(Revisado)
— Vocês não vão dizer nada? — Tália encarando os três a sua frente indagou. — Vamos, digam alguma coisa... Ou querem que eu repita tudo de nov...
A sua voz saía prepotente e cheia de ironia, quando já cansada de ouvi-lá, Elise lhe desferiu um grande golpe em seu rosto.
— Cale a boca! Apenas cale a boca! Me diga, onde está a Bela? — Indagou firme, ainda sentindo a palma de sua mão direita queimar devido ao forte tapa que havia deixado marcado no rosto daquela mulher.
— Você tem que se decidir. —Dera um sorriso arrogante, passando a mão em seu rosto tentando aliviar a dor. — Quer que eu cale a boca ou diga onde está Wanda? Não posso fazer os dois ao mesmo tempo.
— Sua desgraçada! Me diz onde está ela. — Com o coração coberto de ódio, ela pulsava como um cão raivoso, que tenta a todos os modos ferir sua presa.
— Ela vai nos contar onde está minha irmã. — Adryan falou, enquanto evitava que Elise outra vez fosse para cima de Tália.
— Está bem aqui, irmãozinho. — Falou com sarcasmo, apontando para si própria.
— Você não é minha irmã! — A sua voz saíra em tons metálicos, Adryan que tentava de todos os modos se manter controlado via a cada minuto que passava seu corpo ser dominado apenas pela raiva e o ódio. — Nunca mais diga isso para mim. Nunca mais!
— Não posso fazer isso. — O coração de Tália apenas transmitia sentimentos ultrajantes, nada de bom surgia de suas palavras. — Você não pode dizer que não sou sua irmã só porque não me conhece, não de verdade.
— E quem seria você de verdade? — Camile que andava em círculos perguntou. — Vamos, nos diga. Quem é você, Tália?
— Olha só, achei que você não estava curiosa para saber de nada. — Respondeu com a ironia já conhecida de suas palavras. — Mas vou responder sua pergunta, afinal, vocês têm o direito de saber quem sou eu.
Disse, deixando todos os três num estado de silêncio total, querendo de fato entender o que estava acontecendo naquele lugar, a altas horas da madrugada adentro.
— Vocês estão tensos, olhem só para isso, quase não piscam. — Falou, achando graça daquele momento, notando no olhar de cada um deles a apreensão pelo que iria vir a seguir.
— Apenas responda, Tália! — Adryan lhe cortou as palavras com um tom de voz áspero, tão acre que o mesmo pudera sentir o sabor amargo de suas palavras a lhe atingir como fel.
— Você se lembra do dia em que Wanda nasceu? — Indagou, encarando firmemente para dentro dos castanhos olhos de Adryan...
— ...Então você deve se lembrar que você não foi ao hospital, não é mesmo? — Continuou, após Adryan acenar levemente com a cabeça num gesto que dizia sim. — Antes mesmo de eu nascer, nossos pais já sabiam que seriam gêmeas, porém fizeram de tudo para encobrir as coisas, nenhum detalhe foi esquecido e até mesmo você foi impedido de ir ver o parto, por isso insistiram tanto para que ficasse em casa naquele dia.
— Isso não faz sentido, porque eles iriam querer que você não fosse parte de nossa família?
— Você realmente não conhece os pais que tem, Adryan. — Disse, deslizando sua mão por seu cabelo, fazendo os fios negros bailar entre seus dedos. — Eles já sabiam sobre os indiferentes, sabiam que a cada novo casal de gêmeos que nascia um vinha com o código genético alterado, carregando assim o “I” em seu DNA. E então quando Wanda e eu nascemos, fizeram testes para saber qual de nós duas seria a sortuda.
— Sortuda para quê? — Elise perguntou já igualmente confusa com toda aquela história.
— A sortuda que iria servir de cobaia para eles. De onde você acha que veio tudo isso que você tem? — Disse olhando para Adryan naquele momento.
— Tudo isso que eu tenho, o que?
— Você é um dos indiferentes, disso todos nós já sabemos. Mas você apenas é um, pelo fato de ter sido uma cobaia. — Disse. — No final, não somos tão diferentes um do outro, irmãozinho.
— Mas você está errada sobre uma coisa. — Falou, notando que algo naquela história não se encaixava. — Não tem como isso ser possível, a algum tempo atrás eu descobri que o meu DNA foi alterado quando eu ainda estava na barriga de minha mãe, não existe verdade no que você diz.
— Você tem mesmo certeza disso? — Indagou irônica, balançando sua cabeça de um lado para o outro num gesto de negação.
— Do que você está falando? — Camile que agora já havia se sentado num das cadeiras que existia na cozinha perguntou, não compreendendo o que Tália dizia naquele momento.
— Acho que você deveria voltar ao dia em que achou aquele diário, Adryan. — Ela falou, notando em seguida o espanto surgir nos olhos dele, afinal só existia duas pessoas que sabiam de tal diário, e uma delas estava bem longe no momento. — Ah sim, eu sei sobre o diário, sei também sobre o porão do escritório de Cristian na antiga casa.
— Como... Como você sabe disso? — Tropeçou em suas palavras naquele instante, seu coração já acelerado não sabia o que fazer.
— Isso não importa, o que importa agora é você voltar alguns anos no tempo e lembrar com toda clareza do que realmente viu no dia em que achou aquele diário, aquele porão.
— Eu me lembro com clareza de tudo. — Disse firme, seu olhar no entanto dizia o contrário, era de desconfiança, Adryan não entendia aquele pedido.
— Eu acho que não, senão você saberia do que eu estou falando.
— Mas o que é que está acontecendo aqui? Chega dessa palhaçada, fala de uma vez o que você quer, já não basta enganar todos nós, agora tem que vir com suspense em cada frase?
Elise já cansada de escutar uma história que pra ela era nova, desabafou, não suportando ouvir aquela enrolação sobre o que de fato Tália tinha a dizer.
— Wanda me contou sobre você, disse que era meio esquentada e sem muita paciência. — Falou, deixando outra vez um sorriso ao lado de sua boca se formar, a mesma fazia de tudo para lhes tirar do sério com seus jogos mentais, e facilmente conseguia.
— Vamos responda, o que você quer dizer com tudo isso? — Adryan retrucou, logo após pedir que Elise se acalmasse.
— Tudo bem, já que você não é capaz de lembrar sozinho eu vou dar uma ajuda para refrescar suas memorias. — Disse. — No dia em que você descobriu sobre o porão do escritório, certamente soube que os experimentos foram reais e que Peter dizia a verdade sobre tudo. Deve ter descoberto também que quando ainda era um bebê em gestação foi aplicado injeções para que seu DNA mudasse, o que você está esquecendo é que tais injeções não eram para te tornar um indiferente, era para que no futuro você pudesse criar conexões com outras pessoas.
Como num filme, ele viu-se outra vez naquele porão, as palavras dela foram como um gatilho em suas memorias, não estavam esquecidas, todavia eram embaçadas, como alguém que vê através de um nevoeiro, sem conseguir enxergar com clareza, e de repente, um sopro se faz presente e a cortina de fumaça se dissipa e todos podem ver com grande nitidez.
E assim fora ele naquele momento.
“Essa foto... Aqui diz que quando você estava na barriga de sua mãe seus pais injetaram uma substância que lhe permitiria criar conexões com as pessoas.”
Seu olhar captava tudo como se o mesmo estivesse a presenciar tudo àquilo ao vivo, era tudo real e ainda naquele mar de devaneios, Adryan se viu conversando com Anne naquele porão de fotografias pregadas nas paredes e anotações que o mesmo não entendia tão bem, sendo salvo de sua ignorância por Anne que lhe explicou tais coisas.
“09 de outubro de 2018. O paciente Adryan Fritz se mostra uma verdadeira obra prima da biogenética. Entrando na vida adulta sem nenhum questionamento...”
Naquele momento ele acabava de se ver lendo uma das páginas do diário de seus pais, e então havia entendido o que Tália tanto queria lhe dizer. E como num passe de mágica, ele retornou de sua pequena viagem mental.
— Antes de você nascer eu era apenas um outro experimento. — Disse, ainda baqueado com tudo que havia se lembrado. — Foi depois do seu nascimento que eu comecei a ser modificado para me tornar um indiferente.
— Você era para ser alguém capaz de criar conexões, seria aquele que iria ser capaz de se adaptar a qualquer pessoa, e isso lhes traria facilidade para recrutar aqueles mais resistentes, você Adryan, iria servir como um meio facilitador para criar empatia com quem eles desejassem. — Tália lhe respondeu.
— Então tudo mudou... Quando eles souberam que iriam ter gêmeos sabiam que poderiam fazer novos experimentos comigo, já que meu DNA se apresentou resistente as injeções de quando eu ainda era um bebê.
— Sim, eles viram naquela gravidez uma chance de replicar o código genético, e quem melhor do que um filho que já foi feito de cobaia? — Ela disse. — Por isso eu fui a sortuda. Foi eu que nasci com o código indiferente, foi a partir de meu DNA que eles fizeram isso com você, eu cresci a vida inteira em um laboratório. Como você já deve saber, nossos pais trabalhavam para o Pasquin, e então depois que eles morreram, Marc continuou a me criar dentro de um laboratório, até o dia em que a filha dele entrou no seu caminho, era a chance dele descobrir tudo sobre você.
— Foi quando você apareceu naquele dia, logo após Anne chegar na minha casa, nada daquilo foi coincidência. — A voz saíra tímida, tentava achar forças no meio de todo aquele lamaçal, todavia as mesmas tinham ido embora e agora com clareza ele via nitidamente as peças se encaixarem uma a uma, cada passo de seu passado lhe levou até aquele momento, nada fôra por acaso.
— E foi quando ela te deixou. — Tália disse, olhando para dentro das lentes redondas do óculos de Elise. — No dia em que ela saiu da sua vida foi o dia em que eu assumi a vida dela, ela nunca quis te deixar e sempre perguntava de você, pergunta até hoje, porém com menos frequência, mas ela sempre te amou.
Disse, e pela primeira vez a mulher de olhos castanhos notou uma dose de sinceridade nas palavras de Tália. Seu olhar logo se encheu de lagrimas e deixando escorrer em seu rosto, sentiu a saudade de Wanda apertar mais forte seu coração.
— Então por todo esse tempo você trabalha para Marc, o lance do Peter e cada encontro nosso... — Ele deduziu.
— Sim, foi ele que depois de tudo que aconteceu comigo me deu a chance de sair e viver, mesmo que fosse uma vida fora do comum e que não fosse totalmente minha, mas você tem que entender que para nossos pais eu sempre fui apenas um experimento, nunca fui uma filha.
—E cadê ela? Onde está a verdadeira Wanda? — Camile perguntou, sempre tão direta em suas palavras.
— Acho que vocês já tem a resposta. Wanda está no setor trabalhista, Marc a colocou lá. Eu só apareci outra vez porque ele me pediu, não era minha intenção ver mais nenhum de vocês.
— Você precisa me ajudar a tirá-la de lá.
Adryan falou, sua voz deixava transmitir todo o sentimento que existia em seu peito, seu olhar em desespero por saber que na verdade Wanda ainda estava no setor trabalhista fizera uma súplica em silêncio para que Tália o ajudasse.
— Você deve está confundindo as coisas Adryan. — Disse com o tom de voz sincero e cru. — Tudo que contei foi necessário, eu não ganho nem perco com nada disso, não sou nenhum anjo da guarda que irá te ajudar, não vou arriscar minha vida pra salvar a dela. — Falou ríspida e sem nenhum sentimento por Wanda.
— A Bela é sua irmã!
— Eu não tenho irmã. Não tenho irmão. Não tenho pai nem mãe, tudo que eu tenho é nada! A vida inteira fui tratada como cobaia enquanto todos eles viviam suas vidinhas de família perfeita. Sinto muito, não posso ajudar. Na verdade eu não sinto nada. — Falou, deixando tão claro como a luz do dia que sequer moveria um dedo para ajudar Wanda.
Elise já começava a gritar outra vez quando ao seu lado Camile num súbito desmaio fôra cair ao chão, seus olhos negros se fecharam e sem aviso prévio o corpo dela tombou no piso da cozinha. Aquela já era a segunda vez que a mesma entrava num desfalecer inesperado, algo de errado estava acontecendo.
Adryan apenas lhe gritou pelo nome e fôra em sua direção, a pegou no colo e a tirou do chão frio que havia caído, assim com mais um problema em suas mãos a levou até o sofá da sala e lá ficou a observando por poucos segundos, sabia que tais desmaios não eram normais, no entanto, nada ali estava no lugar, estava tudo uma bagunça.
Um emaranhado de segredos começava a se mostrar outra vez para ele, e com Camile deitada no sofá ele percebera, a vida toda dele havia sido um grande mentira.