Após a tormenta

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O ônibus chegou mais ou menos umas cinco e meia da manhã. Bem cedo mesmo. Minha cidade era longe da faculdade. Quando percebi que estava dentro da cidade e indo para a rodoviária comecei a me mexer no assento. O corpo estava todo dolorido, com preguiça, sabe? Desci do ônibus e vi que estava tudo muito escuro, frio, um pouco de neblina. Mas o que mais me assustava era a escuridão. Não gosto de não conseguir ver as coisas. Isso me dá uma sensação de fraqueza, medo, insegurança e principalmente de solidão.

Peguei minhas malas e fui na direção de onde os táxis ficam. Por incrível que pareça não tinha nenhum. Merda. Minha internet do celular só renovava na próxima semana, então não dava para chamar um uber. Fiquei uns bons minutos esperando o que fazer. Estava literalmente perdendo tempo e não pensando em nada que poderia ser útil. Coisas ruins começaram a passar pela minha cabeça. "Você vai ser morto", "algum homofóbico vai passar ai e te matar", "alguém vai te roubar"- essas eram as coisas que eu ficava pensando. Minha sorte era que eu não estava sozinho, tinham mais pessoas ali comigo, que estavam no meu ônibus. Só que pouco a pouco eles foram indo embora, e eu ia ficando. Dessa forma, o desespero começou a bater e decidi ligar para o Junior.

" Não faz isso! Não acorda o pobre coitado agora"- foi o que passou na minha cabeça.

"Liga para outra pessoa, quem sabe a Lorena?"- outra voz falou.

Acabei por fim ligando para a Loren ( eu chamo a Lorena assim). A conversa no telefone foi rápida. Só falei que eu precisava de uma carona até em casa.

Os minutos iam passando. Um, dois, três, cinco, dez. Até que depois de quinze minutos a Lorena chegou. Não estava bravo pela demora. Eu sei que ela mora longe da rodoviária, e outra, ela está fazendo um favor para mim, tem nem por que eu dar uma da chato e querer procurar briga. Nem posso procurar briga. Sumi durante sete dias, e não falei nada para ninguém.

Ela entrou na rua da rodoviária, e parou o carro na minha frente. Abri a porta de trás e coloquei minhas coisas. Depois abri a porta da frente. Entrei. Sentei. Percebi que ela estava me encarando, mas eu não virei meu rosto. Continuava focando apenas no que estava na minha frente. Eu não estava preparado para uma conversa sobre o que aconteceu- Não que eu fosse contar a verdade do que realmente aconteceu- Até que ela virou meu rosto e disse:

- faz isso de novo sua "poczinha" que eu te capo.

Dei uma risadinha, e percebi que ela tinha pintado as pontas do cabelo do lado esquerdo ( o que não era raspado) de azul. Ela ficou mais bonita. Ela poderia tentar cagar na aparência que ela não ia conseguir. Existem pessoas que são bonitas de qualquer forma.

- Você está me devendo uma agora ta? Não é qualquer um que sai essas horas da madrugada não.

- pode me chamar a qualquer momento para qualquer coisa. Grave essas palavras- eu disse rindo.

Eu vou, pode deixar. Não vou esquecer mesmo, te garanto.- Loren disse.

Durante o resto do caminho até minha casa ficamos conversando de coisas bobas. Ela me atualizou de tudo que eu perdi sobre os nossos amigos. Foi naquele momento que eu percebi que eu estava fodido academicamente. Eu perdi uma semana de aula. Eu estava sem o conteúdo de uma semana. "Putz" foi a coisa que mais aparecia na minha cabeça. Eu precisava estudar muito essa semana. Aquele meme "sem tempo, irmão" era a minha realidade.

Cheguei no portão do meu prédio. Desci do carro. Peguei minhas malas, e marcela disse na hora que fui me despedir:

- Mor, a partir de hoje não vou poder te dar mais carona de manhã. Eu fechei o carro com as meninas da minha república. E elas vão me pagar, então isso me ajuda. Desculpa.

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