Ovelhas Negras

Me leve para casa

Maria de Lourdes

Maria de Lourdes acordou naquela manhã ao lado de Eric. Pela primeira vez, eles haviam dormido uma noite inteira juntos. E ela não acordou sobressaltada, também pela primeira vez, ao perceber um corpo masculino ao lado do seu. Na realidade, era exatamente o contrário. Ao sentir o abraço de Eric, tudo o que ela mais queria era continuar a dormir. O calor do corpo do menino louro de olhos azuis era reconfortante. Se pudesse, Lola não sairia nunca mais dali.

No entanto, infelizmente, ela não estava de férias, não era feriado e, muito menos, fim de semana. Ela teria aula naquele dia e ainda precisaria voltar para a sua cidadezinha no fim do mundo.

Ao lembrar-se da aula, então, Lola sobressaltou-se.

— Que horas são? — Ela gritou, afastando o braço de Eric de cima de seu corpo.

O rapaz soltou uns grunhidos estranhos, ainda dormindo. Lola levantou da cama, sem roupa e desesperada, procurando um relógio pelo quarto bagunçado de Eric. Ao ficar longe do corpo negro da menina, o rapaz finalmente acordou, um pouco assustado.

— Horas? — Ela disse, ao perceber o olhar inquisitivo no rosto sonolento dele.

Como se estivesse fazendo um grande esforço, Eric esticou o braço para o criado-mudo ao lado da cama e puxou seu próprio celular. Olhou o visor e, em seguida, mostrou-o a Lola. Os números zero e cinco podiam ser vistos na tela preta.

Apesar de ainda ser cedo, Lola não ficou aliviada. Ainda teria que pegar a estrada. Balbuciava palavras sem sentido enquanto catava suas roupas no chão e as vestia, desengonçadamente.

— Lourdinha? — Chamou Eric, percebendo o nervosismo da garota. — Tá tudo bem?

— Não — ela respondeu esbaforida. — Eu vou chegar super atrasada! E depois de ter passado a noite fora, sem avisar a ninguém!

Eric fechou os olhos, como se estivesse, só agora, lembrando de algo muito importante. Então, pensando rápido, e desperto de repente, ele disse:

— Olha, se desesperar não vai ajudar em nada. Vamos tomar um banho e enquanto comemos algo, você liga pra sua família e eu ligo pra escola, ok?

Lola parou e vendo-o ali, enrolado em lençóis, de cara e cabelo amassados, pensando no melhor para ela, seu coração derreteu. Ela assentiu e sentou-se na cama, ao lado dele, depositando um singelo beijo em seus lábios. Como poderia ter ficado tanto tempo longe de Eric? Nem ela própria saberia responder.

Eric entregou a ela sabonete, toalha e até uma escova de dentes. Indicou um dos banheiros e disse que tomaria banho no outro, para agilizar tudo e evitar atrasos. Lola concordou, ela realmente não queria chegar atrasada.

Ao terminar o banho, ela encontrou um Eric muito bem vestido perto da janela do quarto, de costas para ela, falando com alguém no telefone. Maria de Lourdes não saberia dizer com quem e nem entendeu o teor da conversa e, apesar da curiosidade, limpou a garganta para fazer notar-se. Não queria se intrometer na vida de Eric e bagunçar tudo mais do que já havia bagunçado.

Ao perceber Lola ali, Eric se despediu da pessoa com quem quer que estivesse falando e digitou alguma coisa no celular.

— Bom dia, Lourdinha — ele sorriu para ela, genuinamente feliz em vê-la.

— Bom dia — Lola respondeu um pouco emburrada. — Então, vamos comer aqui ou em outro lugar?

— Pensei da gente tomar café numa padaria aqui perto que é muito legal, mas, antes, tem algo que você precisa fazer...

Ela arqueou a sobrancelha, um pouco curiosa.

— Eu já liguei pra escola, agora é sua vez de ligar para a família — Eric explicou.