•Flores•

44 9 63
                                    

A grande catedral não estava muito cheia, no entanto, parecia que os sentimentos que inundavam Rodrigo fugia de dentro do seu peito e ocupava todo o espaço

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.

A grande catedral não estava muito cheia, no entanto, parecia que os sentimentos que inundavam Rodrigo fugia de dentro do seu peito e ocupava todo o espaço. Olhou para sua mão e para dentro da igreja novamente, quantas vezes voltaria ali e não seria ele o noivo?

Em uma das mãos segurava um corote de pêssego já no fim e na outra um convite de casamento com as iniciais D & R bordadas. Sentia vontade de rasgar aquele convite idiota, porém saber que Renata já tinha tocado ali, que ela mesma tinha escrito aquelas palavras fazia do papel especial.

O sino da igreja badala. Dezesseis horas. Logo irá iniciar mais uma cerimônia como se todo o mundo estivesse no modo repetição. Alguns convidados desviam dele para passar pela enorme entrada e mesmo apressados não deixam de lançar um olhar de repugnância. Uma moça que provavelmente era uma das cerimonialistas se aproxima de Rodrigo notando que ele poderia causar problemas.

- Posso ajudá-lo? - Ela pergunta gentilmente.

O gesto assusta Rodrigo, há muito não era tratado com tanta atenção, pensou que não receberia nada além de berros e gritos.

- Não. Você não pode, ninguém pode.- Ele responde por fim depois de alguns instantes em silêncio.

Hoje, não muito diferente dos outros dias da semana, Rodrigo se sentia despedaçado assim como o cravo da canção. Renata sempre o comparava com Perpétuas, segundo ela essas flores têm uma beleza única e se destaca entre as demais e além disso são fortes e resistentes. Mas depois dela não se sentia uma Perpétua, ele era um Cravo em pedaços.

- Conhece a noiva?- Ela tenta continuar a conversa, pelo jeito era uma daquelas pessoas que achavam que tudo se resolvia no diálogo e usaria essa arma até o fim.

- Ela é só mais uma noiva, quantos casamentos acontecem aqui por dia? Três? Quatro? Tanto faz quem é a noiva. - As últimas palavras saem em uma mistura de sussurro com soluço.

Ela nota o convite nas mãos do moço embriagado e o toma sem muita dificuldade.

- Deixa eu ver o convite. - Ela lê. Para. Olha para o homem e agora no olhar dela tinha apenas pena, por algum motivo pensava que aquele moço precisava de ajuda.- Sabe que esse casamento foi há sete meses, ? No dia 27 de julho.

As palavras saiam com muito cuidado, como se ela tivesse medo de ferir.

- Sete meses... Ela era como você, ótima com datas. Sabia a data da primeira vez que me viu, do primeiro encontro, a primeira briga... Não era apenas com os dias que ela era boa, na ve-verdade, é mais fácil dizer no que não era.- Lágrimas começam a escorrer no rosto coberto de acnes, era impossível imaginar que um homem tão grande e forte seria capaz de ser tão sensível. As palavras saiam atropeladas e acabava sempre gaguejando não se sabe se pela embriaguez ou pelo choro.

- Ela parece especial, qual o nome dessa mulher incrível? - Ela pergunta tentando suavizar a conversa. Não conseguiu ficar muito tempo calada vendo-o chorar.

- Renata. Sabe o que o nome Renata significa? - Ele questiona.

- Não sei. - Talvez ela fingisse bem, entretanto parecia realmente interessada na conversa.

- Nada é para sempre.- Ele faz um gesto com a mão direita como se estivesse declamando um poema.

Ela sorri, com certeza não era isso que significava. Qual mãe colocaria esse nome na filha? Olha para os lados e vê a limusine da noiva se aproximando, precisava finalizar a conversa.

- Bem, talvez a morte seja para sempre.

Ele arregala os olhos e ela deseja com todas as forças voltar no tempo e não ter dito aquilo. Mas foi apenas por um flash de momento, logo ele suavizou a carranca e voltou a falar.

- Ela já foi minha. Mas eu a perdi, para sempre. Quando começamos a namorar eu prometi a mim mesmo que subiria com ela ao altar, só não imaginei que seria para casar com outro cara. - Ela não conseguiu segurar o espanto. Aquilo era horrível, ninguém deveria passar por isso.- Sabe? Eu sou um trouxa. Eu tinha Renata, mas a traí. Fiquei uns três dias sentado ao pé da janela do seu quarto, dia e noite, esperando o perdão, mas se nem eu mesmo achava que merecia ser perdoado por que ela me perdoaria? Com o tempo a raiva foi diminuindo e ela concordou em continuar me vendo, mas como "amiga" - Ele faz aspas com as mãos e imita de forma cômica a voz dela.

- Sinto muito.- E parecia de verdade sentir, obviamente ela concordava que trair não foi uma boa atitude por parte dele, entretanto o homem parecia realmente arrependido. E se existisse apenas um par para cada pessoa na Terra e ele tivesse perdido o seu?

- E eu nunca mais tive outra oportunidade de falar que a amava. - Ele deixava as palavras escapulir da boca e parecia estar em outro mundo só seu dentro da própria cabeça.

- Então faça! Diga pra ela que a ama. Compra as flores que ela gosta e faça uma surpresa.- Ela bate no ombro dele.- Estou torcendo por você.

- Flores.

A marcha nupcial começa tocar lá dentro da igreja e a cerimonialista corre de volta para seu posto. Rodrigo fica ali parado para alguns instantes e depois decide sair.

Dizem que o luto seja ele o de morte propriamente dita ou do fim de um relacionamento possui 5 fases: negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. Rodrigo se encontra na quarta fase e enquanto monta desajeitado em sua moto pensa em como pular logo para a quinta, não aguentava mais se fechar dentro do próprio mundo, porque estava se afogando dentro dele mesmo.

Ele liga a moto e vê o velocímetro subir rapidamente, não importava o quão rápido estava só queria ver os números aumentando assim como sua dor crescia gradativamente.

Aceitação. Precisava alcançar a aceitação.

Ele para em uma floricultura e compra várias Perpétuas. Iria dizer que amava Renata, mas sabia que a resposta não viria.

A visão dele estava embaçada devido as lágrimas e por isso não conseguia desviar dos vários buracos na avenida, logo mais chegaria no cemitério onde Renata estava enterrada. Nunca chegaria na aceitação, como se aceitaria sabendo que deixou que outro casasse com Renata, que esse outro a matasse?

85 km/h.

90 km/h.

105 km/h.

Rodrigo tenta desviar de um imenso buraco e acaba colidindo frontalmente com um carro e morre ali mesmo no local. As pequenas Perpétuas todas espalhadas pela avenida como se estivessem enfeitando o cenário. Se sofreu? Talvez já estivesse morto há muito tempo.

"Às vezes o que uma flor pode fazer de melhor é morrer".

The Witcher

A GAROTA QUE SE PERDIA (CONTOS)Where stories live. Discover now