Agulhas de Estanho

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Foram necessários alguns dias para Argos conseguir convocar uma reunião da célula de caçadores da qual fazia parte. Todo procedimento com envio de mensagens e contra-mensagens visava manter a segurança de que somente os membros compreenderiam a mensagem final que indicava o local e hora da reunião. O caçador estava apreensivo, pois se o Major Drakeen estivesse certo, tudo estaria esclarecido e teriam um terrível inimigo para confrontar.

O horário era uma e trinta da madrugada, o local, um armazém da companhia de minérios de Durkheim onde Argos Vseldoff mantinha um emprego de fachada. Era sua noite de vigília e o armazém certamente estaria vazio.

Argos havia deixado a porta lateral aberta e os aguardava sentado no escritório no segundo andar. A luz na escritório e do corredor eram as únicas luzes acesas no amplo armazém. Argos era um dos caçadores mais jovens. Sua ordem demorava a aceitar novos membros e crescia muito devagar. Ele não tinha amigos e não era dado a vícios. 

Na maior parte dos casos, a profissão de caçador vinha da família, mas não no caso dele. Quando criança, sua família foi morta por um gênio maligno e ele foi o único a sobreviver. Ele foi salvo por um caçador que o adotou. O velho, que se fez segundo pai de Argos, tomou-o como aprendiz do ofício. Argos era dedicado e aprendia rápido. Com a morte do velho caçador, Argos adotou alguns de seus maneirismos e sua maneira de vestir. Mesmo no verão, não largava seu casaco de couro negro. Sempre vestia camisas claras, beges, brancas ou cinzentas. Usava o pequeno chapéu com viseira enterrado na cabeça para esconder um pouco o rosto. Seus olhos negros eram esbugalhados e sempre tinha barba rala por fazer. Ele tinha um jeito peculiar de olhar, muito fixo e compenetrado e isso incomodava quem conversava com ele, e muita vezes, até ocasionais transeuntes.

Cerca de dez minutos após o horário combinado, os cinco membros da célula chegaram ao escritório. Sentaram-se todos ao redor de uma mesa antiga e pesada. Todos eram mais velhos que Argos, variando entre quarenta e sessenta e poucos anos. Argos já havia caçado com cada um deles, ao menos uma vez. Eles eram bons, mas o jovem desprezava suas fraquezas em relação ao cigarro e bebidas. Vaksil, o mais velho, ofereceu-lhe uma bebida — Não quer um trago?

Argos torceu os lábios ao sentir seu hálito carregado. Vaksil tinha o rosto muito marcado. Era difícil de ver onde começavam e acabavam seus fios de cabelo brancos e loiros. Os olhos verdes denotavam experiência e tinha dentes amarelos e tortos. Era muito magro, mas vigoroso, pois certamente seria capaz de dar uma surra em qualquer rapaz de vinte anos.

— Ele não bebe, Vass! — Sacha bateu em suas costas. Ele era bem humorado e sociável. Um bruta-montes de fartas barbas crespas como seus cabelos castanhos. Dificilmente passaria por um durke, mas ninguém sabia se ele era estrangeiro ou não. Usava roupas simples de operário, mas atrás daquela cara amigável, estava o caçador mais impiedoso que Argos conhecia.

— E então, Fraldinha, por que a reunião? — Patru zombou, mas foi direto ao ponto. Ele era careca e tinha a face esquerda desfigurada exibindo um emaranhado de cicatrizes. Usava trajes escuros e sujos e esticados contra a pele devido a seu excesso de peso, sendo sua barriga especialmente volumosa. Tinha a aparência de um estivador portuário.

Gormia estava calado até então. Usava um traje de corte militar, mas tingido de marrom. Tinha cabelos alaranjados muito bem aparados e olhos violetas que permaneciam semi cerrados, e seus lábios pressionados. Sua expressão era de constante insatisfação, não era de muitas palavras, mas era o caçador mais habilidoso que Argos conhecia.

Argos retirou um envelope da jaqueta e colocou sobre a mesa e anunciou.

— Encontrei o covil dos Vorn-Nasca! Os detalhes estão aí...

Vaksil deu um gole duplo na sua garrafinha de aguardente. Sacha coçou a barba e zombou — O Fraldinha só pode estar pregando uma peça!

Argos estava ansioso... Será que seu plano daria resultado? Se estivesse errado aquilo tudo poderia lhe custar muito caro.

A Queda de DurkheimWhere stories live. Discover now