A beira do abismo (31)

2.9K 374 80
                                    


Confesso que queria de todas as maneiras, agradar a Ayla, porém, parecia que ela não sentia vontade de fazer nada, 'medo' sempre vem essa palavra em minha mente para cada reação acanhada, ou amedrontada dela.

Despertei do meu devaneio ao ouvir meu celular tocar, apertei o botão do volante do carro e o atendi, era Paula, tratei logo de deixar claro que estava plugado no carro, ela apenas deu um sorriso, perguntou como estava às coisas e como estava Ayla, trocamos meia dúzia de palavras e encerrei a chamada.

— Dona Paula não visita a senhora? — sua voz baixa e tímida quase não chegam em meu ouvido.

— O que disse? — Questionei olhando de relance para ela, mesmo tendo entendido.

— Sinto saudade da dona Paula. — Ela confessou.

Não sei o que senti, a verdade é que o que estava sentindo nunca tinha sentido antes, tinha ficado incomodada por saber que Ayla sentia falta da minha amiga, lembrei-me de quantos elógios sobre a Paula tinha em seu diário, do quanto ela se sentiu quente vendo Paula tirar a blusa em sua frente, do sinal que observou atentamente no seio da minha amiga, senti meu pescoço esquentar e meu estômago embrulhar, recordar dessa parte do diário literalmente acabou com o meu humor.

— Vai continuar sentindo, ela quase não vai lá em casa. — respondi seca.

Nada ela disse, se encolheu no banco e seguiu olhando para a janela, tinha pensado em levar ela em uma sorveteria, já que ela não pode fazer muita coisa e prefiro que ela fique parada enquanto não completa esses três dias, mas ouvir ela dizendo que sente falta da Paula e recordar das coisas que li, optei por seguir para casa.

Alguns minutos depois já estávamos na porta de casa, ajudei ela a descer do carro e repreendir por estar andando rápido demais, ouvi uma lufada, e revirei os olhos sorrindo, sabia que estava exagerando, mas insisto em dizer que todo cuidado é pouco.
Assim que adentramos, segui para a cozinha, pedi para empregada providenciar um pote de sorvete, voltei para sala e lá estava sentada, perdida em seu pensamento, pensando na Paula, talvez...

— Se quiser assistir, pode ligar a televisão, Ayla, fica a vontade, a casa é sua por 9 meses.

— Queria saber notícias da minha mãe.

— Você já não teve ontem? — Questionei sentando-me ao seu lado. — Podemos ligar para lá, mas você já saiu hoje, é melhor ficar em casa deitada.

Ela balançou a cabeça em concordância, sorri para ela e puxei para um afago, senti seu corpo enrijecer e meu coração apertar, definitivamente não estava sabendo lidar com fator de que Ayla tinha medo de mim. Toquei em seu rosto, ela fechou os olhos, sua respiração estava ficando agitada, corri os olhos para seus lábios, mesmo que um pouco ressecados, eram lindos, ela tinha um sorriso lindo demais, meu corpo já estava dando sinais do desejo latente que eu tinha por aquela criança, fechei meus olhos e senti o vento causado pelo corpo da Ayla levantando rapidamente, olhei para ela e ela estava me observando com suas órbitas arregaladas. Assustada!

— Só estava fazendo carinho. — Murmurei me pondo em pé. Constrangida.

— Desculpa! — Ela exclamou visivelmente nervosa.

— Vou subir, descansar um pouco, dormi muito mal. — Menti! — Fica a vontade para fazer o que quiser, mas só nos cômodos aqui de baixo, daqui a pouco chega sorvete para você.

— Desculpa. — Ela pediu abaixando a cabeça.

— Desculpa pelo quê? — Questionei curiosa.

— Pela noite mal dormida, a senhora dormiu comigo no chão, acredito que me mexi muito. — Ela confessou apreensiva.

— Claro que não, eu quem sofro de insônia, você dormiu como um anjo.

Nada ela disse, segui para as escadas cabisbaixa, sentindo uma vontade enorme de chorar, queria voltar, segurar em suas mãos, ou me ajoelhar em seus pés e implorar por um pedido de perdão e dizer que tinha feito tudo aquilo por não querer permitir ter um relacionamento daquele tipo, além da enorme diferença de idade, 'mas que merda estou pensando?' Questionei-me já no corredor, seguindo para meu quarto.

Fechei a porta do quarto e por fim me permiti chorar novamente, estava me sentindo sufocada com tantas informações, queria conversar sobre tudo, mas não poderia, primeiro porque ela não pode passar nervoso, segundo que li seu diário sem sua permissão.

Tirei meu celular da bolsa e busquei o número da Paula, no quarto toque ela atendeu, me questionou o que tinha acontecido, pois, estava com voz de choro, menti, disse que minha alergia estava atacando, ela sorriu acreditando, atualizei ela sobre a situação da inseminação, perguntei como estava no escritório, mas em nem um momento consegui tocar no assunto para qual foi o motivo da ligação, senti vergonha, não só de assumir que estava gostando de uma pessoa do mesmo sexo, mas também por ser da Ayla, por ser apenas uma menina, por tudo que já fiz com ela e de repente dizer que fiz para evitar os desejos.

Desliguei com a promessa de ir para seu aniversário. Só em ouvir a palavra aniversário lembro-me o quanto fui negligente com a Ayla, li em seu diário o quanto ela desejava parabéns meu, já que eu sabia que ela estava aniversariando, confesso que só fui lembrar ao recordar que na primeira vez que fomos na clínica ela disse que completava 18 anos na semana seguinte, porém, lembrei tarde, já tinha passado o dia e eu preferi não dizer nada, e ela passou seu dia especial trancada na minha casa enquanto eu trabalhava.

Deitei-me na cama, minha cabeça estava doendo, não havia dormido nada na noite anterior, fechei os olhos, e talvez pelo choro de toda uma noite e do de agora, me ajudou a pegar no sono rapidamente.

Acordei perdida no tempo, olhei para janela e já era início do crepúsculo, me surpreendi negativamente, isso me renderia uma longa noite acordada, levantei e segui para o banheiro, levei meu rosto e desci para sala, lá estava Ayla, sentada no sofá com o braço apoiado no sofá.

— Boa noite! — Minha voz saiu rouca pela longas horas de sono.

Ela se endireitou imediatamente, e logo me respondeu, desanimadamente recordei a ela que ela poderia ficar a vontade, ela nada disse, apenas me deu um sorriso sem mostrar os dentes.

— Estou com fome, não almocei. O que você almoçou? — Questionei.

— Nada, a senhora não desceu.

Estava incrédula, o médico tinha dito que ela precisa se alimentar bem e ela nem sequer havia almoçado só porque eu não desci, caramba! Parece que Ayla não quer fazer por onde vingue essa gravidez.

— Você não pode ficar sem se alimentar, está doida, menina? — Questionei irritada.

— Comi o sorvete que a senhora deixou eu tomar. — Ela murmurou amedrontada.

Aquilo foi como um tiro no meu estômago, me fazendo recordar do porque provavelmente ela não ter ido almoçar. Ela não foi com medo das tantas vezes que bati nela por ela está com fome, ou por ela não pedir primeiro antes de ir comer. Ceus! Meus olhos estavam ardendo como se eu tivesse passado pimenta, senti uma lágrima escorrer e ela me olhar assustada questionando se eu estava bem, se aproximou de mim, segurou delicadamente em meu braço e me arrastou para sentar no sofá, visivelmente preocupada enquanto secava às lágrimas que estavam caindo dos meus olhos.

— Vai dar tudo certo dona Norma, vou conseguir engravidar, não se preocupe, já sou acostumada a ficar sem comer, isso não vai interferir em nada. — Ela sussurrou tentando me acalmar. Porém, o resultado foi oposto, o peso na consciência foi como toneladas chovendo em cima de mim, levei minha mão até seu rosto, — me desculpa? — Pedi com a voz embargada, estava tentando engolir o choro, mas não estava conseguindo.

Ela me olhou confusa, e meus olhos que estavam em seus olhos correram para seus lábios, levei minha mão até seu rosto e a puxei para mim, selando nossos lábios, um selinho, e ela se afastou rapidamente assustada. Ela não me queria mais, era notório, pedi desculpas e chamei para jantar tentando ignorar aquela minha atitude emotiva.

A beira do abismo Where stories live. Discover now