Prólogo

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— Por favor, Luísa! — Letícia repetia pela quinta vez. — É só uma palestra sobre ossos...

— Fósseis — corrigi.

— Que seja! Fósseis... — ela revirou os olhos. — É só uma palestra, o que custa você ir comigo?

Suspirei e contei até dez mentalmente antes de responder. Caminhei até a bancada que separava a cozinha da sala e peguei uma maçã de dentro do pequeno cestinho sobre a mesma. A última maçã: renegada e esquecida pelos habitantes do pequeno apartamento que chamávamos de lar.

— Não tenho interesse em arqueologia — respondi, mordendo a fruta e continuei falando, enquanto mastigava, sem me importar com os bons modos. — Tenho um compromisso importante hoje à tarde e, além do mais, você também não gosta de fósseis.

Letícia me olhava de cara fechada, provavelmente decidindo entre continuar insistindo ou desistir. Ela suspirou, deu seu melhor sorriso forçado e me encarou.

— Se você for comigo, prometo limpar a casa por um mês, sozinha.

Era oficial. Ela estava apelando! Ponderei, não seria um acordo ruim, afinal, seriam apenas duas horas de uma palestra chata que eu poderia dormir e nem sentir o tempo passar.

— Tudo bem — concordei, vendo minha amiga sorrir e bater palminhas.

A verdade é que Letícia odiava arqueologia, dizia que era faculdade de desocupado com a vida ganha, que não precisava de campo, afinal não tinha. Eu discordava, mas deixava-a falar.

Nós duas éramos amigas desde sempre, nossas mães se conheceram na faculdade, engravidaram na mesma época e nos criaram como irmãs, no interior de São Paulo. Mudamos para o Rio de Janeiro juntas para cursar Nutrição na UFRJ e desde então dividíamos o aluguel de um apartamento minúsculo e apertado.

O motivo para Letícia insistir tanto nessa palestra tinha nome, endereço e CPF: Arthur Kannenberg.

Não vou negar, o garoto era mesmo uma tentação, um deus grego andando entre nós. Além de ter um corpo de dar inveja, ele tinha um sorriso de derreter as calotas polares, sem exagero. Andava com aquela jaqueta de couro e o cabelo preto bagunçado, pra cima e pra baixo, além dos olhos de cor avelã.

E como gente bonita costuma andar com gente bonita, ele estava sempre acompanhado do amigo, tão cobiçado pelas garotas quanto o próprio Arthur, Breno Müller. A diferença dos dois não era apenas a aparência, Breno tinha os olhos azuis como o céu em dias sem nuvens e os cabelos loiros sedosos de dar inveja. O sorriso também era uma forte características e conquistava todas as garotas com grande facilidade.

O problema era que os dois compartilhavam do mesmo defeito: arrogância. Era o suficiente para que eu perdesse o interesse.

— O que seu crush vai fazer em uma palestra sobre fósseis de dinossauros? — questionei.

— Não sei — Letícia deu de ombros —, mas ele confirmou presença no evento do Facebook, então estará lá.

— Você parece uma stalker louca.

Ela revirou os olhos e riu, no fundo sabia que era verdade.

— E você é cega, não sei como pode não ser caidinha por ele também.

— Regra número um: nunca se apaixone pelo crush da sua melhor amiga — citei rindo. — Afinal, seria um caos se nós duas passássemos a disputar o mesmo garoto.

Dez Vezes VocêOnde as histórias ganham vida. Descobre agora