Quem Brinca Com Fogo

By BrunaCeotto

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Um ano depois do incêndio que fez com que Valéria deixasse Viveiro em busca de uma vida nova, a garota volta... More

livro #2 | ou ❝quem brinca com fogo❞
prólogo | ou ❝lá vamos nós (de novo)❞
01.1 | ou ❝um dia...❞
01.2 | ou ❝um dia...❞
02.1 | ou ❝má publicidade❞
02.2 | ou ❝má publicidade❞
03.2 | ou ❝eu sou joão jordan❞
04.1 | ou ❝tudo que vai, volta❞
04.2 | ou ❝tudo que vai, volta❞
05.1 | ou ❝amor antigo, ciúme novo❞
05.2 | ou ❝amor antigo, ciúme novo❞
06 | ou "garotas só querem se divertir"
Capítulo 7 ou "Encurralada"
Capítulo 8 ou "Sabia que você estaria aqui"
Capítulo 9 ou "Falso testemunho"
Bônus 1 ou "Indefeso"
Capítulo 10 ou "Últimos socorros"
Capítulo 11 ou "Você vai ficar bem sem mim"
Capítulo 12 ou "Ciumenta?"
Capítulo 13 ou "Humilhação pública"
Capítulo 14 ou "No recreio"
Capítulo 15 ou "Até que se prove o contrário"
Capítulo 16 ou "Inocente sim, livre nunca"
Capítulo 17 ou "É bom tê-lo por perto"
Capítulo 18 ou "Tímida"
Capítulo 19 ou "Isso é um encontro?"
Capítulo 20 ou "Quebra-cabeça"
Bônus 2 ou "Não faz diferença"
Capítulo 21 ou "Saber ou acreditar"
Capítulo 22 ou "Montanha-russa"
Capítulo 23 ou "Talento para mentiras"
Capítulo 24 ou "Tudo faz sentido"
Capítulo 25 ou "Em tempo"
Capítulo 26 ou "Onde foi parar Lucas Avelar"
Capítulo 27 ou "O incêndio"
Capítulo 28 ou "A toda prova"
Bônus III ou "Acordo de cavalheiros"
Capítulo 29 ou "Do que você tem medo?"
Capítulo 30 ou "Os segredos e seus fins"
Capítulo 31 ou "Persuasivo, esse Avelar"
Capítulo 32 ou "Mudança de planos"
Capítulo 33 ou "Invasão de domicílio"
Capítulo 34 ou "Puro"
Capítulo 35 ou "Adeus, velho amigo"
Capítulo 36 ou "Cessar fogo"
Capítulo 37 ou "A última despedida"
Epílogo ou "De volta ao começo"

03.1 | ou ❝eu sou joão jordan❞

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By BrunaCeotto

Por mais que eu detestasse admitir, a minha advogada sabia mesmo o que estava fazendo. Era impressionante o que alguns passeios com Marvin, e algumas idas até a lanchonete para jantar com meu pai e meu tio, em vez de comer apenas os sanduíches para viagem que Arthur trazia depois do expediente, fizeram em favor da minha reputação.

Não que a tabloidização dos jornais de Viveiro fosse mudar só porque agora as notícias sobre mim eram "Valéria Corrêa atira biscoitos para o seu labrador" ou "Valéria Corrêa come hambúrguer vegetariano na lanchonete de seu pai".

Só que agora ninguém mais achava que eu estava me escondendo, o que era maravilhoso não só para a tal reputação que a Dra. Mônica insistia ser importante para o caso, mas também para que os fotógrafos se cansassem de mim e sumissem da minha porta.

Enfim, em paz.

Ou tão em paz quanto eu poderia estar, sendo a manhã do depoimento de João.

Eu não tinha muito o que fazer a não ser esperar. Contudo, eu já tinha atingido aquele ponto em que eu não me importava com o desfecho, senão meramente com o fim de toda aquela angústia. E nem Dra. Mônica, nem meu pai, nem ninguém poderia me convencer a me fazer de boa moça naquele dia, e todos resolveram seguir a vida e continuar com suas atividades cotianas para me deixar sozinha o dia todo.

Eu só queria ficar no meu terraço, tomando sol na espreguiçadeira estrategicamente posicionada lá, enquanto eu entornava um delicioso suco de maracujá goela abaixo e lia uns poemas de um livro da Sylvia Plath que eu roubara da estante da minha mãe pouco antes de deixar Vitória.

Aquele dia levou uns cinco dias para passar. Mas passou.

E lá pelas cinco da tarde, quando eu me toquei que ficar quase oito horas no sol não era bom para uma pessoa, a menos que ela pretenda desenvolver câncer de pele, eu decidi que estava na hora de recolher tudo e voltar para o meu quarto. Joguei uma camiseta por cima de roupa de banho, desci as escadas do terraço para o corredor que dava para o meu quarto, e quase tive um infarto do miocárdio quando passei pela porta.

Bem no meio do meu quarto estava João Pedro Jordan.

O cabelo escuro de João estava maior. A parte da frente quase cobria suas sobrancelhas grossas, e de alguma forma toda aquela moldura de rosto destacava seus olhos castanho avermelhados. Vestia uma calça de moletom e botas de camurça bege, uma coisa que era meio rapper. Estava de braços cruzados, e eu não pude deixar de reparar nos músculos que saltavam por debaixo de camiseta, que definitivamente não estavam ali na última vez em que o vira, em Vitória.

Conclui que ele devia ter parado de jogar futebol por causa das queimaduras na época – assim como Lucas, João também era um atacante, seja lá o que isso queira dizer; as cicatrizes ainda estavam lá, mas as feridas não estavam mais abertas.

Afastei esse pensamento metafórico e respirei fundo três ou quatro vezes.

— Como você entrou aqui?

— Pulei a varanda. — ele deu de ombros. Era quase cômico: o que antes era tão natural, já que Nicholas pulava a minha varanda o tempo todo nos áureos tempos, agora parecia um tanto assustador.

— Você quer me matar do coração. — exclamei, levando a mão ao peito, só para sentir o sambódromo que estava acontecendo nos meus batimentos cardíacos.

— Vale, se eu quisesse te matar, eu certamente escolheria uma forma mais dolorosa de fazê-lo do que através de um susto.

— Eu não sei se você está brincando. — deixei escapar com sinceridade. João tinha uma expressão séria que não lhe caía bem.

Quando João Jordan está sério, pode começar a se preocupar.

— Só porque você é uma imbecil que não sabe ficar de boca fechada, — elaborou ele, dando alguns passos na minha direção, com o olhar fixo no meu rosto — e me implicou nessa investigação estúpida, isso não significa que não sejamos amigos.

Ele me fitou por mais alguns segundos, e a expressão séria que ele provavelmente estava se contorcendo para sustentar por tanto tempo se dissipou. Um sorriso sincero se formou em seu rosto, e os braços cruzados se arreganharam na prévia de um abraço que eu realmente estava precisando.

— João Putão. — minha voz saiu abafada pelo aperto de seus braços fortes.

— Val do Mal.

Eu o abracei com tanta força, e ele me tirou do chão ao retribuir; eu o abracei como há muito tempo não abraçava um amigo.

Aliás, eu o abracei como há muito tempo não abraçava ninguém.

— É bom tê-la de volta. — confessou ele, sem conseguir me soltar.

— Até parece.

Nos olhamos com sinceridade por algum tempo. Eu tentei repassar mentalmente tudo que João sabia sobre a minha parte no incêndio, o que era, basicamente, nada. No segundo em que eu me dei conta de que João Jordan estava em Vitória, eu só quis concentrar todas as minhas forças para fazê-lo se mandar de lá, porque aquela história de misturar dois núcleos da minha farsa não tinha a menor chance de acabar bem.

A grande ironia era justamente o fato de que a colisão dos meus núcleos históricos, a dizer, João e Lorena se pegando, fora exatamente o motivo pelo qual eu havia sido descoberta.

Só não era culpa dele. A culpa era minha, por roubar o namorado da garota que supostamente era minha melhor amiga.

João não sabia de nada sobre o meu papel no incêndio. Ele não sabia se eu tinha tocado fogo na escola, explodido o laboratório, e também não sabia se eu era inocente ou se estava fugindo de alguma coisa. Tudo o que ele sabia era o que ele tinha visto quando se enfiara no meio das chamas para tentar me resgatar, sem ter noção de que eu não precisava de resgate.

E João me avistou enquanto eu fugia para cortar os fios do alarme de incêndio, mas passara todo o tempo tentando acreditar que aquela visão era apenas um delírio causado pela intoxicação de toda aquela fumaça.

Só naquele momento me ocorreu que João não sabia que eu não tinha colocado fogo na nossa escola. Não, tudo o que ele sabia era que tinha me fingido de morta e fugido da cidade para viver em outro lugar.

— Meu advogado diz que sua publicidade está melhorando, agora que você sai de casa. — ele quebrou o silêncio depois de algum tempo.

— Não sei como ele pode achar isso. — devolvi, me sentindo perigosamente feliz por estar conversando com alguém que, de fato, passava pelo mesmo que eu.

— É uma coisa boa, eu acho. Estava começando a ficar realmente irritado com toda aquela atenção que você estava recebendo. — confessou ele, em tom de brincadeira, e meu deu um soquinho amigável no antebraço que, por amigável que fosse, quase me desmontou.

— Pode ficar à vontade para pegar toda essa atenção para você. Eu odeio aqueles caras. — fiz, referindo-me aos paparazzi.

— Acho que eles vão te deixar em paz agora. — assegurou João, e eu não sabia de onde ele estava tirando tanta convicção.

— Não sei não. A maioria das pessoas realmente acredita que eu sou a incendiária.

O silêncio de João só podia ser interpretado de uma forma. Ele não sabia de nada, mesmo. Nem João, nem Nicholas, nem Alan, nem ninguém que não fosse meu pai. Naquela cidade, ninguém sabia o que realmente tinha acontecido no dia do incêndio, ou porque eu tinha fugido, ou de quem... e se é que eu tinha realmente outra razão para fugir que não a minha provável culpa no acontecido.

Para João Pedro, eu podia muito bem ter colocado fogo no laboratório, o que acarretou o incêndio em toda a nossa escola.

Para ele, eu podia muito bem ter matado, por acidente, mais de cinquenta pessoas.

Eu olhei para as marcas em seus braços, que indicavam as antigas queimaduras. Queimaduras adquiridas quando ele tentou me salvar. Não sei de onde tirei forças para perguntar, mas eu não consegui suportar mais um segundo que fosse daquele silêncio sugestivo.

— Você acredita que eu sou inocente?

— É melhor que você seja. — crocitou ele, sem pensar duas vezes — Acabei de dizer a um bando de investigadores que você é.

Eu, que estava de cabeça baixa até então, ergui os olhos para visualizar o rosto dele. E lá estava aquele sorriso que dizia muito mais do que "vai ficar tudo bem". Estava mais para "vai ficar tudo bem, porque eu estou com você".

Pulei no pescoço dele e joguei meus braços pelos seus ombros, e ele me abraçou de volta, gargalhando da minha reação exagerada. E rimos juntos por algum tempo. E eu ri de mim mesma por duvidar que ele me deixaria sozinha.

— Só me promete uma coisa? — pediu João, quando eu finalmente consegui soltá-lo.

— Claro.

— Dá próxima vez que você resolver desaparecer no meio de um incêndio, dá um jeito de avisar os amigos. — disse ele com comicidade, e eu não sabia como ele fazia isso depois de desenvolver estresse pós-traumático com a culpa de não ter conseguido me tirar do fogo e me devolver, sã e salva, para o meu pai.

Só que eu não precisava ser salva. Não do fogo, pelo menos.

— Você é um idiota. — brinquei — Mas eu senti sua falta.

— Não vim aqui para sentimentalismos. — ele girou no próprio eixo, dando uma olhada em tudo o que havia no meu quarto. Demorou-se por um tempo na minha foto com Lucas, e me lançou um olhar enviesado. Eu ergui os braços. Ele perguntou: —Lucas ou Natan?

— Lucas.

— Sabia. Vocês dois são... não sei. Magnéticos.

Eu sorri, e ele revirou os olhos, debochando. Mas eu gostava demais da ideia de ser objeto de afeição de Lucas Avelar para conseguir evitar me derreter ali mesmo.

— Você veio aqui só para tirar sarro da minha cara? — reclamei.

— Eu vim porque estou de saco cheio de ouvir especulações sobre você, e mais de saco cheio ainda de ficar te defendendo. Está na hora de você voltar para a Fundação e se defender sozinha.

Eu levei algum tempo até perceber que ele estava realmente falando sério. Quando me dei conta de que aquilo não era nenhuma piada, não pude evitar cair numa gargalhada barulhenta e incessante.

— Você só pode estar brincando comigo. Eu, na Haroldo Santini. — eu gargalhava tão intensamente que quase engasguei com meu próprio riso — Você é demais, João.

— Não estou brincando. — a expressão em seu rosto era séria. Séria de verdade, não um falso sério, como eu tinha visto mais cedo. Essa era uma das raríssimas ocasiões em que João Jordan não estava estrelando seu próprio seriado de comédia ruim.

— Eu vou ser linchada se voltar a estudar lá.

— Bom, eu não me conformo com o fato de que você voltou a morar aqui e a gente nunca se vê. — falou João, e seria bonitinho, se não fosse uma insanidade terrível.

— Não estávamos nos vendo por conta do seu depoimento, João.

— O qual já foi dado. — rebateu ele — Agora eu quero de volta a vida normal de antes dessa droga de incêndio, na qual éramos melhores amigos e nos víamos todos os dias.

Ele transferiu o peso para a perna esquerda e levou as mãos na cintura, numa imitação quase que perfeita de mim mesma quando não tenho o que eu quero.

— Depois da audiência preliminar, eu vou pensar. — cedi, na medida do que podia ser cedido — Tenho que esperar a decisão do juiz. A minha vida não é mais minha, eu não posso nem sair de Viveiro se eu quiser. Estou totalmente à mercê das investigações.

João deixou os ombros caírem ao longo do corpo. Não tinha o que argumentar. Claro que eu não ia dizer a ele que, mesmo que o juiz assim determinasse, eu preferia engolir uma tigela de lesmas do que voltar para Fundação. Mas por ora, aquilo bastava.

— Você realmente achou que eu ia te incriminar? — perguntou ele, franzindo as sobrancelhas.

—Não de verdade. — admiti com honestidade. Só que, se tem uma coisa que eu aprendi desde que voltei para Viveiro, é que quando você é objeto de uma investigação criminal, ninguém te dá muita opção de escolha — As coisas têm estado muito loucas ultimamente.

João Pedro deu uma olhadela no relógio de pulso e pareceu espantado com o horário. Ele teria de ir para a escola no outro dia. Se despediu de mim rapidamente com mais um abraço, que eu não queria soltar.

— Você está com medo.

— Um pouco. Você?

— Eu sou João Jordan. — disse ele, passando uma perna pela grade da varanda, e a outra logo em seguida — Eu não tenho medo de nada.

E com uma piscadela, ele desapareceu varanda-vizinha adentro.

Eu senti sua falta no segundo em que ele desapareceu. Era bom conversar com alguém que não ficava tentando transformar toda a situação em um melodrama.

Voltei para o quarto, e reparei que um celular gigantesco em cima da minha cama. Só podia ser de João, porque eu ainda usava o primeiro celular que eu tinha ganhado do meu pai – que faz ligação e manda mensagem, sem necessidade de toda aquela firula.

— João, você esqueceu o seu...

Eu não tinha como avisá-lo que seu celular estava comigo, afinal, seu celular estava comigo. Teria de esperar até o outro dia, a menos que João desse falta dele antes.

Foi aí que a tela do aparelho se iluminou, e eu não pude deixar de olhar.

Era ainda mais impossível não reparar que João estava recebendo uma mensagem. Uma mensagem de "você vem aqui em casa hoje, certo?". De uma garota.

Uma garota que não sua namorada.

Ah, João Pedro.

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