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Era uma vez, um jovem que foi concebido aos Glions...

Flashes, Julian sendo levado ao laboratório, Julian chorando, me olhando com desprezo, recuando de mim.

...um procedimento mal sucedido...aberração, escória..

Ele se afastou, sumiu, e voltou depois de uma semana fingindo que nada havia acontecido...

...merecia morrer, sangue sujo, não merecia ficar vivo, fomos piedosos...

Estavamos no cemitério,Julian na minha frente, um sorriso nervoso nos lábios.

...amaldiçoado, é o que é, e sempre vai ser...

Um clarão branco, e Julian no chão.

...IMUNDO! tentou nos sabotar, quase conseguiu, humano imprestável...

Agora ele estava em um campo de treinamento junto com monstros, rostos deformados, malignos. Julian segurava uma adaga dourada com força e a cravou sem pensar duas vezes no coração de uma criatura minúscula a frente dele.

...ele morrerá, nos o mataremos lentamemente...

Aquela voz susurrava em meu ouvido, eu estava em choque, com medo e senti um arrepio na nuca quando ela susurrou calmamente perto de meu ouvido.

- Assustada, Jenny?

- PAREM!

🌑

Quando recobrei a conciência me vi deitada em uma cama, a cama de Scott ao que parecia. Eu soava mesmo estando com frio, tremendo. Havia algo molhado em minha testa, talvez eu estivesse com febre. Julian e Scott estavam ao lado da cama, ambos com uma expressão preucupada no rosto...Julian um pouco culpado.

Não falei nada, permaneci quieta, eles também um tanto tensos. Eu ainda achava que ouvia aquela voz sussurar em meu ouvido, me aterrorizando, me levando para o fundo...para a morte.

Julian havia matado a sangue frio e não havia nenhuma reação, nenhuma angústia ou arrependimento em seu rosto quando o sangue daquela criatura seja lá o que ela fosse ensopou os seus pés. Se aquele era o treinamento dos glions, cruel, abominante, o que seria a guerra em sí? que chance um humano comum teria contra aquilo?E se Julian,que antes não fazia mal a uma mosca matou sem apresentar reação, o que os outros fariam?Seria um massacre.

- Explique, por que a matou. - foi minha primeira frase dirigida a Julian.

- Fui obrigado a isso, juro. - ele respondeu rapidamente - Ou a matava, ou morria. Acredite, fiz um favor a todos nós elimimando aquela criatura.

Assenti.

- Pode me contar o que viu? -perguntou Scott inseguro.

Eu contei. Por mais que não quisesse me lembrar do que vi, eu falei. Houve um momento em que as lágrimas ameaçaram cair mas eu as contive, não era hora, eu não podia ser fraca naquele momento.

Acabei de contar o que tinha visto e Scott permaneceu em silêncio, o que não era surpresa.

Conhecia Scott Parker a pouco tempo mas aprendi muito sobre ele. Primeiro, ele trabalha calado, segundo, ele escuta calado, terceiro, ele tira conclusões calado. Acho que ele fez do silêncio seu porto seguro, um lugar onde ele sempre poderia se abrigar quando o mundo lá fora estivesse gritando. Na minha opinião, ele é um garoto bastante maduro com tão pouca idade, não é como os idiotas que estudam comigo que se acham porque jogam futebol americano e porque têm dinheiro. Não, ele não liga pra essas coisas, apesar de sua família estar entre a classe média e a rica. Ele não assobia quando vê garotas na rua nem dirige seu carro para cima e para baixo para se mostrar, não vai a festas banais e não dá bola para as garotas que praticamente se jogam em cima dele(olha que são muitas). Encontrei nele um verdadeiro amigo, um semelhante, e as vezes preciso lutar para controlar meus sentimentos quando ele sorri...é algo que me traz paz, um sorriso verdadeiro.

- Vou ao banheiro. - falou Scott simplesmente, me tirando de meus devaneios.

Ele saiu do quarto fechando a porta sem fazer barulho. Eu permaneci onde estava, Julian por outro lado levantou e ficou olhando fixamente com a testa franzida para a porta por onde Scott tinha saído. Cinco minutos em silêncio se passaram até que ouvimos barulho de vidro de quebrando. Julian imediatamente se dirigiu a porta, mas eu falei firmemente.

- Não. Deixe que eu vou.

Ele parou com a mão na maçaneta, como se estivesse decidindo se ouviria a razão, ou me ouviria. Eu me levantei e fui até a porta e a abri, fiz um aceno com a cabeça para Julian e comecei a andar rapidamente pelos corredores. Eu gostaria de dizer que não sabia o que estava acontecendo com Scott, mas eu já o havia encontrado vezes demais com aqueles olhos que por vezes me traziam alívio envoltos por sombras, vermelhos e inchados. Nessas ocasiões não ousei perguntar o que havia acontecido, não queria bisbilhotar na vida de Scott. Mas agora ele era meu amigo, era alguém importante, alguém de quem eu gostava e que eu não perderia de forma alguma.

A porta do banheiro estava entreaberta e eu o econcontrei em pé, as mãos apoiadas na bancada da pia, a cabeça baixa. Ele tremia e estava chorando. Vidro quebrado estava no chão ao seu redor, vítimas do começo de sua crise, pelo menos uma parte já havia acabado. Eu me aproximei, levantei seu rosto e o obriguei a olhar para mim. Segurei sua mão e olhei em seus olhos escuros.

- O que aconteceu? - susurrei

Ele demorou um instante para conseguir controlar os soluços constantes e responder.

- É muita coisa Jenny... - ele falou, sua voz não pasava de um murmúrio - eu...eu não aguento mais.

Ouvir aquilo de Scott me deixou desamparada, em desespero eu deveria dizer, talvez medo.

Eu o puxei para perto, para um abraço apertado como tantas vezes ele tinha feito comigo, como tantas vezes ele tinha me acalmado.

- Calma cara, a gente vai dar um jeito - falei, enquanto ele chorava.

Eu o puxei para fora do banheiro e o levei para o quarto. Julian se despediu murmurando algo que soava como um "vai dar tudo certo" e saiu pela porta. Eu a fechei, e sentei ao lado de Scott em sua cama, ficamos em silêncio, apenas ali na companhia do outro.

As vezes, é tudo o que é preciso. Nessas horas, as palavras podem se tornar inúteis.

Toque de RecolherWhere stories live. Discover now