CAPÍTULO IX - Parte 1

128 30 47
                                    

Hallam guiava seu navio pelo grande canion que dava acesso ao continente. As águas eram azuis como o céu, cristalinas, o que permitia visualizar o fundo do grande rio e os cardumes coloridos que nadavam ali. Sallah estava na proa do barco, apreciando a nova paisagem. Agora ela tinha imagens reais de algumas histórias de seu avô. Ele já estivera ali. As enormes paredes mostravam as diferentes cores de camadas rochosas do continente, intercaladas em tons de marrom escuro, marrom avermelhado e um vermelho argiloso. Em sua base, nas margens do rio, a grama já não apresentava mais seu tom verde vívido, consequência da Época de Mahina que estava à um ciclo de começar.

Antares estava a pico, a tripulação almoçava no interior do navio e, além das duas mulheres, haviam apenas dois marujos de prontidão no convés. Lucius subiu à ponte procurando pela amiga - estavam desde a tempestade sem conversar direito-. Karin ficara no quarto - muitos dias em alto mar não estavam lhe fazendo bem -. Ele cumprimentou a capitã apenas com um meneio respeitoso de cabeça, parando ao lado dela por um instante, enquanto olhava por alto onde Sallah estaria.

- Ela ainda está magoada com você, não está? - Hallam o questionou sem desviar a vista de sua rota.

- Senhora? - ele virou-se para a mulher, que no mesmo instante o fuzilou com o olhar por conta do tratamento usado.

- Vejo tudo daqui de cima... Ela teve os motivos dela para fazer o que fez e você, ao invés de aceitar, ainda a chamou de "louca"... - explicou, com seu foco voltado para o caminho.

"Não só vê, como ouve", Lucius pensou surpreso.

- Ela provavelmente não teria ficado aborrecida se não gostasse de você... - continuou.

O rapaz corou:

- Ela lhe falou alguma coisa...?

- Certas coisas não precisam ser ditas... - ela voltou a olhar para o rapaz, dando uma piscada com seu - charmoso - olho esquerdo.

Sem mais palavras ditas, Lucius agradeceu gestualmente pela curta conversa. Desceu da ponte e deu uma leve corrida até a amiga, diminuindo o passo conforme se aproximava. Os cabelos dela estavam soltos, dançando ao vento, e tinha uma expressão serena no rosto.

- Sa...?

Ela apenas virou-se para o jovem que chegava, colocando o cabelo que lhe cobriu o rosto atrás da orelha.

- Me desculpe... Eu fui um babaca, não fui? - estava genuinamente arrependido - Eu...

Sallah primeiro arregalou os olhos - não esperava o pedido de desculpas, afinal fora uma loucura o que fez -, depois desandou a gargalhar. Sua risada era muito gostosa de ser ouvida e Lucius não soube como reagir.

- Está desculpado só pelo "babaca"... - disse quando se acalmou, limpando uma lágrima que se formara no canto do olho.

Lucius sorriu, colocou uma mecha do cabelo da jovem para trás da orelha esquerda dela e acariciou-lhe a mesma face:

- Não me perdoaria se algo lhe acontecesse... - ele disse aproximando-se dela.

Sallah corou, fixando seu olhar no do rapaz. Ela não tinha certeza de como reagir àquilo, seus batimentos cardíacos aceleravam a cada centímetro que ele se aproximava. Por fim desvencilhou-se do jovem ao se assustar com badalar do sino anunciando que Tangmar estava ao final do canion.

_________________________________________

A grande cidade portuária era provavelmente o dobro da anterior. Suas construções acompanhavam as altas paredes do canion, desde o nível da água até seu topo. Tangmar ocupava toda a formação geológica e seus patamares, com grandes escadas que pareciam ser esculpidas diretamente nas rochas. Algumas tortuosas árvores de troncos estreitos, aderidas ao substrato, formavam corredores pela cidade. Seus galhos secos não proviam sombras, mas na Época de Antares completavam lindos arcos esverdeados.

Desembarcaram enfim. Despediram-se da capitã, e esta acabou abraçando Sallah mais demoradamente. "Se um dia quiser se juntar a nós, será muito bem vinda", falou em seu ouvido e quando a soltou, deu uma piscadela sorrindo. A mais jovem retribuiu o sorriso e agradeceu ao convite. A maior parte da tripulação acenava de cima do barco, enquanto alguns que descarregavam mercadorias no pier acenavam dali.

Caminhavam em direção a entrada da cidade, constituída por um grande arco rochoso, cuja grama subia até um quinto da construção, dando continuidade à uma muralha natural que contornava parte da lateral esquerda do reino, quando um jovem de cabelos castanhos, puxando seu próprio cavalo, os alcançou:

- Você é a moça que salvou o marujo, não é? - questionou, passando a caminhar ao lado dela.

- Ahn... Sim... - sorriu sem graça.

- Como fez aquilo??

- Ela é uma ótima nadadora. - Lucius, que estava do outro lado da jovem, interviu na conversa.

Sallah sacou a resposta: não deveria falar sobre a pedra. A pedido deles, Hallam ordenou à tripulação que vira o ocorrido a nunca tocar no assunto - e ordem dada é ordem cumprida para aquela mulher -, então provavelmente o curioso homem não sabia de fato sobre a joia.

- Eu pulei na água, mas foi Lucius quem nos puxou de volta para o navio.

- Compreendo. Oh. Que deselegância... Não me apresentei. - ele disse esticando a mão para cumprimentar a nova conhecida - Amroth...

- Sallah. - ela retribuiu o gesto atenciosamente, e enquanto apertavam-se os punhos, notou as orelhas pontudas escondidas sob os cabelos desfiados na altura do queixo do elfo.

- Lucius... - confirmava o nome do humano , que acentiu com a cabeça - E a linda jovem no cavalo?

Karin era a única montada. Estava sofrendo do mal do desembarque após tantos dias em alto mar e não se sentia bem para caminhar. A tontura tomava-lhe conta do estômago. Ainda não havia vomitado, mas sentia como se fosse fazê-lo a qualquer momento. Deu um sorriso sem graça e apresentou-se.

- Estimo as melhoras para a senhorita. - soou gentil - Nos vemos por aí... - ele acenou e acelerou o passo.

Eles subiram um longo lance de escadas e após um tempo de busca encontraram vagas em uma taverna. Deixaram suas coisas nos dois quartos locados e Karin logo se apossou da cama. Definitivamente não estava bem. Sallah pediu uma sopa para a amiga, que depois de algumas colheradas e uma forte ânsia dispensou a cumbuca. A enferma queria apenas tentar dormir, e a outra jovem decidiu que ficaria por perto, caso a primeira piorasse. Ela acompanhou Lucius até a porta do quarto um pouco sem jeito ainda pelo que acontecera mais cedo e, escondida atrás da porta que fechava, se despediu. 

***

Gente, esse capítulo está mais curtinho então o colocarei em apenas duas partes!

Espero que estejam gostando até aqui. E não me matem! Huahuahuahuahua XD

Silver Leaves - O Dragão Negro (COMPLETO - SEM REVISÃO)Where stories live. Discover now