B L O O D Y . B A P T I S M (J-Hope)

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A crueldade tem coração humano;

A tirania, feição humana;

O terror, corpo humano,

E os segredos, a roupagem dos humanos.

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Esta não é uma estória como as que você está acostumado. Não pense que irei narrar lendas de homens benevolentes ou personagens que os valham. Não espere nada de bom, pois o que irei lhe apresentar são fatos que banham uma alma sanguinária. Um demônio vestido em pele humana, capaz de encantar ao mesmo ritmo que causa terror àqueles que cruzaram seu caminho, é sobre isso que irei falar. Mas antes de apresentar-lhe o seu nome de guerra, irei introduzi-lo com seu nome real: Jung Hoseok. Grave-o bem, mas cuidado, não se deixe seduzir por aparências, elas enganam.

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O céu estava acinzentado por toda a capital coreana, um contraste incômodo com o ar mormacento que se estagnava pelas ruas. A brisa que vez ou outra rodopiava, não era suficiente para aplacar as ilhas de calor que se formavam, dando a impressão de que o ar tremulava e o cimento derretia. Nas calçadas, as pessoas se arrastavam com seus rostos fatigados, injuriados, eram como espíritos condenados ao inferno. Na periferia de Seoul, o cenário se estendia, mas entre prostíbulos, sacos de lixo e pontos de droga, um garoto não era atingido por fatores climáticos análogos ao verão.

Os cabelos tinham um tom de preto incomum, denso e com fios grossos, uma característica que prendia a atenção de todos em seu rosto anguloso e angelical; já os olhos brilhavam num castanho conhaque, pareciam mais claros quando o Sol estava no ápice, pontilhando as íris de pequenos fragmentos de luz. Entretanto, aquele com olhar mais zeloso notaria as pupilas e, se esperto fosse, evitaria-as, pois eram perigosas como um abismo, escuras, densas e profundamente vazias.

Estava agachado ali há incontáveis minutos, imóvel, com sua atenção fixa na cena que vislumbrava. O gato da vizinha era bonito, diziam pelos arredores que até pedigree o bichano tinha; os pelos eram tão brancos quanto a neve que cobria as ruas durante o inverno, mas o pobrezinho tinha olhos leitosos, esbranquiçados, tudo devido à sua anomalia genética não tão rara. Hoseok nunca gostou de gatos, na verdade, nunca gostou de animal algum. Talvez as mariposas negras fossem as únicas que tinham sua mínima simpatia... Não, elas também não, apenas apreciava a prática cuidadosa da entomologia.

O gato miou alto, estava tendo outra convulsão. Espumava pela boca, produzia barulhos de agonia e súplica, as patinhas enrijeciam conforme o animal asfixiava, o oxigênio não entrava com suficiência, produzindo ruídos falhados e engasgados. Hoseok não se movia. Sabia em seu íntimo que deveria chamar a mãe, ou a senhora Lee, entretanto, não sentia vontade de estragar seu entretenimento. Alguma coisa na dor daquele bicho o fazia salivar e querer rir, seria isso o significado daquela palavra que leu no dicionário outra vez? Crueldade? Se fosse, então por que parecia tão simples? Tão excitante?

Com os braços ao redor dos joelhos Hoseok observou até o momento em que tudo findou-se. Não sentiu nada. Sempre soube que pensava diferente dos demais em relação à vida, não enxergava a grande questão moral que obrigava a tal sociedade a sentir-se sempre comovida e indefesa diante de formigas. Sim, formigas. Que exemplo seria mais adequado para definir esse grande aglomerado de pessoas, se não um formigueiro? Todos sempre ocupados em manter a ordem e servir, escravos era o que pareciam, fantoches sem importância nesse Universo.

— Hoseok, querido, venha aqui! — Ouviu sua mãe chamar e como se um desespero súbito o tivesse acometido, ergueu-se e correu até a mulher que esperava na porta da cozinha. Ela olhou de relance o animal morto em seu quintal, mas não falou nada sobre, apenas recebeu Hoseok com um sorriso amplo que muito lembrava o do próprio garoto.

O Silêncio dos InocentesWhere stories live. Discover now