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Eu conseguia ouvir os cochichos vindo de várias partes dos corredores. As pessoas tentavam disfarçar, mas estava claro que elas olhavam para nós. Eu não estava preocupado comigo, eu estava preocupado com ela, Georgina. Eu já estava acostumado a estar no centro das atenções, e todos baterem palmas para tudo que eu fazia.

Ás vezes é chato, às vezes parece que é tudo tão forçado, tão falso. Como se as pessoas tivessem que sempre me tratar bem, só por causa do meu sobrenome e das coisas que eu faço. Confesso que eu procurei isso, eu construi esse status, eu quis que eles me colocassem nesse pedestal... Mas agora é diferente, não sei se é porque eu estou me formando este ano, mas talvez eu queira deixar para trás toda essa correria... toda essa necessidade de sempre ser o primeiro em tudo, e ser apenas eu, David. A popularidade talvez não seja tudo, e você só precisa de alguém para te dizer que está na hora de descansar e viver um pouco, viver de verdade.

Mas se ela estava andando comigo, mesmo que por um breve momento as pessoas pensariam isso: que ela tinha sido mais uma na minha lista. Não que eu tenho uma lista, eu não sou tipo de cara que faz isso.

Olho para o lado, e Georgina parece não se importar. Ela caminha com o outro quadro nas mãos, caminha confiante, de cabeça erguida, não ligando para o que os outros estão dizendo e pensando sobre nós. E na verdade nem existe um, nós.
Ela sorriu e eu retribui, andávamos como se o mundo fosse só nosso, como se depois que atravessássemos aquela porta no fim do corredor, um imenso oceano azul e a maresia estivesse nos esperando para abraçá-lo.

- O meu armário ficar por aqui. - digo atravessando na sua frente, e indo em direção ao meu armário no outro corredor, à direita. Ela me acompanha, caminhando atrás de mim. - É esse daqui. Espero que tenha alguma calça para me trocar. Eu ainda não acredito que isso está acontecendo.

- Tudo tem uma primeira vez, não é? Talvez agora você pense antes de sair se divertindo a luz do dia, por aí. - ela fala enquanto eu estou com armário aberto procurando uma calça. Então eu acho uma.

- Ufa! Essa foi por pouco.
Caminhamos até o banheiro masculino, que ainda bem, estava vazio. Eu ainda estou com o quadro em mãos, e para não estraga-lo, entrego para Georgina, que fica na porta.

- Bom... Eu acho que é isso. É... tudo bem se eu for? Tipo... você vai precisar de mais alguma coisa? - ela pergunta. Gentil. Demoro para responder, eu ainda não havia percebido que os seus olhos eram de cores diferentes. E a encaro fixamente.

- Os seus olhos...

Ela leva a mão até o olho, e diz:

- O que tem os meus olhos? Estão sujos? Está com alguma remela?

Nego com a cabeça achar graça no que ela fala. E respondo:

- Não é isso. As cores são diferentes.

- Ah... é heterocromia. Depois você procura no Google. - ela responde.

- E você enxerga direito? - me pego curioso. - Eu pensei que o seus olhos eram castanhos. É que eu vi só de um lado, na sala. O que um é castanho... e o outro é verde.

- Essas coisas acontecem por diversas causas. As pessoas quando me veem sempre ficam curiosas para saber já que casos assim, são seis em mil pessoas. Algumas culturas nativas americanas acreditam que ter heterocromia significa que a pessoa pode ver o céu e a terra ao mesmo tempo, através de seus olhos de cores diferentes, e eles se referem a essas pessoas como tendo "Olhos Fantasmas". Já os pagãos da Europa Oriental acreditam que nascer com heterocromia significa que a pessoa tem olhos de bruxo.

- Que coisa. - franzo o nariz. - E você acredita? Tipo... Em culturas nativas?

- Não. Quer dizer, a minha avó me diz umas coisas um pouco estranha sabe? Bizarras. Mas nada sobre eu ser alguma vidente ou bruxa. Deixo isso para a J.K Rowling. - nós dois sorrimos.- Então... Acho que já vou.

Perfeitos Mentirosos [ÚLTIMOS CAPÍTULOS]Where stories live. Discover now