Avril lançou as duas perguntas quase que de uma vez, suas mãos se fechando com mais vontade contra sua arma ao não obter nenhuma resposta, tentando respirar fundo mais uma vez para tentar se reestabelecer – J.A.R.V.I.S.?!

- Sequer consigo acreditar que consegui encontrar todos vocês juntos! – comemorou a mulher, sua voz melodiosa ecoando pela ampla sala. Ela deu um passo em direção às costas do sofá, o que resultou nos Vingadores mais próximos dali recuando um passo, por precaução. Thor tensionava e relaxava os dedos de sua mão, à espera do menor sinal de que deveria entrar em ação. Steve rapidamente buscara com o olhar a localização de seu escudo, que descansava próximo a escada que dava acesso ao laboratório de Tony. O arco de Clint estava no mínimo alguns andares dali, então ele, assim como Natasha, repassava mentalmente a localização de todas as pistolas escondidas no andar. Tony, por sua vez, sequer pensara em chamar uma armadura, ou checar o status do seu sistema de inteligência. Sua imagem já havia sido o suficiente para fazer com que sua mente parasse de processar os dados, assumindo que estava diante de algum truque. Só que aquela voz ele reconheceria mesmo daqui cem anos – E J.A.R.V.I.S. está descansando no momento, дорогая.

Enquanto Avril franziu ainda mais o cenho ao ouvir um tratamento russo naquele momento, Petr assistira seu corpo expulsar todo o ar que seus pulmões armazenavam. Sua memória até era superior, se comparada com um homem comum, mas para aquela associação até ele estava com um pé atrás, mesmo que algo lhe dissesse que estava certo.

- Mãe...?

- Oi, Pete. Meu garoto... – Valerik sorriu para ele, juntando as mãos em frente ao peito. Ela sabia muito bem quanto o filho havia crescido e como era sua aparência agora, mas ver pessoalmente ainda era algo especial. Próximo a ele e um pouquinho mais à frente, estava o dono do prédio, para quem seu sorriso se tornara um pouco mais sombrio – Tony... Você está velho. Bem, ao restante eu não fui apresentada, e também não é o momento.

Steve discretamente tentara chamar Avril, mas ela parecia em outro mundo, a boca um pouco aberta enquanto sua mente trabalhava, tentando acompanhar o que acontecia. Tinha que ter algo errado ali, aquilo não fazia sentido. Não podia fazer. Faltava alguma peça-chave naquele quebra-cabeça, só que não tinha como ele alterar por completo toda a imagem, ou tinha?

- Se vocês me dão licença, preciso conversar por um momento com meus filhos – disse a mulher por fim, erguendo uma das mãos na altura dos ombros, fazendo um singelo movimento com os dedos para o lado, a mesma direção que a arma de Avril seguira até colidir com a parede. Antes que ela pudesse reagir ou até entender o que acontecia, seu corpo pareceu obedecer a outra força, sendo arrastada em um segundo até estar de frente para a mãe, sua mão ao redor de seu pescoço em aperto firme – Vamos começar com a caçula.

Sua pele em contato com os dedos frios de Valerik logo começou a formigar, aquela sensação se espalhando lentamente pelo seu corpo. Algum tipo de energia estava passando da mulher para ela, todo seu ser se esforçando para não sucumbir ao que quer que fosse aquele poder, com Avril juntando toda a concentração que tinha e segurando seu pulso com vontade para lhe servir de apoio, em um movimento rápido encaixando o pé no começo das costelas da mãe. Os Vingadores terem entrado em combate facilitou sua tarefa de escapar do aperto de Valerik, ainda tendo um tempo extra para tentar entender o que ela fizera antes de precisar voltar para a ação, saindo de seu campo de alcance quando ela tentou a agarrar pelos cabelos depois de jogar Clint em direção ao bar. Um peso se instalara em seu peito, o corpo trêmulo, sua respiração desregulada como se estivesse tendo um ataque de pânico, e não entender o motivo daquilo tudo apenas piorando seu estado. Valerik havia transmitido alguma energia para ela e confundido seu sistema nervoso, era a única coisa que conseguia deduzir, e até fazia algum sentido. Avril e Petr tinham certo controle a mais que o normal sobre os próprios corpos, e se a matriarca da família tivesse desenvolvido a habilidade de controlar corpos de terceiros?

Steve agarrou o antebraço de Avril assim que teve a chance, agradecendo por ela estar atenta o suficiente para repetir a ação com ele, suas unhas arranhando de leve sua pele enquanto a girava no ar, conseguindo pegar Valerik desprevenida com um chute no rosto, jogando Avril no sofá mais distante por ela ainda estar claramente abalada, deixando que o resto da equipe ainda de pé continuasse no combate. Valerik não demorou muito para se levantar, limpando rapidamente o sangue que escorria de seu lábio rachado antes de se defender dos ataques do Capitão e de seu filho. Eles estavam dificultando para o seu lado, intercalando com perfeita sincronia os golpes do outro, por isso a mulher teve que apelar para o nunchaku que estava no bolso traseiro de sua calça, dois bastões de madeira ligados por uma pequena corrente. O cotovelo de Steve foi o primeiro a ser atingido, o choque do impacto travando seu braço e abrindo sua defesa, praticamente permitindo que Valerik encaixasse os dois pés em seu peito e o jogasse para perto da TV, puxando o filho para o chão junto ao jogar a arma ao redor do pescoço do homem.

Thor fora o próximo da fila, girando o corpo para acertá-la com seu martelo, ofegando de leve surpreso ao ver o movimento sendo parado pelo antebraço. Estava clara a quantidade de força que Valerik estava utilizando para aquilo pela forma que seus músculos estavam tensos, mas da mesma forma era impressionante. Por algum motivo esperava que ela perdesse para os filhos no quesito força, mas não parecia que ela estava assim tão distante. Aproveitando que não tinha mais alguém tão próximo, Valerik se deu ao luxo de voltar a usar telecinese, lançando o asgardiano o mais longe que conseguia, atravessando uma divisória de vidro no andar superior. Thor até se preparou para voar em direção da mulher com mais hostilidade do que antes, mas por algum motivo seu olhar caiu sobre Avril próxima a um dos sofás, seu olhar intenso em sua direção, a mão sobre o pescoço como um pedido silencioso que ele logo compreendera.

Precisavam da coleira, e um dos seus exemplares estava no laboratório de Tony, que ele acabara de invadir sem querer.

Avril se pôs de pé assim que Thor entendeu seu recado. Precisava que Valerik ficasse entretida, se ela suspeitasse que tinham um dispositivo que podia a parar, talvez tudo fosse posto a perder. O combate físico não a manteria ocupada por muito, já que nem todos conseguiam enfrentá-la: Tony não tinha nem psicológico ou armadura para dar um passo sequer, Bruce estava mais afastado na sala, torcendo para que a mulher não tivesse planos de atiçar o outro cara, Natasha acabara de ser atirada na mesma direção que Clint, precisando de mais alguns segundos para se recuperar do impacto forte de ter atingido o balcão do bar com as costas, o que deixava apenas Steve e Petr para a auxiliar.

O russo havia conseguido tirar o nunchaku das mãos da mãe, depois de o travar em seus braços e girar o corpo para que escapasse de sua mão, jogando a arma longe na esperança de que fosse conseguir a manter ocupada o suficiente para não ter brecha para voltar a utilizar telecinese. Já tinha entendido o padrão: ela precisava de concentração para conseguir usar aqueles poderes, algo que era difícil de manter em um combate com tantos oponentes, e, por estar em número muito maior, aquela era a vantagem que tinham. Pelo menos era nisso que Petr acreditava, até sentir os dedos da mãe se fecharem ao redor de seu pescoço, e todos os seus questionamentos começarem.

- Pete! – ofegou Avril assim que viu o irmão caindo de joelhos, o corpo mole tombando para o lado. Steve até chegou a ameaçar se adiantar para voltar ao combate, mas Avril o puxou pelas costas da camiseta em um aperto desesperado, se pendurando em seus ombros quando ele recuou um passo para impedir que ele fosse para frente – Fica longe, Steve. Pete?!

- E-ela... – o russo tentou explicar, mas a confusão estava explicita em sua voz embargada. Petr conseguiu recuar um pouco, mas não chegou a ousar a erguer os olhos para mulher em pé próxima a ele. Não fazia ideia do que estava acontecendo e tinha a sensação de que tudo ficaria mais confuso se buscasse explicações nos olhos cruéis da mãe – Avril, eu não consigo diferenciar realidade da ilusão.

- F-fiquem longe dela – ordenou Avril para todos, sua voz falha não conseguindo transmitir firmeza para ninguém – Não cheguem perto.

- Avril...? – sussurrou Steve confuso, segurando a mão gelada da mulher que estava sobre seu peito, tentando lhe passar algum conforto ao mesmo tempo que exigia mais detalhes. Havia demorado um pouco para aprender, mas sabia que ela não tomava as melhores decisões quando estava com medo, ou família era envolvida. Precisava estar atento para qualquer forma de ação autodestrutiva.

- Garota esperta – riu Valerik, olhando do Petr caído para ela – Sua demora para entender comprometeu seu irmão, mas acho que estava esperando demais de você.

- Não deixem que ela toque em vocês – Avril ignorou a fala da mãe, respirando fundo antes para tentar recuperar a estabilidade da voz – Qualquer que seja o poder dela, é pelo toque.

- E como chegou a essa conclusão?

- Você tentou passar algum tipo de energia pelas suas mãos – continuou ela, aos poucos começando a desgrudar de Steve, que relutou em soltar sua mão. Thor encontrara a coleira e descia sem pressa as escadas do laboratório. Precisava estar pronta para entrar em combate ao menor sinal do deus, não podia gastar tempo para se afastar do soldado mais tarde – Petr e eu fomos os únicos que você segurou, e os únicos que sentiram algo diferente.

- Engraçado você ainda estar de pé, tenho que dizer que estou surpresa – comentou Valerik, levando uma mão ao queixo enquanto parecia pensativa – Pensei que funcionaria em você. Talvez eu devesse ter levado em conta quantas vezes você foi exposta ao tal cetro.

- Querida, se você entrar na minha mente, tem que pedir por favor – zombou Avril, arriscando alguns passos confiantes em direção à mulher, apoiando as mãos no encosto do sofá e se inclinando, o sorriso arrogante marcando presença em seu rosto – E com jeitinho.

Aí está minha filha, Valerik logo notou. Toda aquela postura era completamente fruto de seus poderes, ela sabia muito bem, e era exatamente isso que fazia com que fosse dominada por algum tipo de orgulho: no meio daquela loucura toda, Avril ainda conseguia encontrar o ponto de equilíbrio, manter tudo sob seu controle firme. Levava anos de treinamento intenso para atingir aquele nível, e ela, além de ser a mais nova da família, fora a que menos tivera instruções. Aquilo tudo lhe era natural não por ter nascido com aquilo, mas por ter adquirido domínio ter sido conquistado de forma instintiva. O cetro sequer deveria ter ajudado, já que os arquivos que conseguira ter acesso diziam que a arma apenas amplificara algumas habilidades e criara outras, mas não lhe dera um manual de instruções. A lista de diferenças entre Avril e o resto da família era imensa, ela poderia passar o dia inteiro numerando.

- Como q...? Você...? – Tony tentou verbalizar a dúvida geral, aos poucos recobrando seus sentidos e o controle sob seu corpo. Não era um maldito pesadelo, ele tinha que fazer alguma coisa. Valerik sorriu em piedade para ele.

- Acha que é tão fácil assim me matar?

- Mas com...? Barnes...?

- Ela altera memórias – explicou Avril, ficando de joelhos no sofá e virando o rosto para o pai – Cria novas.

- Barnes conseguiu distinguir a ilusão? – perguntou Valerik, seu tom de voz entregando sua curiosidade genuína – Você passou uma temporada com ele, não foi? Por isso diz com tanta certeza ou é apenas insolência?

- Ele ainda acredita que te matou – respondeu ela séria – O que você quer aqui?

- Conversar com você.

- Vai sonhando – debochou Tony, sua irritação aumentando ao ouvir a mulher rir divertida.

- Não preciso sonhar, já que ela vai, não é, Av? – Valerik deixara a voz mais macia e baixa, chegando até a se adiantar para o sofá e tentar tocar o rosto da filha, que parou seu braço com as costas da mão. Não podia deixar seus dedos tocarem ninguém naquela sala, não precisava de mais ninguém comprometido. Petr estava sentado do chão a poucos metros das duas, a respiração ainda falha, mas ele estava causando aquilo. O que quer que Valerik tivesse feito com que ele visse, ele já havia se recuperado, e agora esperava o sinal de Thor para voltar para ação, já que notara o plano silencioso que se desenvolvera na sala.

- Vá em frente – incentivou Avril, sorrindo mentalmente ao notar Thor parando próximo a eles, girando ameaçadoramente o martelo por seus dedos. Ela por sua vez ergueu a mão para que ele parasse, tanto com a ameaça como com a tentativa de a derrubar de vez. Sua curiosidade estava falando mais alto, queria ver até onde Valerik iria – Me faça querer conversar.

- Sei que você acha que está brava comigo... Mas eu só quero ajudar – disse ela, o rosto levemente contorcido em uma expressão de pesar, que não convenceu ninguém, especialmente a mais jovem na sala – Não pude interferir antes. Seu irmão estava com o Krigor, era arriscado. Infelizmente não pude ajudar com seu padrasto.

- Ah, você não...? – começou Avril, teve que fazer uma pausa para rir descrente – Petr saiu da HYDRA faz semanas, e você sabe muito bem disso porque saiu na mídia. Mas a prisão do Krigor? Ninguém sequer sabe quem ele é, ninguém se importa. E você me aparece aqui uma semana depois que ele foi preso e quer que eu acredite que é uma coincidência? – o sorriso irônico sumiu de seus lábios, sua expressão passando rapidamente da indiferença até alcançar a raiva mal controlada, voltando a se apoiar no encosto do móvel onde estava, deixando seus rostos perigosamente perto – Não tente bancar a desinformada porque sei que você não é. Se quer mentir para mim, vai ter que se esforçar muito mais porque eu não vou acreditar em qualquer porcaria.

- Palavras corajosas para alguém que estava se escondendo atrás do namorado até agora – retrucou Valerik, imitando o tom baixo e profundo que a filha usara, falhando em notar que ela mal prestara atenção em sua ofensa. Foi algo de um breve segundo, mas Avril notou uma oscilação na mãe. Até aquele momento, ela se deu conta, Valerik não estava controlando a suas ações por meio de seus poderes, e agora estava. O estranho era que tinha certeza que ela estava os utilizando desde que chegara – Krigor te avisou.

- Sim – respondeu a filha, e a mãe seguiu seu silêncio ao não entender o motivo de sua voz ter regredido para um tom mais amigável, até mesmo confuso. Aquele era um bom momento para se saber ler mentes.

- Avril, você disse que ele estava mentindo – lembrou Tony ao fundo, tirando ambas de seus pensamentos.

- E ele estava. Krigor sempre assumiu que ela estava viva, mas nunca chegou a ter uma confirmação de fato – explicou a jovem, sem quebrar o contato visual com Valerik – Eu não estava apostando muito nisso, mas nada como estar preparada.

- Sempre um passo à frente... É um bom lugar, não é?

- Bom lugar vai ser de onde eu vou assistir você sendo presa. Ou esperava bancar a inocente? – debochou Avril – É para isso que veio aqui? Tentar ser inocentada? Não vai acontecer.

- Ah, meu anjo... Tão inteligente e ao mesmo tempo tão ingênua – lamentou Valerik, unindo as sobrancelhas – Conheço meus crimes melhor do que ninguém, e não nego nenhum deles. Só que ainda tem algo que preciso fazer, e ajuda sua e de seu irmão vai ser necessária.

- Um favor, é disso que você veio atrás? E eu sou a ingênua... – zombou ela, cruzando os braços em frente ao peito – E por que nós te ajudaríamos logo você, que não faz por merecer tamanha bondade?

- Você não tem filhos, Avril. E espero que você nunca precise sentir como é difícil abandonar um – lembrou a mulher, assistindo a filha ficar indiferente – Ter que sacrificar o futuro de um para que o outro possa pelo menos sobreviver. Foi isso que eu tive que fazer. Tive que escolher entre você e Petr.

- Se está tentando fazer com que eu fique com peso na consciência, definitivamente não vai funcionar.

- Eu não sou a vilã aqui, Av.

- Não, você é só a vadia – retrucou ela, pulando o encosto do sofá com sincronia dos movimentos de Petr e Thor.

Usando o sofá de apoio, Avril chutou a mãe no abdômen, conseguindo a derrubar com o auxílio do irmão, já que Petr a segurava na altura dos joelhos. O russo se sentou nas costas da mulher e prendeu seus braços no mesmo instante que Thor se adiantou com a coleira, empurrando Petr para longe antes de fechar o dispositivo no pescoço da mulher já que a descarga elétrica acabaria passando para ele também. O próprio deus optou por se afastar também, para garantir que o choque fosse recebido apenas pela intrusa, assistindo assim como a dupla de irmãos Valerik se contorcer e depois seu corpo ficando imóvel.

- F-funcionou? – perguntou Avril respirando rápido, buscando apoio no sofá à suas costas, suas unhas fincadas no tecido do móvel. Estava exigindo tanto de si para manter a concentração que, na menor possibilidade do inimigo ter sido neutralizado, seu controle se dispersara em um nível que talvez até tivesse dificuldades de dizer qual era seu nome – Ela ainda está viva ou...?

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