Prólogo

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O dia já havia clareado e o sol invadia as janelas das construções da cidade siciliana. Atravessava inclusive os espessos vidros que compunham a moderna arquitetura do hospital. Em um daqueles quartos, por fim, um homem acorda. Naquele instante, abriu os olhos e deparou-se com o sol brilhante que entrava pela janela e iluminava seu rosto. Baixou o olhar e observou o estreito feixe de luz amarela desenhado sobre o piso do quarto e em seguida esfregou os olhos numa tentativa de enxergar melhor em meio à claridade matinal. No instante seguinte, recordou-se de sua solidão. Era uma visitante insistente que recusava-se, todos os dias, a sair pela porta. Nunca gostara de ficar sozinho, nem mesmo em sua adolescência. Mas agora, já não havia mais opção. Era melhor que tudo continuasse daquela maneira.

Aquele seria mais um dia naquele angustiante hospital. Ouvira sempre, dos mais velhos, que a vida é curta, que o tempo passa rápido. Quem tem de viver em um lugar como aquele não ousa proferir tal equívoco. Os rumores que escutava com frequência pelos corredores eram súplicas para retornar à casa, ou preces para deixar, de uma vez, aquele mundo. Era como uma prisão, onde as horas se alongavam e o tempo natural de um dia assemelhava-se ao de um inteiro mês. Teve vontade de apagar ao pensar que iria continuar preso sabe-se lá por mais quantos dias até seu quadro se estabilizar. Sentiu um calafrio percorrer lentamente sua espinha ao lembrar-se de sua situação. Nunca poderia esperar que aquilo acontecesse com ele. Nunca ninguém espera.

Deixando os pensamentos de lado, o homem reuniu suas forças, apoiou o peso de seu corpo sobre as mãos e virou-se para a esquerda. Acompanhando seus movimentos, a cama hospitalar rangeu, o que o levou, mais uma vez, a cogitar ser o som de seus ossos, quase atrofiados por ficar horas deitado naquele rígido colchão. O movimento realizado, enfim, deu-lhe a visão incomum da outra extremidade daquele quarto. De imediato, se espantou ao ver a silhueta de uma garota sentada de frente para ele na cama ao lado. Cama que desde quando chegara estava vazia.

- Ciao - saudou ela no idioma italiano, percebendo a confusão em seus olhos.

No momento ele nada disse, apenas permaneceu a observá-la com o olhar surpreso característico de quem via algo inusitado. Notou também que a mesa de cabeceira posicionada entre as duas camas havia sido redecorada com um vaso de tulipas amarelas verdadeiras e umas dez bonecas "Barbie" enfileiradas. A garota era ruiva, magra, tinha os olhos verdes e os cabelos ralos. Suas bochechas levemente rosadas eram cobertas de sardas. Vestia uma blusa listrada colorida, calça jeans e um tênis cor de rosa. Segurava um livro nas mãos. Provavelmente estava lendo antes de vê-lo acordar.

O homem percorreu o olhar pelo quarto procurando por mais alguém. Ninguém.

Ciao - respondeu ele, por fim - Quem é você?

- Meu nome é Stella.

- Você está sozinha aqui, Stella? - indagou ele, usando as palavras carinhosamente.

-Não, minha mamma foi buscar o meu ursinho - a menina voltou os olhos para as páginas - Já está voltando.

- Entendi.

Ele sorriu com gentileza. Sempre fora louco por crianças. Porém, entristecia-se por ela se encontrar no mesmo lugar que ele.

- E você, quem é? - perguntou ela.

Ele continuou a olhá-la.

- Quantos anos você tem? - indagou ele novamente.

- Tenho oito - ela o encarou - Não vai responder minha pergunta?

- Por que tenho que respondê-la? - brincou.

- Se não quiser não precisa responder - ela deu de ombros.

La Melodia ProibitaWhere stories live. Discover now